Livros que falam de viagem — Gama Revista
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Cultura

Livros para todos os viajantes

Um dos principais temas da literatura mundial, reunimos uma lista de lançamentos recentes que abordam viagens dos mais variados tipos e contextos

Leonardo Neiva 27 de Novembro de 2022

Livros para todos os viajantes

Um dos principais temas da literatura mundial, reunimos uma lista de lançamentos recentes que abordam viagens dos mais variados tipos e contextos

Leonardo Neiva 27 de Novembro de 2022

Há quem diga que abrir um livro é a mesma coisa que empreender uma viagem com escalas em direção a um destino desconhecido. Melhor ainda, no entanto, quando a obra retrata justamente essa vertigem gostosa de viajar. Um dos temas que mais aparecem na literatura ao longo da história, aqui mesmo na Gama já publicamos trechos que abordam viagens reais, ficcionais ou com um pouquinho das duas coisas.

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No romance “Kramp” (Moinhos, 2020), da jornalista e escritora María José Ferrada, que saiu na nossa seção Trecho de Livro, os protagonistas são uma menina e seu pai caixeiro-viajante, que perambulam pelo país vendendo produtos de uma serralheria. Entre os outros lançamentos dos últimos anos, o leitor encontra desde uma expedição científica para aclimatar animais exóticos no estado do Ceará até as dificuldades das curtas viagens empreendidas nos caixotes do transporte público de São Paulo. Assim como relatos pessoais de personalidades que vão da escritora Joan Didion (1934-2021) ao chef, escritor e apresentador de TV Anthony Bourdain (1956-2018).

Pela enorme variedade de opções disponíveis nas prateleiras, torna-se uma tarefa difícil selecionar as principais delas lançadas ao longo deste ano. Porém, para atiçar o interesse e o faro de viajante dos leitores, Gama reúne a seguir uma variedade de obras que abrange memórias de viagens, jornadas mais instigantes do que os próprios destinos e êxodos forçados, seja por atitudes violentas ou por grandes tragédias. Uma boa viagem e excelente leitura.

Diários de viagem

Direito à Vagabundagem: as viagens de Isabelle Eberhardt (Fósforo, 2022)
Um guia que joga o leitor de cabeça nas aventuras da exploradora e escritora suíça Isabelle Eberhardt (1877-1904). Com sua imagem ligada ao uso de vestimentas tradicionais argelinas, ela costumava perambular como uma errante profissional pelo norte do Magrebe africano, descrevendo suas andanças em textos publicados na imprensa francesa. Desafiando com frequência as limitações impostas por sua nacionalidade e gênero no final do século 19, Eberhardt também tinha o hábito de se vestir como um homem da época e frequentar locais tradicionalmente reservados a eles. Daí o direito à vagabundagem do título, que remete à liberdade de ir e vir que a viajante exerceu ao longo de sua curta, mas intensa existência.

Relatos da China e da Índia (Tabla, 2022)
Composto por dois livros, este “lançamento” com mais de dois mil anos de existência começa com um diário de bordo que vai costurando relatos de experiências de mercadores e marinheiros ao longo da rota marítima entre o Golfo Pérsico e Guangzhou, na China. Uma viagem por vezes bastante realista, mas em alguns momentos também um tanto fantasiosa e mirabolante. Já a segunda parte tem um teor mais literário que descritivo, unindo narrativas que buscam mais entreter do que informar o leitor. Uma leitura para vários gostos, mesclando pitadas de história, geografia e literatura fantástica.

Uma Viagem de Sonhos Impossíveis (Autêntica, 2022)
Em 2021, celebrando o centenário do educador e filósofo Paulo Freire, o pesquisador e escritor Walter Kohan percorreu 15 mil km em estradas do Nordeste, ao longo de 100 dias. Neste livro, ele reúne tanto testemunhos de um diário pessoal quanto imagens, mapas, cartas, relatos e até poesias daqueles que o receberam em suas casas pelo caminho. Incluindo ainda uma conversa com Fátima Freire, filha do educador, o professor universitário vai registrando as revelações e descobertas feitas em escolas, assentamentos, bibliotecas, creches e centros culturais, narrando não apenas a realidade, mas também os sonhos que irrompem desses encontros.

Viajantes imóveis

A Incrível Viagem das Plantas (Ubu, 2022)
Pode parecer estranho pensar em plantas viajantes a não ser que se trate de uma ficção científica bem extravagante. Mas o livro do célebre neurobiólogo italiano Stefano Mancuso reúne vários relatos sobre como as plantas de fato se movimentam. Num estilo que mistura artigo científico e literatura de forma cativante, o autor conta como elas migram pelo mundo para assegurar sua sobrevivência, se modificar ou simplesmente habitar outros espaços. Desde plantas carregadas por animais de um lado a outro até as que usam elementos como o vento ou a gravidade para se deslocar, a obra é composta por histórias únicas, que nos fazem enxergar esses seres como viajantes natos tanto quanto os próprios seres humanos.

Samarcanda (Tabla, 2022)
Um livro que reconta a trajetória de outro livro, um volume com mais personalidade e história para contar do que a grande maioria das pessoas. Escrita pelo poeta e sábio persa do século 11, Omar Khayyam, o “Rubaiyat” de fato existiu e viajou o mundo ao longo dos anos e séculos seguintes, chegando a despertar o interesse ocidental pela literatura do Oriente. Mas o livro acabou encontrando seu fim no fundo do mar, na fatídica viagem do Titanic. É essa longa e acidentada trajetória, em sua maioria desconhecida, que o líbano-francês Amin Maalouf recria aqui, com altas doses de ficção e acompanhando a tradicional Rota da Seda. Numa nova e belíssima edição brasileira, este que já vem sendo considerado um clássico contemporâneo permite ao leitor sonhar com viagens e localidades distantes e maravilhosas.

Sobre trilhos

Pagu no Metrô (Nós, 2022)
A pesquisadora Adriana Armony recria os passos da escritora e militante brasileira Patrícia Galvão (1910-1962), mais conhecida como Pagu, entre os anos de 1934 e 1935, quando viveu na efervescente Paris. Para participar de manifestações e protestos, assim como viajar diariamente pela cidade, ela usava um meio de transporte em particular: o metrô. Assim, na obra, Armony traz à luz novas pesquisas, dados e imagens da realidade da artista, ao lado de outras mulheres, entre operárias e militantes, que empreendiam uma luta semelhante à sua. Uma vivência que acabou subitamente interrompida por uma prisão, como comunista estrangeira, sendo em seguida repatriada para o Brasil.

Trem-Bala (Intrínseca, 2022)
Cinco assassinos profissionais, uma maleta misteriosa e um trem-bala viajando de Tóquio à cidade de Morioka, no norte do Japão. Essa é a receita para o suspense de tirar o fôlego do escritor Kotaro Isaka, que vendeu mais de 700 mil cópias só em terras japonesas. Adaptado este ano para um filme de ação encabeçado por Brad Pitt, o livro vai mesclando e confundindo narrativas pelo caminho. No fim das contas, trata-se de uma narrativa divertida e despretensiosa em que a viagem em si é muito mais interessante do que o destino.

Pé na estrada

Indígenas de Férias (Dublinense, 2022)
O casal indígena Mimi e Bird, ela Cherokee e ele Blackfoot, sai num mochilão pela Europa em busca de uma relíquia familiar e do paradeiro de um antepassado retirado à força da reserva onde vivia. Na obra, que chegou primeiro ao Brasil no clube de assinatura da TAG, indicado pela escritora Margaret Atwood (“O Conto da Aia”), a premissa parece simples, mas aborda temas complexos que vão desde o envelhecimento e o companheirismo até temas políticos, as violências e feridas não cicatrizadas do preconceito. O escritor Thomas King, acadêmico e ativista de ascendência Cherokee, explora também uma veia cômica e irônica que transforma a leitura numa experiência extremamente prazerosa.

Heróis da Fronteira (Companhia das Letras, 2022)
Em seu novo livro de ficção, o autor do best-seller “O Círculo” (Companhia das Letras, 2014), Dave Eggers, narra uma viagem e uma fuga. Com sua vida profissional e pessoal em ruínas, a protagonista toma uma medida desesperada. Pega os dois filhos e os enfia num trailer caindo aos pedaços em direção ao Alasca. Num retrato sarcástico mas realista das famílias contemporâneas e da sociedade atual, vamos acompanhando uma jornada que começa como qualquer viagem de férias, mas se transforma cada vez mais numa perigosa perseguição rumo a uma das regiões mais distantes e solitárias do planeta.

Êxodo forçado

A Interessante Narrativa da Vida de Olaudah Equiano (Editora 34, 2022)
Desde a viagem da África à América, num navio de tráfico negreiro, até jornadas forçadas aos Estados Unidos, Caribe e América, este testemunho do escritor e ex-escravo nigeriano é um documento essencial para entender os sofrimentos da população escravizada em solo americano. Raptado e embarcado como mercadoria aos 11 anos de idade, a autobiografia de Equiano (1745-1797) retrata a realidade das condições em que eram realizadas as viagens da população escravizada. Publicado em 1789 e altamente influente em seu tempo, o livro é um dos mais importantes para a história da escravidão e ajudou a decretar a abolição do tráfico negreiro para as colônias britânicas.

De Costa a Costa (Companhia das Letras, 2022)
Nesta nova edição, o livro do historiador Jaime Rodrigues reconstrói a trajetória do tráfico de africanos para terras brasileiras nos séculos 18 e 19, do rapto em seu continente de origem à jornada por mar até o Brasil. Com a intenção de traçar uma história social da escravidão, que perdura nos dias de hoje com roupagens diferentes, o autor segue a rota que ligava Angola ao Rio de Janeiro, acompanhando todos os membros dessa cadeia. Na evocação de escravos, marinheiros, intermediários e suas negociações, Rodrigues aborda os impactos dessa viagem para milhões de africanos e suas implicações até os dias de hoje.

Ser Estrangeiro (Claro Enigma, 2022)
Desde 2015, o mundo vem convivendo com a crise dos refugiados, que deslocou milhões de pessoas de seus lugares de origem até destinos incertos e despreparados para recebê-los. Em “Ser Estrangeiro”, o jornalista João Paulo Charleaux explora as várias razões que levam tanta gente a deixar sua terra natal e explorar territórios desconhecidos. São guerras, perseguições políticas e religiosas, desastres naturais e econômicos. Parte da coleção Tirando de Letra, a obra analisa ainda as visões relacionadas ao estrangeiro e migrante, e o quanto todos estamos sujeitos a mudanças, imprevistos e tragédias a todo tempo.