Como consumir alimentos com mais consciência
Repensar a relação com a comida é essencial para ir em direção a um sistema alimentar mais sustentável para o meio ambiente e as comunidades produtoras e para manter-se saudável
Comer é um ato político, você já deve ter ouvido por aí. Se informar sobre o modelo vigente de produção, distribuição e comercialização de alimentos e começar a repensar escolhas e discursos, então, é essencial para que possamos construir um sistema alimentar menos desigual e mais sustentável para o meio ambiente e a população.
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Todos esses temas estiveram no debate “Comida para pensar o Brasil: (in)segurança alimentar, desigualdades e políticas públicas”, parceria entre Gama e a ACT Promoção da Saúde, que explicou relações entre agronegócio, alimentos ultraprocessados, crise climática e fome.
“É preciso toda uma agenda pública a favor do direito humano à alimentação adequada por meio de políticas intersetoriais”, disse Bruna de Oliveira, pesquisadora e nutricionista ecológica, que participou da conversa junto ao chef Rodrigo Oliveira, a socióloga Paula Johns e a jornalista Mariana Varella, editora-chefe do Portal Drauzio Varella.
No cenário atual, se você tem a possibilidade de escolher o que e onde comprar, existem atitudes individuais que podem ser tomadas no dia a dia para além de simplesmente comprar o que aparece na gôndola dos grandes supermercados.
Isso pode ser feito a partir de uma série de questionamentos sobre o caminho que a comida percorre até chegar ao prato: a pessoa que plantou esse alimento foi bem remunerada por isso? Qual o impacto ambiental e social da maneira como ele é produzido? A que tipo de sistema alimentar o lugar onde eu compro comida está a serviço? Para quem exatamente está indo meu dinheiro?
A seguir, Gama elencou algumas dicas para guiar essa reflexão.
Reduza o consumo de carne e de outros produtos de origem animal
A proteína bovina é apontada como o alimento que mais contribui para emissões de gases do efeito estufa e desmatamentos na Amazônia e no Cerrado, segundo o mais recente relatório sobre clima da ONU, e dietas à base de vegetais podem reduzir as emissões em até 50% comparado com a média de emissões da dieta Ocidental. Fora, claro, a crueldade animal envolvida em diversas indústrias do ramo. Qualquer redução de consumo nesse sentido, então, é válida.
Consuma de pequenos produtores
A produção orgânica busca eliminar danos sociais e ambientais. Para além disso, se aproximar de quem produz a comida é um caminho para valorizar o pequeno agricultor e fugir da lógica dos grandes supermercados, que espremem fornecedores e cobram deles uma série de taxas. Hoje há várias iniciativas que procuram encurtar a cadeia, principalmente em sistemas de delivery. Procure opções na sua cidade, entre feiras de produtores e locais como o Instituto Feira Livre, em São Paulo, e a Junta Local, no Rio.
Cuidado com “greenwashing”
O termo em inglês se refere ao ato de promover discursos e propagandas que criam uma falsa aparência de sustentabilidade, amplamente usado por várias indústrias, inclusive a alimentícia. Ou seja: não é porque uma embalagem é verde e diz que é “do bem” e “natural” que isso é verdadeiro. Desconfie, pesquise, pergunte.
Desconstrua a imagem “perfeitinha” dos alimentos
Alimentos in natura “feios” ou “batidos” são comumente deixados no mercado, contribuindo ainda mais para o imenso desperdício de alimentos no Brasil. Tanto é assim que existem projetos como o Fruta Imperfeita, sistema de entrega de cestas com frutas e legumes fora do “padrão do supermercado” que vêm direto do produtor. Produtos orgânicos também costumam vir em formatos diferentes do “habitual”.
Prefira pequenas marcas de pequenos estabelecimentos
“A gente vive um modelo com grande concentração de poder: tem poucas empresas dominando esse campo da alimentação”, disse a socióloga Paula Johns na live. Um levantamento recente mostra que 11 empresas gigantes são donas de quase tudo o que encontramos em um supermercado tradicional, o que promove ainda mais concentração de renda, entre outros impactos negativos. Por isso a necessidade de procurar pequenos mercados, feiras e hortifrutis com outras propostas e apoiar marcas que incentivem outras lógicas de produção e comercialização – ligadas, por exemplo, a conceitos da economia solidária.
Reduza o consumo de processados, principalmente de ultraprocessados
Refrigerantes, salgadinhos, bolachas, cereais matinais, nuggets. “Ultraprocessados não deveriam ser chamados de comida, é outra categoria, é um produto comestível que não nos alimenta e ainda tem uma série de impactos na saúde e no meio ambiente”, explica Paula Johns. Para piorar, esses produtos são mais baratos e têm o consumo incentivado por grandes supermercados.
Opte por comida de verdade, priorize vegetais e diminua a quantidade ingerida
Essa recomendação do americano Michael Pollan, uma das principais vozes a falar sobre alimentação saudável e sustentável, foi citada pelo chef Rodrigo Oliveira, e pode guiar seu consumo. Ela está de acordo também com o Guia Alimentar Para a População Brasileira, do Ministério da Saúde, que propõe que alimentos in natura ou minimamente processados, predominantemente de origem vegetal, sejam a base da alimentação.
Tenha cuidado com o desperdício
Diminuir o desperdício de alimentos em casa é uma das maneiras mais fáceis de reduzir o impacto climático pessoal, de acordo com relatório do Programa da Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Isso requer planejamento na hora de comprar, preocupação com o armazenamento e reaproveitamento de partes como talos e cascas.
Plante em casa
“Plante, não importa onde você mora. Acompanhar o desenvolvimento das plantas faz com que a gente valorize o agricultor familiar, aquele que de fato alimenta a população e também ajuda a trazer um letramento ecológico”, disse a nutricionista ecológica Bruna de Oliveira no debate. Se seu espaço é reduzido, comece com uma hortinha de temperos.
Composte seu lixo orgânico
Pensando de forma cíclica, o descarte de alimentos também entra nessa conta, ainda mais porque cerca de 51% dos resíduos sólidos urbanos coletados nas cidades brasileiras correspondem à matéria orgânica e a maior parte vai parar em aterros sanitários, onde se decompõem liberando gás metano, mais poluente que o CO2. Uma solução é ter uma composteira doméstica, vendidas por lojas como a Morada da Floresta. Também dá para contratar empresas que retiram os resíduos em casa e cuidam da compostagem, como a Ciclo Orgânico e a Casca, no Rio de Janeiro (RJ), e o Projeto Compostar, em Brasília (DF).
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