Maria Ribeiro
Remedinho, hambúrguer e Justiça
Quando um homem da pré-história fez três perguntas para uma mulher do futuro
Foi em uma CPI do MST. CPI. Comissão Parlamentar de Inquérito. MST. Movimento Sem Terra. Importante dar nome e sobrenome porque identidade é lastro. Vira livro, meme, auto de processo. E porque foi ali o ocorrido. Quando um homem da pré-história fez três perguntas para uma mulher do futuro.
Em tese, a gente deveria comemorar um sujeito daqueles ser capaz de formular questões e produzir sinapses. Em vez de apenas caçar e fazer desenhos. Mas, na prática, a teoria… (pode completar a frase e substituir a palavra de sempre por “machista”). Isso. Até ela. A teoria. Que nem os substantivos femininos estão a salvo do patriarcado da Barbie.
Os dados do sujeito eu faço questão de não dar. Mas a mulher do futuro tem um nome bonito e diferente. Sâmia. Para não esquecer. Para falar a verdade, são dois, os nomes inesquecíveis e atípicos: Sâmia e Talíria. Anota aí. Dá um Google. Que amizade é amor com validade estendida.
Brasília, às vezes não dou conta. Essa semana, então, estive em Nárnia, mas sem os figurinos da mulher de gelo
Eu vi a cena primeiro no Instagram, para só depois entender o contexto. O que não me impediu de, de cara, enxergar o óbvio: violência política de gênero. Misoginia, Gordofobia. Mais do mesmo. Sim, vamos falar até que um dia esse tipo de agressão vire crime. Vou descrever o recorte a que assisti.
Um homem em um lugar de poder. Geográfico, inclusive. Como se estivesse em um palco. Na plateia, outros homens. E algumas poucas mulheres. Ele se dirige a uma delas, a de nome Sâmia e, em meio a uma discussão, faz as seguintes perguntas:
— A senhora está nervosa?
— Quer um remédio?
— Ou quer um hambúrguer?
Brasília, às vezes não dou conta. Essa semana, então, estive em Nárnia, mas sem os figurinos da mulher de gelo. Com minha mãe se recuperando de uma cirurgia, mal ouvi o Foro de Teresina. Fui salva pelo podcast do Nando Reis e por um pudim de leite de uma padaria do Jardim Botânico.
Sim, estou nervosa. Às vezes preciso de remédios. E sou absolutamente apaixonada por hambúrguer. Se junto disso, vier um pouco de Justiça, aí então vai ser tipo ganhar na loto, ou ser botafoguense em agosto de 2023. O que dá no mesmo.
Sâmia e Talíria. Anota aí.
Maria Ribeiro é atriz, mas também escreve livros e dirige documentários, além de falar muito do Domingos Oliveira. Entre seus trabalhos, destacam-se os filmes "Como Nossos Pais" (2017) e "Tropa de Elite" (2007), a peça "Pós-F" (2020), e o programa "Saia Justa" (2013-2016)
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