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ConversasJüne Plã: 'Aproveite o sexo como uma sessão de massagem'
Ilustradora francesa cansou de explicar como chegar ao orgasmo para seus parceiros e resolveu desenhar. Literalmente. Ela agora lança um livro ilustrado com caminhos para o prazer
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Jüne Plã: ‘Aproveite o sexo como uma sessão de massagem’
Ilustradora francesa cansou de explicar como chegar ao orgasmo para seus parceiros e resolveu desenhar. Literalmente. Ela agora lança um livro ilustrado com caminhos para o prazer
Como diz a própria Jüne Plã nas primeiras páginas de seu livro, o recém-lançado “Clube do Orgasmo: Uma cartografia do prazer” (Intrínseca, 2022), é preciso muito “fogo no rabo” para o sexo ser uma experiência prazerosa a longo prazo. Na vida de um casal, é fácil cair na armadilha do roteiro repetitivo entre quatro paredes, e a ilustradora francesa foi uma das vítimas. Entediada com sua vida sexual e cansada de ter que explicar para seus parceiros a fórmula para o prazer, decidiu escrever um almanaque do sexo – pensado para todes.
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“O que proponho não é nada mais, nada menos do que uma breve lição de anatomia, acompanhada de uma cartografia das múltiplas zonas de prazer das duas genitálias, e um inventário de movimentos que provocaram reações de prazer, orgasmo ou gozo”, explica a ilustradora. Com uma linguagem informal e divertida, a obra é uma extensão do perfil de Plã nas redes, Jouissance Club, onde, desde 2018, ela vem publicando seus desenhos e dicas de sexo. Hoje ela conta com mais de 980 mil seguidores.
Em um papo com Gama, Jüne Plã conta do processo de escrita, suas descobertas e mudanças ao longo da elaboração do livro e da importância da inclusão no debate sobre sexualidade. “O fato de que temos tantas maneiras e possibilidades de nos tocar e tocar o outro é um convite à exploração mais lenta e cuidadosa do corpo”, explica ela na entrevista que você lê a seguir.
Precisamos lutar contra essa pressa de fazer tudo correndo, até transar correndo
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G |Toda a ideia do livro começa com suas publicações no Instagram. Como esse perfil começou e qual é o engajamento do público às ilustrações que você publica?
Jüne Plã |Foi tudo muito rápido. Comecei meu perfil no Instagram em 2018, e no primeiro mês, o movimento foi mais lento, mas logo em seguida contas muito influentes e com um bom número de seguidores compartilharam minhas publicações. Ainda fico chocada com a grandeza da comunidade que existe no meu perfil. Como é um assunto interessante e que, na época, na França, a mídia estava especialmente entusiasmada, fiz uma série de entrevistas e a conta foi crescendo. No início, só desenhava truques e dicas eróticas para mulheres, até que começaram me pediram para desenhar pênis também. Em determinado ponto, as pessoas chegavam à mim pensando que eu era uma sexóloga, e me faziam perguntas complexas. Fui honesta dizendo que não era minha profissão, e que poderia apenas tentar ajudar.
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G |No livro, alguns especialistas aparecem para comentar e explicar alguns conceitos. Você sempre estudou sobre sexualidade? Como foi esse processo de estudo durante a produção do livro?
JP |Sim, precisei convidar especialistas para me ajudar, porque não sabia nada sobre a anatomia do clitóris, da vagina, do pênis. Tudo que encontrei na internet era falso. A pesquisadora Odile Fillod foi uma aliada, graças a ela toda a informação no livro é verdadeira. Claro, precisei me informar para escrever, mas, para ser honesta, grande parte das informações que aparecem foram encontradas e compartilhadas comigo pelos meus seguidores. No meu perfil, sempre falei das minhas dúvidas, questões, histórias, e as pessoas me respondiam com suas próprias vivências. Então, fiz um apanhado com esses relatos que recebi. E esse compilado, muito pessoal, foi muito mais precioso para mim do que aquilo que encontrei em títulos didáticos. O livro foi basicamente escrito junto aos meus seguidores, e é isso que o torna tão especial e particular. Foi um trabalho em grupo. Como somos tão diferentes, queria muito falar sobre a variedade de problemas e de soluções que existem quando o assunto é sexualidade.
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G |Na introdução, você conta que fica chocada com a falta de habilidade dos seus parceiros na cama, e justamente por isso decidiu escrever o livro. Por que você acha que as pessoas ainda têm tanta dificuldade para entender o corpo do outro e a lógica do prazer?
JP |Bom, porque não há informação de qualidade sobre sexo, nem na internet, nem nas escolas. E é uma vergonha que a única informação que encontrávamos, algum tempo atrás, era o pornô. No máximo, cenas de Hollywood de casais heterossexuais que gozam ao mesmo tempo só com a magia da penetração. Isso era tudo que víamos de informação sobre sexo. Talvez fosse por isso que meu parceiro, e o de qualquer pessoa, não entendesse o meu corpo e de outros. Nem eu entendia o meu próprio corpo, essa é a questão. É difícil culpar uma pessoa nessa história.
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G |O que mudou no sexo e na nossa relação com o prazer depois da pandemia?
JP |As coisas mudaram um pouco. Claro, conseguimos encontrar mais informações na internet, graças a perfis online de feministas, pesquisas, etc. Isso é ótimo, mas não é o suficiente. Seria incrível se as escolas tivessem um papel mais ativo na conversa sobre sexualidade. Não precisamos entrar em detalhes, mas simplesmente falar sobre consentimento, gênero, orientação sexual. Assim, mais pessoas estariam alertas sobre essas questões. Estariam mais preparadas para proteger seus corpos e o corpo do outro. Recebi muitos feedbacks de seguidores sobre meu livro, e sinto um alívio em saber que sua sexualidade melhorou, mesmo que muito pouco. Fico feliz e me sinto orgulhosa. Os pilares de uma sexualidade prazerosa, que comento no início do livro, são essenciais, são básicos, e não só para um sexo mais gostoso – quem os tem como valores é um ser humano melhor num geral.
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G |Qual é o maior erro dos casais quando falamos de ter prazer a dois?
JP |É muito difícil para os casais compartilharem seus limites, conversar sobre sexo de uma maneira fácil, simples, descontraída. Não sei se é um erro porque fomos educados dessa forma, é um tabu falar deste tema. Mas o grande erro é não conversar. A comunicação é a chave. Não expressar seus limites, antes de qualquer coisa, dificulta muito a possibilidade daquele casal de ter uma boa vida sexual. Por mais que pareça simples, a comunicação é um passo importantíssimo para melhorar o prazer a dois.
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G |O que é essencial que os homens aprendam em relação ao corpo da mulher? E as mulheres em relação ao corpo do homem?
JP |Há muitas coisas que não sabemos sobre nossos próprios corpos e os corpos dos outros. O que mais me impactou, ao escrever o livro, foi descobrir todas essas áreas de prazer que existem nas nossas genitais e não conhecemos. São mais de dez áreas de prazer no clitóris e seus arredores. Isso é maravilhoso, porque é possível levar criatividade para a cama, não há um único jeito de ter um orgasmo. Não há um único jeito de se tocar e tocar o outro. Se fosse para elencar um aprendizado sobre o corpo da mulher e um aprendizado sobre o corpo do homem seriam eles: atenção ao clitóris e à próstata, simples assim. São duas partes que deixamos de lado por muitos anos, e precisamos falar sobre elas. Agora estamos começando, as pessoas estão mais conscientes.
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G |E as zonas erógenas para além das genitais?
JP |São incríveis! Muitas vezes, temos uma ânsia pela pressa. Queremos tudo muito rápido, esquecemos de respirar e tirar um tempo para aproveitar nossa sexualidade e explorá-la. O fato de termos tantas maneiras e possibilidades de nos tocar e tocar o outro é um convite à exploração mais lenta e cuidadosa do corpo. Você não precisa ir direto para as genitais, direto para a penetração, você pode simplesmente aproveitar aquele momento, da mesma forma como se aproveita uma sessão de massagem, por exemplo. Todos nós amamos ser massageados, seja por uma hora, duas horas, o dia inteiro. Por que não reservamos e aproveitamos esse tempo na cama, para nos tocarmos? Precisamos lutar contra essa pressa, fazer tudo correndo, até transar correndo. Uma vez ou outra fazer uma rapidinha, tudo bem, mas todas as vezes vai ficar chato, tedioso, assim como comer a mesma refeição todos os dias.
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G |O uso de uma linguagem informal e descontraída foi uma decisão consciente? Por que optou por essa informalidade?
JP |Primeiro de tudo, porque gosto de fazer piada, brincar, dar risada. Essa sou eu. E acredito que a sexualidade é um tema sensível para muita gente. Queria tornar a conversa mais fácil, mais tranquila, e colocar a sexualidade em um lugar seguro, onde as pessoas possam transar e dar risada com os parceiros, sem tanta seriedade. Não precisa ser pesado. O humor, na minha opinião, é uma ferramenta, podemos usá-lo mais na sexualidade, afinal, podemos transar, parar, fazer uma piada sobre algo que aconteceu ali na cama, voltar para o sexo, etc. O humor é uma maneira de fazer as pessoas se sentirem confortáveis. É mais fácil falar sobre sexo quando é divertido.
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G |Qual foi a ilustração mais desafiadora?
Jüne Plã |Acho que as mais desafiadoras foram as relacionadas a anatomia, porque você precisa de um desenho muito preciso, e não perpetuar as mesmas besteiras que são ditas há tanto tempo. Então, precisei ser bem cautelosa nessas ilustrações. Mas no resto do livro, só foi divertido, não teve nenhum desafio.
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G |Você cita no livro também da dificuldade de se conhecer, se tocar e sentir prazer, mesmo quando estamos a sós. Por que você acha que isso ainda acontece?
JP |Somos todos diferentes, e realmente não posso falar para as pessoas se tocarem se elas não querem fazer isso. Mas acho que a razão para isso é uma questão das mulheres. Elas não querem se tocar, muitas vezes. Não querem porque aprenderam que seus corpos são sujos e é difícil olhar para ele, explorá-lo e sentir prazer, porque podem sentir que estão fazendo alguma coisa errada. Já escutei mulheres que preferem ser tocadas por seus parceiros do que por elas mesmas, mesmo que eles não soubessem tão bem como fazer isso. Mas se você não conhece seu próprio corpo, como pode guiar o outro para o seu prazer? É muito importante se conhecer, mas infelizmente não posso forçar ninguém a fazer isso. O sexo também envolve traumas e questões delicadas.
Muitas mulheres também não gostam de se tocar com as próprias mãos, e precisam comprar sex toys e outros aparatos para que assim exista uma barreira entre suas mãos e as genitais. Por isso também quis explorar brinquedos, travesseiros, chuveirinhos e outras formas de chegar ao orgasmo sem colocar as mãos direto nas genitais, para que essas pessoas pudessem tentar algumas práticas e não se sentissem desconfortáveis com seus corpos. -
G |Qual foi o processo de elaboração das dicas para as zonas de prazer dos diferentes corpos?
JP |Experimentei muitas coisas [risos]. Os truques precisavam ser testados e validados, então testei muitas coisas em mim mesma. Também pesquisei muito em sites pornô, que têm uma área de instruções. Se você pesquisa bem, dá para encontrar vídeos muito interessantes de massagem na vulva, que não são destacados pelo pornô ‘mainstream’. Peguei alguns truques ali. Mas todas as dicas vieram da minha experiência, das pesquisas que fiz e até de conselhos e histórias de alguns seguidores. Foi divertido ser paga para experimentar todos esses truques, quase ser paga para fazer sexo [risos].
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G |A questão da inclusão era essencial para você?
JP |Muito. Mesmo que eu seja uma mulher cisgênero, a sexualidade não deve estar sempre no prisma hétero e cis. Não é justo que só essas pessoas tenham acesso a informação sobre sexo prazeroso. Escrevi esse livro quando era hétero, e meu público alvo eram os homens mesmo [risos], queria ensiná-los a fazer diferente porque sei que há muitos problemas nos casais heterossexuais. Mas não precisa ser apenas para eles, é importante falar com todo mundo. Queria que todos se sentissem bem-vindos ao clube. Temos que acabar com a ignorância em relação a pessoas trans, não-binárias, todas elas. Sonho com um mundo em que não excluiremos essas pessoas da conversa sobre sexo e prazer. No início do meu perfil no Instagram, não tinha consciência sobre toda essa questão. Mas tenho uma comunidade de seguidores incrível que me alertou. Encontrei com alguns e aprendi a escrever, ilustrar e me posicionar de maneira inclusiva. No começo foi difícil, mas hoje sou fluente em inclusão [risos].
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G |Sua sexualidade e relação com o prazer mudaram depois do livro?
JP |Sim. Há uma expressão francesa que diz algo como ‘a pessoa que faz os sapatos é a que não tem sapatos’ [em português, seria como ‘casa de ferreiro, espeto de pau’]. Essa expressão me define, porque escrevi esse livro pensando que melhoraria minha sexualidade, mas os caras com quem me relacionava não estavam interessados nos truques ou nas mensagens que queria passar. Então, quando terminei de escrever a última página, dei adeus à heterossexualidade. Passei a me relacionar com pessoas da comunidade queern e descobri novas facetas da minha sexualidade. Não me arrependo nem por um segundo. E foi curioso porque descobri que as pessoas da comunidade queer já sabiam grande parte do que estava no meu livro. Elas sabem como funciona, entendem que podem ter uma sexualidade prazerosa sem recorrer à penetração o tempo todo. Foi um alívio não ter que desenhar para elas também.
- Clube do Orgasmo: Uma cartografia do prazer
- Jüne Plã
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