CV: Alex Batista
Antes de se tornar fotógrafo ele foi office boy, assistente em um estúdio até finalmente marcar sua identidade fotográfica na publicidade, moda e fotojornalismo
Enquanto corria pelas mais movimentadas avenidas e ruas da cidade de São Paulo, Alex Batista tinha um objetivo. O garoto trabalhava há mais de quatro anos como office boy em uma emissora de TV e, cansado do emprego que não oferecia qualquer perspectiva de crescimento, formulou um plano que o ajudaria a sair dali.
Durante um ano, juntou dinheiro para se manter por um breve período. O tempo foi utilizado para Batista se organizar e ter a certeza de que era aquilo mesmo que ele faria. Os pais não se opuseram e após cinco anos trabalhando como office boy, Alex se demitiu e foi viver de fotografia.
A renda recolhida por um ano não durou muito — três meses para ser exato –, mas foi tempo suficiente para ele aprender o básico de como operar uma câmera e iniciar sua carreira como assistente de um fotográfo profissional.
Para Batista, a fotografia não era uma aspiração artística e sim um trabalho como tantos outros. Ele atuou como assistente do fotógrafo Gustavo Zylbersztajn durante cinco anos — um período longo no meio. Batista sabe que para os assistentes e fotógrafos mais jovens, dedicar tanto tempo para ser assistente de alguém é inconcebível. “Mas eu queria ser o melhor assistente antes de ser o melhor fotógrafo”, justifica.
Batista é um fotógrafo independente que transita entre a publicidade, a moda, o fotojornalismo, mas hoje prefere focar nos próprios interesses. O que antes era uma simples execução, se tornou uma vontade de se expressar e se descobrir artisticamente.
“No lugar onde eu estou, quando alguém me pergunta o que eu fotografo, gosto de responder que fotografo pessoas. Não moda ou publicidade. Eu sou um fotógrafo de pessoas.”
Gama bateu um papo com Alex Batista sobre sua trajetória profissional, os desafios que encontrou ao longo do caminho e as dicas que dá para aqueles que, assim como ele, já pensaram em seguir essa profissão.
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G |O que te trouxe até aqui?
Alex Batista |A minha vontade de ser fotógrafo. Quando eu era mais jovem, consumia todas as revistas de skate. Enquanto andava, comecei a querer fotografar eu e meus amigos. A curiosidade sempre existiu, mas eu nunca tinha conhecido um fotógrafo, visto a profissão em ação. Sempre gostei de moda — de como as pessoas se vestiam. Desde o tempo da escola gostava de como as pessoas se comunicavam por meio de suas roupas. Estudei minha vida inteira em uma escola estadual e lá nós vestíamos uniformes. A única maneira de se destacar era pintar o cabelo ou usar um tênis diferente. Dependendo do tênis que as pessoas usassem, eu sabia se ela andava de skate ou se ela jogava futebol. Até que descobri que existia a profissão de assistente de fotografia. Até então, achava que era só comprar uma câmera e se tornar fotógrafo, não conhecia o cargo de assistente. Corri atrás e acabei encontrando um emprego em um estúdio em São Paulo. O lugar onde eu comecei a trabalhar era comercial. Ali, aprendi a função de ser fotógrafo — não havia nada necessariamente artístico. Eu era muito jovem e precisava de um emprego. Se a agência de publicidade queria que eu fizesse a foto de tal jeito, eu aprendia a executar isso. Eu tenho uma coisa consciente de deixar uma marca pessoal nos trabalhos que faço, mas ali estava basicamente executando o trabalho. Era um emprego formal, trabalhando todo dia das nove da manhãs às seis da tarde.
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G |Você teve algum mentor?
AB |Quando descobri a vaga de assistente de fotografia, fiz uma lista de fotógrafos que admirava e que queria trabalhar junto. Comecei a stalkear os caras — meio bizarro mas na época ainda era aceitável (risos) –, liguei para eles e fui nos estúdios entregar currículo. Nada disso funcionou, é um trabalho de confiança e a pessoa precisa te conhecer, entender quem é você. Até que um dia eu conheci o Gustavo Zylbersztajn, na época ele tinha 29 anos — hoje é um super fotógrafo, amigão. Ele estava no começo da carreira e não tinha dinheiro pra me pagar. Eu também não podia cobrar porque não sabia fazer nada. Então nós fizemos um acordo. Pedi demissão da emissora, peguei minha rescisão de salário e falei “cara, eu consigo me custear com essa grana por três meses. Vou dar um gás para aprender e depois você começa a me pagar”. Foi assim que entrei no mundo da fotografia.
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G |Você teve que abrir mão de algo para chegar onde chegou?
AB |Tudo é um grande sacrifício. Editar é tirar coisas, enquadrar é focar em algo e tirar outra coisa de atenção. É preciso escolher sempre, é preciso editar tudo. No começo, fiquei muito empolgado em aprender a profissão. Office boy era um emprego mas não era uma profissão. Foi a primeira vez que me interessei por algo e que fui pago por isso, tudo era válido. Eu não namorei, eu não saia com os meus amigos. Tudo para mim era trabalho e eu adorava trabalhar. Nisso passaram-se anos e eu nem vi, foi tudo bem rápido.
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G |Quais você considera que sejam os principais desafios na sua área e como você lida com eles?
AB |A parte financeira. Eu sabia que era uma profissão cara. A câmera é cara, os flashes são caros, o computador é caro. É como alugar um lugar para criar uma loja, você não sabe se alguém vai entrar lá pra consumir. Nesse caso, você vai abrir um estúdio e investir. O investimento para começar é muito alto. Antigamente pagava-se muito bem. Hoje em dia os valores já estão bem menores. Nos últimos três anos as coisas apertaram, os cachês eram maiores e as publicidades tinham mais dinheiro. Você pagava muito caro para ter as coisas, mas consequentemente também ganhava dinheiro para manter tudo.
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G |O que você diria para alguém que pensa em trilhar um caminho parecido com o seu?
AB |Primeiro de tudo: você tem que fotografar. Fotografar tudo, todos os dias. Fotografando você vai entender o que você gosta, o que você não gosta, o que funciona e o que não funciona.
É importante fotografar em equipe, em conjunto. Você vai entender de que nem tudo é sempre do seu jeito. Na verdade, na maior parte do tempo as coisas não são do seu jeito. É necessário ser bem resiliente porque é uma profissão de muitos altos e baixos. Tem época em que todos estão falando de você, sempre há alguém te procurando. Tem época que parece que ninguém gosta de você, que ninguém lembra de você. A situação atual do país, onde os incentivos culturais são diminuídos ou cortados, impacta a profissão. O marketing vai ser o primeiro lugar que as marcas vão cortar no orçamento e a campanha para a qual você seria contratado não vai mais existir. É uma profissão muito volátil. Tem coisas que você pode controlar, mas tem coisas que você não tem controle algum. O lance é ser paciente, resiliente. Nada vem rápido, tudo demora um pouco.
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G |Qual a sua missão na sua profissão?
AB |Fiz dez anos fotografando ano passado e nesse período praticamente só fiz o que me era pedido. Eu executei muitas coisas, mas hoje tenho outros interesses. Quero fazer meu trabalho pessoal, independente se eu estou sendo contratado ou não, cada vez mais botar a minha identidade na imagem. Se alguma marca se interessa por isso e quer juntar tudo, para mim é o melhor dos mundos. Acontece, mas bem menos do que eu gostaria. É um mundo bem utópico.
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G |Você vive para trabalhar?
AB |Hoje, a grande maioria das pessoas vive para trabalhar. Eu não sou diferente. Eu escolhi isso. Por muito tempo, não tive um hobby. Meu hobby era fotografar. Eu adoro discutir sobre fotografia. A maioria das coisas legais que eu fiz na vida foram através da fotografia, eu nunca viajei tanto quanto viajei por conta da fotografia. Fui a diversos lugares que eu não iria se não fosse pela foto. Hoje eu vivo para pagar conta, porque é o que está todo mundo fazendo. Está difícil, é um desafio diário.