Estereótipos e tabus se estilhaçam quando ela abre a boca. Despontou com “Pajubá”, de 2017 e virou ícone incontornável da cena queer brasileira. Agora, prepara seu novo álbum inédito, “Trava Línguas”
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Qual é sua ideia de felicidade perfeita?
Minha ideia de felicidade perfeita é imperfeita, momentânea e de instante. É fincar os pés no chão. Me presentificar pra conseguir observar e extrair prazer dos momentos que vivo. O que nem sempre é possível, mas ao menos assim consigo ou tento tornar mais suportável. É ter força e vontade de continuar tensionando meu corpo para gerar movimento. Que talvez seja um sinônimo de felicidade.
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Qual é o seu maior medo?
Eu diria inicialmente que meu maior medo é a morte. Mas acredito que eu estaria me enganando, em partes. Tenho medo de morrer porque tenho medo de deixar de me transformar. De me mover. Tenho medo de me conformar com o que quer que esteja sendo. Tenho medo de deixar de pulsar. De pensar diferentemente de como eu já penso. O que talvez seja um tipo de morte. Tenho medo da inércia.
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Que característica mais detesta em você?
Detesto minha insegurança. Que, na verdade, não é minha nem me pertence. Não lembro exatamente quando ela se alojou em mim e fez morada parasita. Mas percebo que criou uma série de afetos colaterais que não suporto. Como medo de perder, medo de tentar pra não correr o risco de perder, uma dúvida que me paralisa, o ciúme, a inveja. Frutos de uma mesma árvore que já nascem podres e azedos.
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Que característica mais detesta nos outros?
Detesto nos outros o egoísmo, a conformidade, a conservação da tradição sem contradição.
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Que pessoa viva você mais admira?
Que pergunta mais difícil. Seria injusto e cruel eleger apenas uma pessoa. Acredito que eu nem admire assim apenas um alguém totalmente. Eu admiro minhas parceiras, eu admiro minhas amigas, pessoas à minha volta que me movem e fazem parte do que construo. Admiro muitas pessoas que produzem pensamentos que me instigam. Às vezes admiro até a mim. A Linn. Não sempre. Mas também.
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Qual é a sua maior extravagância?
Minha maior extravagância é pensar. Penso demais e demasiadamente. Em excesso e em acesso. Mas penso e sinto. Sem comedimento.
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Qual é o seu estado mental atual?
Confusa. Atualmente estou confusa e inquieta. Oscilante e perdida. Mas procuro me encontrar.
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Que virtude considera superestimada?
Considero a produtividade superestimada em alguns momentos. Principalmente em ocasiões como esta. Quando a internet nos estimula a produzir incessantemente a fim de gerar conteúdo e engajamento e, principalmente, distração excessiva. Uma produtividade que nem ao menos damos conta de consumir.
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Em que ocasião você mente?
Algumas vezes minto para o meu próprio bem. Minto para me fazer acreditar e me mover em outras direções. Minto quando tenho que parecer mais corajosa e determinada do que sou. Mas acredito que nesses momentos eu não minta, mas invente minhas verdades. Ou talvez esteja mentindo exatamente agora. Ou mentindo que estou mentindo. Eu minto que nem sinto?
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O que menos gosta sobre sua aparência?
Gosto muito pouco do meu nariz. É muito intrometido e extravagante. Está à frente de mim mesma. E também não gosto das minhas olheiras que denunciam o meu cansaço e revelam pra mim que deveria ter dormido mais enquanto pude. Mas dizem que elas também são fruto da mistura das raças. Daí, então, passo a suportá-las.
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Que pessoa viva você mais despreza?
Atualmente detesto o Bolsonaro e sua corja.
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Que qualidade mais admira em um homem?
Em um homem admiro a feminilidade, a coragem de admitir estar errado, a disposição em ouvir e o movimento de colaborar com a mudança.
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Que qualidade mais admira em uma mulher?
Em mulheres admiro a força, a coragem, o enfrentamento, a fúria, a desobediência, a determinação, a intuição e a disposição de pensar e agir coletivamente.
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De que palavras ou frases você abusa?
Eu acredito que acho, penso, sinto em demasia e portanto trago demais essas palavras em meu repertório. Sem contar o corpo que em mim está sempre presente.
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O que ou quem é o maior amor da sua vida?
Eu amo muito meu companheiro, amo demais o meu trabalho, minha vida, minha trajetória, porém detesto o amor. Pois o compreendo como uma das principais ferramentas de manutenção desse sistema. CIStema. O amor romântico. RomanCIS. Fundamento e pilar das ruínas que ainda sustentam e estruturam nossa sociedade. Mas talvez o que mais ame sejam minhas contradições.
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Quando e onde você foi mais feliz na vida?
Fui feliz nos momentos em que fui mais simples. E quando ainda sou. Quando senti que as coisas estavam caminhando e que meu caminho estava florescendo e frutificando. Como ainda está. Quando lancei meu disco com financiamento coletivo. Quando fiz um trabalho que me fez atravessar o oceano junto com as minhas. Meu filme. Inclusive não esqueço quando a Jup chegou naquela Alemanha fria. Eu chorei de felicidade. Também fui feliz quando aprendi a nadar. Em Salvador. Solar do Unhão. Fui feliz porque aprendi a boiar e me senti no útero do mar. Não que eu me lembre como era no útero, mas sinto que talvez fosse assim. Quando senti que pertencia
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Que talento você mais gostaria de ter?
Não acredito muito em talento como qualidade inata. Mas como processos que se desenvolvem à partir de trabalho e dedicação. Por isso, gostaria de ter e/ou me provocar mais a ser disciplinada e determinada. Aprender a manipular melhor a tecnologia e coisas fora de mim.
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Se você pudesse mudar uma coisa sobre você, o que seria?
Esteticamente, meu nariz. Talvez botasse um peito ou dois. Talvez. Mas com certeza se pudesse mudar algo gostaria de ser um pouco mais objetiva, determinada e segura. Inclusive a ponto de estar confortável e feliz com meu corpo. Porém já amo meu corpo. Mas talvez isso me deixasse estável e estática demais. Será que se mudasse isso ainda seria eu? Um outro eu?
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O que considera sua maior conquista?
Minhas maiores conquistas são morar sozinha, mesmo que não só. Ajudar minha mãe financeiramente, também minhas amigas e parceiras sempre que posso. Meu trabalho e seu desenvolvimento. Minha carreira. Meu disco, meu filme, as pessoas que acreditam no que faço. Minhas relações. E principalmente, uma certa calma e coerência comigo mesma, que me fizeram perceber que uma das minhas grandes conquistas é compreender que ser artista é poder criar sobre meu próprio tempo. No meu tempo. Respeitando meu processos. Sem pressa. Paciência e pressão.
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Se você morresse e voltasse como uma coisa ou uma pessoa, o que você gostaria de ser?
Gostaria de ser uma árvore.
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Onde você mais gostaria de morar?
Gostaria de morar perto do mato e da água. Perto do encontro entre o rio e o mar.
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Qual é o seu pertence mais estimado?
Minha cama.
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O que você considera o nível mais baixo da desgraça?
A conservação de si mesma. Avareza. A dominação.
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Qual sua ocupação favorita?
Gosto muito de escrever. Criar. Criação e destruição. Gosto de criar e destruir. Ser outras. Inventar.
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Qual sua característica mais marcante?
Me digam vocês. Eu, da minha parte, acho que é muito marcante em mim o diálogo. A dúvida. A criatividade. Uma certa facilidade em me adaptar e ouvir o outro. E a outra. Sou influente e influenciável. A palavra em mim é um marco. Marcante.
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O que você mais valoriza em seus amigos?
Com certeza a paciência. Pois se são meus amigos e amigas devem ser muito pacientes, equilibradas e generosas.
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Quais os seus escritores favoritos?
Gosto muito de Clarice Lispector, Foucault, tô amando Ana Maria Gonçalves, gosto demasiado de Castiel Vitorino; poxa, são tantas. Mas quando cheguei a São Paulo encontrei "A Descoberta do Mundo", da Clarice, no lixo. Foi um dos primeiros livros que li de espontânea vontade. Foi um presente. Porém, relendo-a hoje, percebo muitas outras coisas que não via antes. Um olhar mais social sobre sua obra que me faz mais desiludida e crítica. Gosto disso. Fiquei um tempo sem ler muito. Hoje voltei a ler incessantemente. Quase sempre. Leio um pouco de tudo e de todas.
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Quem é seu herói na ficção?
Não tenho heróis. Nem heroínas. Não acredito e nem quero acreditar em salvação. Mas quando era criança amava o Homem-Aranha e os Power Rangers. Hoje penso muito na Carolina Maria de Jesus.
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Com qual figura histórica você mais se identifica?
Amo muito a Angela Davis. Que inclusive pode ser uma das pessoas que mais admiro em vida. Mas volto a pensar aqui na Carolina Maria de Jesus. Houve uma época em que achei que eu era a reencarnação da Clarice e do Focault. Cheguei pensar estar vendo o lançamento do meu filme em Paris. Mesmo não acreditando em reencarnação ou vida após a morte.
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Quem são seus heróis na vida real?
São pessoas que me fazem perceber que não precisamos de heróis ou heroínas. Que me fazem acreditar que não precisamos de salvação ou salvadores, mas de pessoas comprometidas com a vida e o presente. E nesse momento são trabalhadores da saúde, que têm atuado de forma tão corajosa pela população. São também pessoas que têm levado informação responsável pra outras pessoas. São anti-heróis e algumas vezes vistas até como vilãs do sistema.
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Quais são seus nomes favoritos?
Meus nomes favoritos? De todas que eu já fui a que eu mais gosto de ser é Lina. Mas se a pergunta é dos nomes que mais gosto de enunciar, eu diria que Vida, Céu, Terra. E Eva. Gosto muito de Eva.
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O que você mais detesta?
Eu detesto a mesquinhez com a qual estamos conduzindo o mundo. Detesto a nossa isenção em assumir nosso quinhão de responsabilidade dentro desse jogo político.
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Qual seu grande arrependimento?
Me arrependo dos momentos em que fiquei apegada demais às minhas conquistas e tive, então, medo de perder, e assim esqueci do meu real compromisso com o fracasso.
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Como gostaria de morrer?
Eu não gostaria de morrer. Mas se tiver que ser, que seja lutando ou com o mundo acabando.
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Qual é o seu lema?
Fodam-se os lemas e aqueles que os proclamam. É como diz o ditado, né?