Sete passos para sacar mais sobre saquê
A bebida milenar japonesa tem quebrado as fronteiras da cozinha do país, faz bonito até na alta gastronomia do Brasil e agora ganha festival. Veja como entrar no maravilhoso mundo da bebida fermentada de arroz
Não dá para dizer que o saquê é exatamente um alienígena para nós brasileiros. A bebida de 2 mil anos de idade já é aclimatada aos trópicos considerando a difusão da culinária japonesa em todo o território nacional e do histórico de imigração japonesa por aqui. Mas agora pode-se dizer que o saquê deu um novo passo: entrou em cardápios de restaurantes que não servem comida japonesa.
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Ao ultrapassar as fronteiras da harmonização regional, a bebida conseguiu chegar ao crème de la crème da alta gastronomia nacional, figurando em etapas dos menus de casas estreladas como as paulistas Evvai (uma estrela Michelin), do chef Luis Filipe Souza, e Fame, de Marco Renzetti, além do carioca Oteque (duas estrelas Michelin), de Alberto Landgraf, por conta de seu alto potencial de harmonização. Para completar, o saquê ganha a partir desta sexta-feira (4), um festival dedicado a si na Japan House com uma extensa programação de cursos, alguns presenciais, outros online, todos gratuitos (veja aqui).
Apesar de sua popularidade e expansão para novos territórios, no entanto, dá para dizer que conhecemos bem esse fermentado de arroz?
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O polimento do arroz e a água utilizada para fermentar a bebida são fundamentais para determinar o tipo de saquê a que vai se chegar
Se ainda sobram algumas dúvidas, trata-se de um fermentado – como vinhos e cervejas – e não um destilado, como uísque, vodca ou cachaça, fato que faz da saquerinha uma ideia bastante curiosa. Para fazer saquê, fermenta-se arroz, água e koji, um fungo filamentoso muito comum nas culinárias chinesa e japonesa para a fermentação do feijão de soja. Hoje é comum que o arroz passe por um processo de polimento, o que pode diferenciar o tipo da bebida. A água que será utilizada também é importantíssima. Nos saquês mais caros, os considerados premium, usa-se até água de degelo.
Para saber um pouco mais sobre o universo do saquê e, mais importante ainda, ter boas dicas para aproveitá-lo melhor, Gama ouviu dois especialistas no tema: Fabio Ota, Master Sake Sommelier pela Sake Sommelier Association inglesa e organizador do festival da Japan House; e Alexandre Tatsuya Iida, condecorado sake samurai pelo Japão, professor da Associação Brasileira de Sommeliers e diretor da Japan Sake Association, sendo uma espécie de embaixador da bebida no país.
Existem vários jeitos certos e alguns errados de beber saquê. O pior de todos é a caixa quadrada com sal
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Aumente seu vocabulário –
O mundo do saquê parece infinito e muito misterioso para quem está entrando, com uma imensa variedade de estilos, categorias de refinamento e classificações do doce para o seco. Para começar, foque nos quatro tipos mais conhecidos pelo mercado: o junmai, feito sem adição de álcool destilado, que deixa a bebida com mais corpo e cremosidade (um teste é girar a taça e ver a formação de lágrimas); o honjouzou, que é refrescante, tem aroma discreto e 10% de adição de álcool destilado; o nigorizake, bebida não filtrada de textura leitosa, sabor doce e intenso; e o namazake, o mais fresco de todos, que não é pasteurizado e portanto precisa ser mantido em constante refrigeração. -
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Beba saquê quente ou gelado, mas fuja da caixa quadrada com sal –
“Existem vários jeitos certos e alguns errados de beber saquê”, alerta Fabio Ota. Segundo ele, o pior de todos é a famigerada caixa quadrada em que se deposita sal na borda. Só existe uma explicação para adição de sal à bebida: maquiar sua má qualidade. “Trata-se de um fermentado que tomado puro é levíssimo”, explica. Quanto à temperatura, os mais leves e premium devem ser tomados em taças de vinho branco a 15 graus para que se observe bem as notas frutadas e delicadas de melão, banana, abacaxi. Os quentes, mais comuns no Japão, são servidos a até 55 graus em invernos rigorosos e são aquelas bebidas mais encorpadas e com mais umami, o quinto sabor, no paladar.Taças são os melhores copos para servir a bebida, mas os copinhos de cerâmica, simpáticos, tem uma função: fazer com que as pessoas se sirvam mais vezes – e no Japão você é servido pelo companheiro de mesa, nunca se serve – e que aumentem as interações sociais.
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Comece pelos mais refrescantes –
“No Japão, é comum que se comece pelo Sake Sparkling. Ele é menos encorpado e tem sabor mais suave, uma vez que as notas do fermentado de arroz são encobertas pelo gás. Também é recomendado um sake com adição de álcool destilado, o que deixa a bebida com menos corpo e refrescante para os iniciantes”, recomenda Alexandre Tatsuya Iida. -
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Escolha da geladeira –
O bom armazenamento de qualquer bebida é um garantidor de qualidade. Mas no caso do saquê essa recomendação torna-se ainda mais grave, pela delicadeza da bebida. Assim como ocorre com o vinho do Porto, é comum que o saquê seja tratado como um destilado, guardado na prateleira ao lado do uísque e do gim, por exemplo. Fuja dessas garrafas, elas estarão “cozidas”, explica Fabio Ota. O ideal é comprar saquês armazenados em geladeiras de cerveja e guardar a sua garrafa na geladeira de casa. Depois de aberta, consuma em até dois dias. -
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Cuidado com a sensação de leveza –
Se você já bebeu saquê em uma mesa animada, com amigos e muito papo, pode ter se surpreendido por uma leve tontura ao levantar. A sensação de leveza é explicada pela boa integração do álcool. O saquê tem em média entre 15% e 16% de álcool, que é o mesmo de um vinho de inverno. “O Sake tem uma sutileza no sabor e uma sensação de leveza que dá pouco impacto no paladar”, explica Iida. Fabio Ota chama atenção também para a acidez mais baixa que a de um vinho branco, o que torna fácil de beber. “Tem uma acidez menor, mas não quer dizer que não esteja presente. Há saquês que nos fazem salivar muito três segundos após a ingestão”, conta. -
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Aumente seu cardápio –
Como foi falado no início deste texto, o saquê ultrapassou as fronteiras da gastronomia japonesa e tem viajado por outros territórios. “Estamos vivendo uma revolução da harmonização e, no Japão, saquê tem sido servido até com frituras de presunto e queijo”, diz Fabio Ota. Da parte dessa que vos escreve posso dizer que experimentei comida com acento nordestino, do chef Rodrigo Oliviera, do Mocotó, incluindo dadinhos de tapioca e cozido de boi, com uma variedade de seis saquês e tudo funcionou. “O conceito é o mesmo da harmonização com vinho, por exemplo, vamos por semelhança ou por antagonismo”, diz Ota.Mas há um cuidado clássico que se deve tomar: o arroz. Isso não quer dizer que o consumo dos dois juntos esteja terminantemente proibido, mas é preciso tomar cuidados “Ao comer um sushi, o sabor doce do bolinho de arroz e da bebida pode enjoar o paladar. A saída é buscar algo salgado, como o shoyu, para mudar o padrão de sabor”, afirma Iida, indicando um terceiro elemento neutralizador.
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Melhor deixar o saquê fora da dieta –
Apesar da sensação na boca, saquê não é exatamente mais leve em álcool ou em calorias. Iida opina: “Todas as bebidas são calóricas sem exceção. Cem mililitros de saquê tem 94,4 kcal; de cerveja tem 43 kcal e de uísque de 43% tem 250 kcal. Só que é mais fácil tomar essa quantidade de uísque puro e encerrar a noite do que 1/3 de uma lata de cerveja. Então, é bem relativo qual bebida pode engordar e o outro não”.
Serviço
Festival do Sake
De 4 a 13 de março 2022
Onde: Japan House São Paulo – Avenida Paulista, 52, São Paulo-SP
Participação gratuita mediante inscrição*
Inscrições e programação completa no site
*É obrigatória a apresentação do comprovante de vacinação (visitantes acima de 18 anos com, pelo menos, duas doses do imunizante e, de 12 a 18 anos, no mínimo, uma dose)
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