Winnie Bueno
Refazer o Brasil com os brasileiros
A luta antirracista precisa ser compreendida como ela é: a única possibilidade de refazer o Brasil
Na última semana, a Coalizão Negra por Direitos realizou seu Encontro Nacional. Em um ano onde o movimento social negro foi protagonista das principais reivindicações por mudanças estruturais e o grande articulador de denúncias relativas ao governo Bolsonaro, a reunião de representantes das centenas de organizações que organizam a Coalizão é resultado dos esforços e da necessidade de reflexão sobre a construção de uma agenda política de justiça social que contemple aqueles e aquelas que são os principais alvos do recrudescimento do conservadorismo nos últimos anos. Aqueles e aquelas que foram os primeiros a dizer não em nosso nome. Os primeiros a retomar as ruas, ainda que na pandemia, para lutar pela permanência dos poucos direitos que foram conquistados com árdua luta desde o momento em que os povos negros pisaram neste território como pessoas escravizadas.
Já havíamos afirmado que “Sem Racismo não há Democracia!”, no manifesto que exige o firme e real compromisso de enfrentamento ao racismo. Essa frase não é mera agitação. Os diálogos realizados nesses três dias em Olinda apontam estratégias centrais para a ampliação da representação política da negritude, abrigadas na possibilidade de aumentar a bancada de negros e negras no Congresso Nacional.
A Coalizão Negra por Direitos vem afirmando a necessidade da justa reparação política, econômica e social. Contudo, ainda são muitos os desafios impostos pelo racismo para que essa pauta se realize. No momento em que as forças progressistas se articulam para a derrota de Bolsonaro, a coalizão demonstra e impõe algo fundamental para a conclusão dessa tarefa: ela não será realizada sem a presença e o protagonismo do movimento social negro.
Não há como restaurar a democracia sem reparar todo o processo de desumanização que recaiu e recai sobre metade da população do pais
O acertado movimento da organização de reunir diversos parlamentares, de diferentes territórios e diferentes partidos sob o manto de uma agenda política antirracista dimensiona o impacto dessa união de grupos que convida esses parlamentares que, prontamente, atendem a esse convite.
A luta antirracista precisa ser compreendida como ela é: a única possibilidade de refazer o Brasil. Não há como restaurar a democracia sem reparar todo o processo de desumanização que recaiu e recai sobre metade da população do pais.
Esse encontro é resultado dos acúmulos históricos do movimento negro e de um importante avanço no reconhecimento da relevância das lutas de resistência da negritude brasileira. Para a reconstruir o Brasil é preciso dos brasileiros, especialmente daqueles e daquelas que foram empurrados para os piores índices de desenvolvimento e que são aqueles que mais têm rejeição ao governo Bolsonaro.
Para que essas pessoas sejam devidamente representadas, é necessário que suas pautas, lutas e seus corpos sejam valorizados pelas instituições político partidárias. É preciso que essas pessoas e que o programa que elas representam sejam priorizados. O entendimento que a desigualdade racial é o principal problema a ser resolvido no Brasil é o que faz possível refazer o Brasil.
Com e pelos brasileiros.
Winnie Bueno Winnie Bueno é iyalorixá, pesquisadora e escritora daquelas que gostam muito de colocar em primeira pessoa sua visão do mundo e da sociedade. É criadora da Winnieteca, um projeto de distribuição de livros para pessoas negras
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