A vida itinerante de Autumn Sonnichsen
Os objetos que a fotógrafa americana carrega com ela contam sobre suas origens e seus pousos pelo mundo
A fotógrafa americana Autumn Sonnichsen, 37, não possui muitas coisas. Em parte, pela vida itinerante que ela leva há pelo menos 15 anos, desde que saiu de Los Angeles, nos EUA, e passou a revezar o tempo entre São Paulo, cidade onde atualmente corpo e coração moram, segundo ela, e lugares como Berlim, Nova York, Paris, Nice, comumente perseguindo o verão.
Por aqui, ficou a princípio conhecida pelos ensaios de mulheres para revistas como Playboy e Trip, mas seu universo foi muito além. “Meu trabalho normalmente vai acompanhando meu momento, minhas fases. Comecei a ir mais fundo na vida das mulheres, retratando não só o lado sensual, mas a mulher como protagonista da própria vida, e a maternidade também”, diz ela, mãe de uma bebê de 8 meses.
Entre trabalhos autorais e fotos e vídeos para publicidade, principalmente no Brasil e na Europa, Autumn clicou muita comida, outra paixão, além de gente com e sem roupa, entre bailarinas, atletas, crianças, corpos yogis – ela é praticante de ashtanga yoga – freiras correndo nas areias de Copacabana, pessoas trans cadastrando seus nomes sociais, uma chef de cozinha nua na floresta. A floresta é um ambiente querido para ela, cuja filha, aliás, se chama Forest.
Para a fotógrafa, os objetos que contam sua história são aqueles poucos que carrega com ela. “Acho que escolhi muitas coisas relacionadas à minha família e à minha terra porque estou longe e não tenho muita coisa de lá, então, o que eu tenho, eu prezo.” Mas eles também remetem a seus pousos pelo mundo, suas escolhas, seus prazeres e sua tendência à simplicidade.
1 | Surrada e insubstituível
“Essa foi minha primeira bolsa de câmera, comprei em Nova York quando eu era adolescente. É de uma marca dos anos 1980 que fazia essas malas de lona, meio de fotojornalista de antigamente. É muito prática, perfeita para quando eu saio só com a câmera – se não a levo em alguma viagem, sempre me arrependo. Eu até comprei outra igual, porque essa está meio acabada, mas não consigo trocar, essa já tem o formato do meu corpo. Recentemente também descobri que ela cabe direitinho debaixo do carrinho de bebê.”
2 | Para lembrar de onde eu vim
“Eu sempre fui muito apegada ao meu passaporte, aos vistos, os carimbos, essa coisa toda. Tem umas penas coladas atrás dele que eu gosto muito – uma de Bali, uma de Utah e outra do Brasil. E eu gosto de lembrar que sou americana. Não que eu me esqueça, mas faz muito tempo que eu não moro lá e já não me sinto tão em casa quanto me sinto aqui ou na Europa. Acho que os valores de vida de lá de modo geral são diferentes dos meus, mas é minha base, e essa ligação sempre vem com uma certa esperança. Fora que é prático ter um passaporte americano para viajar, eu sou muito grata.”
3 | Ninguém merece faca sem fio
“Eu cozinho muito, inclusive estou começando a fazer comida para a minha filha, o que me dá um prazer enorme. Cada uma dessas facas tem uma história – o facão, por exemplo, é das Ilhas Maurício, eu comprei do jardineiro de um hotel em que eu estava ficando. Tem uma faca japonesa que eu comprei em Tóquio, e uma mais rústica, de desossar, que eu achei numa feirinha de pulgas na Argentina. Já a maior, de chef, era da minha mãe. É muito importante ter algumas facas boas comigo. Sempre que eu despacho a mala para algum lugar eu levo porque ninguém merece faca sem fio. E eu gosto de tê-las na parede também, me dá certo prazer saber que elas estão ali prontas pra mim.”
4 | Sal da terra
“Minha mãe me deu esse saleiro, ela vive garimpando essas coisas de cozinha. E o sal eu que colhi, em uma viagem que eu tento fazer todo ano para para a Sicília, na Itália. Eu fico em Ústica, uma ilha minúscula que é um paraíso pra mim, parece parada nos anos 1940. Ali, eu pego sal nas falésias e trago em uma caixinha na mala. E quando coloco esse sal na minha comida lembro dessa ilha e isso me dá um prazer muito grande. Lá é meu lugar de férias de leitura, eu levo uma pilha de livro e fico duas semanas lendo. E colhendo sal.”
5 | Mapa pedagógico
“Comprei esse mapa na rua em Paris há uns anos. Ficava no meu apartamento em Berlim, que já não tenho mais, e agora está aqui em São Paulo. É um mapa escolar bem antigo que mostra as rotas de exportação e importação de produtos, de ouro, peixe, madeira, banana. Eu gosto porque sempre que olho pra ele aprendo uma coisa nova, vejo algo que eu não tinha visto antes.”
6 | Dura na queda
“Quando você viaja muito precisa ter algumas coisas de boa qualidade, principalmente uma mala. E essa mala prateada era meu sonho de consumo, foi uma coisa que eu tive muito prazer de comprar. Ela tem muita história já, está bem acabada. Ela é bem resistente, já trouxe muita muamba de lá pra cá, já foi até bercinho para minha filha. E essa tag de couro meu irmão mandou fazer pra mim.”
7 | Mensagem profética
“Eu comprei esse quadro pra minha filha, antes de ela nascer. É do Felipe Morozini, artista muito querido. E é uma frase que também está no Minhocão, acho que muita gente em São Paulo tem uma relação afetiva com ela – ele me contou de um casal que se deu uma anel de casamento com essa frase gravada. O quadro é originalmente preto e branco, mas eu amei essa versão dourada, eu gosto de tudo que brilha. Aí eu comprei para ficar pendurado em cima da caminha dela.”
8 | Lembranças do Velho Oeste
“Meu avô era do Texas e foi um grande escritor de histórias de caubói. Esses são os livros mais conhecidos dele entre as pessoas que curtem esse tipo de leitura. Eles são muito engraçados, fáceis de ler, ele era realmente um bom escritor. Ele fala de pessoas que existiram, era historiador dessas figuras que estavam desbravando o mundo quando essa região era uma terra sem lei; muitas vezes eram homens terríveis. Mas eu gosto desses livros, me lembram a minha família e meu pai. Acho que, se eu tivesse que escolher dois livros na estante para guardar pra vida seriam esses.”
9 | Oh, boy…
“Eu adoro essa expressão, cabe em muitas situações. Quando você não sabe o que dizer, pode só soltar um ‘oh, boy’ e pronto. Uma grande amiga que é diretora de criação em L.A. me deu essa pulseira. Nós duas temos uma relação muito afetiva com o dourado, o brilho de modo geral. E também com essa expressão. Eu não uso quase nenhum acessório, só ela.”
10 | Feito à mão
“A mãe do meu namorado fez esse livro de atividades todo à mão nos anos 1980. Meus sogros moram em uma ilha perto de Seattle e construíram sozinhos a casa deles. Eu acho incrível que ela, com um bebê pequeno, morando nesse lugar isolado, tenha tido tempo de costurar esse livrinho. Ele sobreviveu 40 anos e agora é da minha filha, e ela adora. Tem outras páginas, mas eu gosto muito desse esquiador, porque eles são uma família que esquia muito.”