Marcello Dantas
Neofobias: Qual o nome do seu novo medo?
Uma lista de fobias raras que parecem ter surgido em tempos contemporâneos, um aspecto importante para a compreensão da nossa era e da nossa saúde mental
O medo é uma herança genética que sua mãe te deu pra você passar pro seu filho. A maior parte dos medos que possuímos, vem enraizados em nosso DNA de experiências ancestrais da humanidade. São os lobos dos lobos dos lobos do homem. Camadas e camadas de histórias e memórias que serão herdadas pelos nossos descendentes de forma subconsciente.
O psiquiatra húngaro Gabor Maté aponta que o trauma não é algo que acontece com uma pessoa, mas sim sua dificuldade em falar sobre o ocorrido. Novos tempos, novos medos. Num mundo de redes sociais no qual as pessoas só conseguem vocalizar seus méritos ou ideários, as oportunidades de falarmos abertamente sobre nossos medos desaparecem dia a dia. Coisas que antes seriam pequenas e raras ganham dimensões traumáticas.
Num mundo de redes sociais no qual as pessoas só conseguem vocalizar seus méritos ou ideários, as oportunidades de falarmos sobre nossos medos desaparecem dia a dia
Síndrome de pânico, estresse pós-traumático, transtorno obsessivo-compulsivo afetam pelo menos 8% da população mundial. Neste quadro, eis que surgem diagnósticos para novas fobias que pareciam não existir anteriormente.
Um estudo publicado pelo Dr. Louis Laves-Webb enumera algumas dessas neofobias. Ninguém deve fazer graça com o medo dos outros, mas algumas dessas fobias são curiosas e podem, na realidade, revelar uma causa enraizada que não seja óbvia.
Compilei em uma lista fobias raras e incomuns que parecem ter surgido em tempos contemporâneos, frutos de novas interações, mas são um aspecto importante para a compreensão da nossa era e da nossa saúde mental:
Ablutofobia – Medo de tomar banho
Essa fobia, às vezes, pode ser o resultado de um incidente traumático relacionado à água, especialmente envolvendo banho durante a infância. Ela pode originar muita ansiedade social e atrito, pois pode produzir odores corporais desagradáveis.
Bacteriofobia – medo de bactérias
Trata-se de um medo compulsivo de se expor a qualquer tipo de bactéria, também conhecido por bacilofobia. Os bacilofóbicos têm problemas com a limpeza contínua das mãos, do seu corpo e dos objetos que estão em sua volta, incapacitando a pessoa ao trato social normal.
Aritmofobia – Medo de matemática
Embora muitos de nós não gostassem das aulas de matemática, a aritmofobia leva essa ansiedade para um próximo nível. Essa fobia não é tanto um medo de ver números ou símbolos, mas um medo de ser forçado a uma situação em que se tenha que fazer raciocínio matemático.
Quirofobia – Medo de mãos
Essa fobia pode ser o medo das próprias mãos ou das mãos de outra pessoa. Muitas vezes, é o resultado de um evento traumático como uma lesão grave na mão causada por uso excessivo de celulares, teclados ou mouses. A própria imagem da mão produz um efeito psicossomático, gerando dor.
Papirofobia – Medo de papel
Essa fobia costuma estar relacionada ao toque, ao som e ao cheiro de papel. Quem sofre dessa fobia pode ficar ansioso ao som de um amassar de jornal ou ao cheiro de tinta e do rasgar do papel. E podem surgir espirros compulsivos, respiração intermitente e palpitação na presença de alguém escrevendo sobre papéis.
A eisoptrofobia, ou catoptrofobia, impede os pacientes de se olhar no espelho. Obviamente também causada pela prática de selfies infinitas
Eisoptrofobia – Medo de espelhos
Narciso acha feio tudo o que não é espelho. A sociedade moderna é altamente obcecada com a autoimagem. A eisoptrofobia, ou catoptrofobia, impede os pacientes de se olhar no espelho. Em casos mais graves, essa ansiedade também pode se estender a superfícies reflexivas como vidro ou água parada. Obviamente também causada pela prática de selfies infinitas. Uma gênese dessa fobia gira em torno das superstições amarradas a espelhos. O medo de ver algo sobrenatural ou quebrar um espelho e ser amaldiçoado com a má sorte pode fazer com que alguém desenvolva eisoptrofobia. Em outros casos, essa fobia pode resultar de baixa autoestima e aversão a ver a si mesmo.
Onfalofobia – Medo de umbigos
Quem sofre de onfalofobia geralmente evita áreas como a praia, onde umbigos expostos são comuns. Em casos mais graves, eles podem até cobrir seu próprio umbigo com fita adesiva ou um curativo. Essa fobia pode estar relacionada à tripofobia, medo de orifícios.
Optofobia – Medo de abrir os olhos
Essa fobia geralmente é o resultado de um evento traumático, especialmente durante a infância. Essa fobia pode ser extremamente incapacitante, pois os pacientes frequentemente evitam sair de casa e procuram áreas escuras ou mal iluminadas. Essa pode ser originada por pessoas expostas continuamente a neons, telas e painéis de leds.
Nomofobia – Medo de não ter seu celular
Esta é uma ansiedade que muitos de nós sentimos em graus variados, no entanto, torna-se uma fobia quando a ansiedade se transforma em pânico ou medo consistente, especialmente quando perseveramos na mera ideia de estar sem um aparelho celular. Essa fobia também se estende a ter um telefone com bateria descarregada ou fora de serviço, tornando o aparelho inutilizável. A nomofobia costuma ser associada ao vício em estar
constantemente conectados.
Plutofobia – Medo de riqueza
Essa fobia lida menos com o medo da moeda física e mais com a ansiedade em torno da riqueza ou de ser rico. Os sofredores temem a responsabilidade e o peso que acompanham a riqueza. Eles temem que sejam alvos de suas riquezas e, posteriormente, colocados em perigo. Eles podem sabotar sua carreira ou oportunidades de ganhar dinheiro.
Coulrofobia – Medo de palhaços
Essa fobia geralmente se origina de um evento traumático, especialmente em uma idade jovem, em festas infantis com palhaços. Quem sofre dessa fobia pode ter níveis variados de ansiedade irracional, com alguns indivíduos evitando balões, maquiagens e roupas vermelhas, ou assistir a filmes com personagens palhaços. O artista Bruce Nauman anteviu essa fobia com a obra “Clown Torture”, nos anos 1980.
Ao mesmo tempo, medos ancestrais e a dimensão épica da evolução de um vírus para uma pandemia rondam o nosso imaginário atualmente. Ainda surge espaço para outras manifestações da mente em campos exóticos ou ainda inéditos. Os novos medos fascinam porque revelam suas problemáticas internas e trazem à tona muito sobre o nosso inconsciente coletivo. Falam de coisas que povoam nossas mentes e, por não serem ditas, abrem rachaduras nas armaduras que usamos. Encarar nossos novos medos é a maneira mais saudável que temos para enfrentar a vida. Dar nome a eles é trazê-los do território do inominável para a superfície da razão. Despertar o medo do medo do medo do homem*.
*Onde está escrito homem, leia-se hominídeos.
Marcello Dantas trabalha na fronteira entre a arte e a tecnologia em exposições, museus e projetos que enfatizam a experiência. É curador interdisciplinar premiado, com atividade no Brasil e no exterior
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões da Gama.