Histórias de Carnaval — Gama Revista
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Depoimento

Qual foi o seu melhor Carnaval?

Uma festa que pode ser transformadora e ficar para sempre na memória. Conheça histórias de quem se jogou no fervo de corpo e de alma

11 de Fevereiro de 2024

Qual foi o seu melhor Carnaval?

11 de Fevereiro de 2024

Uma festa que pode ser transformadora e ficar para sempre na memória. Conheça histórias de quem se jogou no fervo de corpo e de alma

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    Raoni Maddalena

    “Segurei a festa inteira no personagem de turista da Jordânia, dançando um frevo louco”

    Alberto Lins, designer

    “Sempre vou a Olinda e Recife com meus amigos. E, para mim, a coisa mais emocionante do Carnaval é a interação com todo mundo: você tira onda das pessoas e elas te devolvem. Uma vez, fiz uma fantasia simples de ovo frito, que consistia em uma tiara com um ovo frito e dois outros no peito. Todo mundo brincou: ‘E esse ovo aí, hein?’, ‘Ó, já tá frito aqui’. Isso é o mais maravilhoso do Carnaval. Uma amiga, vestida de Madonna, conseguiu fazer uma performance no meio da rua em que dezenas de pessoas seguraram no gogó um ‘Like a Prayer’ inteiro. Coitada, estava desesperada para ir ao banheiro, ninguém queria acompanhá-la a um e, quando viu, estava sendo carregada por populares, seus fãs, que cantavam a música. E eu também já fiz, sem querer, uma performance. Saí com outra amiga vestido com uma espécie de véu em que só se viam meus olhos, e um camisão preto, que parecia um vestido, mas que deixava as pernas de fora. Estava em uma festa meio morna, com som mecânico, quando ouvi uma banda de frevo fervidíssima vindo de um lado. Resolvi ir lá com a minha amiga; era uma festa da Polícia Militar de Recife. Acompanhamos um pouco a turma, até sermos notados por um apresentador da festa, que animava as pessoas de um palquinho. Ele nos convidou a subir ao palco e, não sei por que, quando me perguntou meu nome eu disse ‘I don’t speak portuguese, my name is Fatima, I am from Jordania’. Segurei a festa inteira no personagem, dançando um frevo louco. As pessoas nem desconfiaram, apesar dos meus passos. Acho que devem ter pensado que o frevo é contagiante.” (em depoimento a Isabelle Moreira Lima)

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    Arquivo pessoal

    “Voltei deste Carnaval de uma outra forma, energizada, com camadas diferentes”

    Clara Canepa, editora de imagem

    “Viver o Carnaval logo depois que me separei foi como uma libertação. Foi estar naquele momento em que você cuida de si e quer olhar pra você, fazer as coisas e estar com as pessoas que deseja, fortalecer amizades, estar em ambientes alto astral, fazer coisas divertidas. Eu fui para o Rio muito nesse intuito, sem expectativas de pegar geral, mas de viver situações que eu não vivia há muito tempo depois da maternidade e de todos os anos de casada. Foi um momento meu depois de muito tempo. Ter ido para outra cidade era quase como se eu fosse outra pessoa porque não conhecia ninguém além das minhas amigas. Não sou alguém que mostra muito o corpo e lá eu estava de biquíni e meia arrastão, maquiada, bêbada, rindo e me divertindo. Foi muito bom. Quando voltei me deu uma energizada, estava de uma outra forma. Quase uma outra pessoa com camadas diferentes. A partir dessa viagem, deste Carnaval, eu entrei em uma outra fase de vida.” (em depoimento a Luara Calvi Anic)

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    Arquivo pessoal

    “Nunca imaginamos que dali sairia um bloco com tanta gente que seguisse, acompanhasse, gostasse e se identificasse”

    Marcelo Rubens Paiva, escritor

    “Ah, já fui em tanto Carnaval que é difícil fazer uma escolha. Mas acho que [meu Carnaval mais icônico] foi o primeiro ano do Baixo Augusta, em 2010, que foi totalmente clandestino. A gente se encontrou no Sonique, que era uma casa noturna do Alê Natacci, nosso presidente. Descemos a rua Bela Cintra, não tinha nem trio elétrico, era só com uma bandinha mesmo. Aí fomos pela rua Costa, uma ladeirinha de uma quadra, depois entramos na Augusta na marra e descemos até a Praça Roosevelt. Esse Carnaval para mim foi histórico. No primeiro ano, já fui como porta-estandarte. Estava chovendo muito, foi um barato. Depois virou o Baixo Augusta, esse bloco gigante que agora chamam de megabloco, o que nos obrigou a ir para a Consolação, porque não cabia na Augusta. Foi até meio sem querer, porque nunca imaginamos que dali sairia um bloco com tanta gente que seguisse, acompanhasse, gostasse e se identificasse, o que acaba sendo o mais importante. E aí teve um after no Studio SP, minha casa de som favorita, que era do Alê Youssef.” (em depoimento a Leonardo Neiva)

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    Luara Calvi Anic

    “Eu, novinho, saindo do armário e vivendo aquela explosão de música, de gente, de pegação”

    Daniel Batista, publicitário

    “Sempre fui mais das festas que acontecem durante essa época do que do Carnaval de rua. E nessa festa Selvagem, no Rio, o inesperado pra mim foi não ver o tempo passar. Eu, novinho, descobrindo minha sexualidade e toda aquela explosão de hormônios e de um mundo se abrindo. Eu era uma gay que tinha recém-saído do armário depois de anos em uma família evangélica, vivendo aquela explosão de música, de gente, de pegação, todo mundo se beijando. Lembro de eu dançando e olhando durante horas para o DJ ou para uma decoração de Carnaval sem saber exatamente o que estava acontecendo. Acho que naquele ambiente eu meio que saí um pouco da realidade, mas acho que foi um momento de sentir o sabor de tudo aquilo.” (em depoimento a Luara Calvi Anic)

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    Arquivo pessoal

    “Foi o meu melhor aniversário porque fiquei feliz da vida de comemorar no Carnaval, na rua”

    Marina Person, apresentadora e cineasta

    “O Carnaval de 2020, para mim, foi muito marcante, por algumas razões. Primeiro porque era pré-pandemia. A gente sabia que tinha alguma coisa estranha acontecendo, mas não acreditávamos que, de fato, tudo iria fechar do jeito que fechou. Então, olhando em retrospecto, aquele Carnaval ficou marcado como o último momento de ir para a rua, de socializar, de encontrar as pessoas e tudo mais. E também pelo fato de que, em 2020, o meu aniversário [15 de fevereiro] caiu logo no pré-Carnaval, num sábado de pré-Carnaval, que é uma delícia também, porque é um pouco menos cheio, tem um pouco menos de loucura. Eu estava no Rio de Janeiro e os meus amigos fizeram um bloco chamado Personas de Marina, que foi muito engraçado. Cada um foi fantasiado de uma época da minha vida. Tinha a Marina da MTV, a Marina do [programa] ‘Meninas Veneno’, tinha fantasia de ‘Califórnia’ [filme de 2015 dirigido pela cineasta], um amigo fez uma fantasia igual à que eu tinha usado no ano anterior. Enfim, foi muito especial, muito. Acho que foi o meu melhor aniversário porque eu me diverti e fiquei feliz da vida de comemorar no Carnaval, na rua. Acordamos umas 5h30 e, às 6h, a gente já estava lá em Santa Teresa, esperando o bloco sair. As pessoas foram chegando, o grupo foi se juntando, tinha até um estandarte. Fiquei muito feliz, foi tudo uma surpresa. As coisas foram acontecendo, sabe? E foi super especial. Eu lembro desse aniversário com muito carinho, até porque teve um simbolismo importante, já que eu nasci num sábado de Carnaval, e aí, comemorar o meu aniversário num sábado de pré-Carnaval, também foi um pouco de renascimento. Foi louco e foi lindo.” (em depoimento a Ana Elisa Faria)

  • “2022 foi o Carnaval de lembrar de viver na rua de novo e ao lado de quem eu amo”

    Isadora Borian, produtora cultural

    “Eu poderia dizer que todos os meus carnavais são meus favoritos. Eu amo muito. Tenho uma tradição muito forte, separo todas as roupas para os quatro dias, as maquiagens, o que vou comer e beber, tudo pronto para não me preocupar com nada no feriado. Eu fazia tudo isso sozinha. Tenho todas essas tradições e, durante a pandemia, eu não pude cumpri-las. Mas nesse período também minha vida mudou porque comecei a namorar. E tudo que eu fazia muito sozinha começou a ter alguém do lado. Em 2022, foi o primeiro carnaval pós-pandêmico, um alvoroço ao finalmente voltar a cumprir as tradições, ter o calor humano na rua e, agora, acompanhada. Senti que as coisas podiam ser a dois e descobrir esse mundo com a Aline. Ela não era uma pessoa carnavalesca de tradição. Então eu fui a responsável por introduzi-la nesse mundo e ensinar o que eu fazia, porque eu quero passar essas tradições para frente, igual a minha mãe e minha avó fizeram e era importante para elas. 2022 foi o Carnaval de lembrar de viver na rua de novo e ao lado de quem eu amo.” (em depoimento a Emilly Gondim)

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    Arquivo pessoal

    “Foi muito maravilhoso voltar para a rua com aquela multidão enorme. Passei dias com aquela brisa da abertura do Carnaval”

    Fabiana Moraes, jornalista, pesquisadora e colunista da Gama

    “Um Carnaval inesquecível foi o do ano passado, o primeiro pós-pandemia de fato, realizado na data certa. Fui ao Escuta Levino, um bloco que sai às quintas-feiras, antes do início oficial do Carnaval, e os guerreiros do passo (um grupo de frevo que preserva a forma de dançar frevo de rua e várias outras questões do carnaval recifense) se apresentam no meio de muita gente e foi maravilhoso. Saíram da Rua da Imperatriz e arrastaram muita gente até o outro lado da cidade, no Marco Zero, pelas ruas do Centro. É muito simbólico porque os centros do Brasil — e Recife passa por isso obviamente — foram sendo abandonados ao longo do tempo. É muito bonito ver o centro ocupado daquele jeito, com um monte de gente que está feliz, dançando e celebrando. Também no ano passado, na abertura do festival oficial, no palco do Marco Zero, que é o principal do Carnaval recifense institucionalizado, montado pela prefeitura, teve um show de Caetano que foi muito bonito. Especialmente para mim me marca porque ele cantou ‘You Don’t Know Me’, uma música do álbum ‘Transa’. Foi muito maravilhoso voltar para a rua com aquela multidão enorme, e ouvir aquela música à noite, aquela delicadeza da música, da voz. Foi muito especial, muito bonito. Passei dias com aquela brisa da abertura do Carnaval. Outros que eu poderia marcar esse x de icônico: há dez anos, a primeira vez que vi a noite dos tambores silenciosos, que acontece às segundas-feiras; e todos os anos eu vou para cidades da Mata Norte, ver os maracatus rurais. Isso, sem dúvida nenhuma, eu boto no top das coisas mais bonitas do Carnaval pernambucano. Os maracatus rurais e os caboclinhos também. Quem nunca veio precisa ver esses encontros, eles são deslumbrantes, das coisas mais bonitas que existem neste país.”

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    “E se tivéssemos nosso próprio bloco? Em 2015, nasceu o Bloco do Pedal”

    Filó Silva, fundadora do Bloco do Pedal

    “Quando criança passava o Carnaval no bairro da Saúde, na Zona Sul de São Paulo. Era um tempo em que a criançada brincava fantasiada na rua e a água da mangueira é que refrescava a gente. Tenho um primo mais velho que fez parte da fundação da escola de samba Barroca Zona Sul. Cresci ouvindo o samba-enredo, vendo as passistas que são tão lindas e a bateria com aquela batucada vibrante. O Carnaval está no meu sangue. Viajei com minhas amigas para Olinda, Salvador e Rio de Janeiro, fomos em incontáveis blocos e um pensamento sempre pairava em nossas mentes: e se tivéssemos nosso próprio bloco? Em 2015, poucos anos das primeiras ciclofaixas, eu já era cicloativista e pensei: por que não um bloco de bicicletas? Assim nasceu o melhor Carnaval da minha vida, com o meu Bloco do Pedal. Comecei com a organização da ideia, uma amiga desenvolveu a marca, outra desenvolveu o estandarte e um amigo engenheiro elétrico desenvolveu a tecnologia para as bicicletas gerarem a energia limpa que sustenta toda a música e vaporização de água para refrescar. Em 2024, faremos o pós-carnaval da cidade de São Paulo no dia 17, teremos mais bicicletas que nos anos anteriores, vaporizador para refrescar nossos foliões, DJ tocando marchinhas e outras músicas e 40 ritmistas da escola de samba primeira da Aclimação. Me sinto num estado vivo de plena satisfação vendo a alegria das pessoas.” (depoimento a Emilly Gondim)

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    “Foi o primeiro bloco que eu vi nascer”

    Pedro Henrique França, diretor, roteirista, ator e jornalista

    “Um Carnaval marcante foi o de 2019, no Rio de Janeiro. Eu faço parte de um grupo de WhatsApp com algumas pessoas que curtem o Carnaval, enfim, e a gente tinha combinado de se encontrar num bloco na Praça da Harmonia — era um bloco em que todo mundo saía de vermelho com dourado. Na segunda-feira de Carnaval, chegando na Praça da Harmonia, a coisa não estava acontecendo. A praça ainda não tinha todo o fervo de hoje, tampouco existia [como point] o Bar Delas, que eu vou falar dele já, já. O fato é que a gente estava ali esperando o bloco que não vinha, até que, timidamente, começou um vaivém no coreto, embora ninguém sabia se o bloco ia sair ou não. Começou a chover, entramos no Bar Delas, que até então não era esse point noturno que virou depois da pandemia, e botamos um som, uma coisa meio DJ mesmo. Só que alguns músicos que estavam perdidos e que se desencontraram desse bloco, foram parar lá também. E aí começou um bloco praticamente dentro do Bar Delas. A coisa foi tomando uma proporção, uma proporção, a gente saiu para a rua e aquele, então, virou o primeiro ano do Loló de Ouro, que é o bloco que a gente tem hoje, que deve sair no Carnaval deste ano, mas que segue sendo um bloco de amigos, sem um compromisso assim… O único compromisso que a gente tem, na verdade, é o de se divertir. Essa história é maravilhosa porque foi uma catarse coletiva. Foi o primeiro bloco que eu vi nascer, de fato. Nunca tinha visto um bloco nascer antes, todos os blocos que eu tinha ido até então já existiam. Foi um dia que marcou a história ali, tanto da Praça da Harmonia, como do Bar Delas, como do surgimento desse bloco.” (em depoimento a Ana Elisa Faria)