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Reportagem

Pontos para ficar de olho nas Olimpíadas de Paris

Mais atletas mulheres na delegação brasileira, duelo entre Rebeca Andrade e Simone Biles e o breaking estão na seleção Gama de destaques do evento esportivo

Ana Elisa Faria 28 de Julho de 2024

Pontos para ficar de olho nas Olimpíadas de Paris

Ana Elisa Faria 28 de Julho de 2024
Luiza Moraes/COB

Mais atletas mulheres na delegação brasileira, duelo entre Rebeca Andrade e Simone Biles e o breaking estão na seleção Gama de destaques do evento esportivo

Depois da Olimpíada pandêmica de Tóquio, atrasada em um ano por causa da covid-19 e sem o calor da torcida, os Jogos Olímpicos de Paris chegaram prometendo uma edição como conhecemos, com o público apoiando atletas em campos, ginásios, quadras e pistas, milhares de turistas pelas ruas e aquele clima competitivo no ar.

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Mas há novidades, como a cerimônia de abertura à beira e no rio Sena, e uma nova modalidade olímpica, o breaking, dança urbana que entra no torneio para rejuvenescer a audiência. Também há o que não muda, os duelos entre esportistas e equipes e a tradicional contagem de medalhas.

Para entrar nessa onda esportiva, Gama selecionou pontos para ficar de olho nas Olimpíadas de Paris, que acontece na capital francesa até 11 de agosto.

O Brasil é mulher nas Olimpíadas

Os Jogos Olímpicos de Paris mal começaram e o Brasil já ganhou uma das medalhas mais importantes da competição: a da paridade de gênero. Pela primeira vez na história olímpica, a delegação brasileira contará com mais mulheres do que homens. Elas são 153 competidoras — ou 55% do time verde e amarelo.

Para chegar até aqui, são décadas de batalhas por equidade. Em 2021, de acordo com diretrizes impostas pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), o nosso órgão nacional, o Comitê Olímpico do Brasil (COB), criou a área Mulher no Esporte, que oferece programas focados na potencialização dos resultados femininos por meio da inclusão e do reconhecimento delas no universo esportivo, ou seja, capacitando de atletas e treinadoras a gestoras. Afinal, uma equipe tem muita gente.

Também há mais mulheres acompanhando as Olimpíadas e mais jornalistas cobrindo o evento. É daí pra mais

Conquista relevante que chegou 104 anos depois da primeira participação do país numa Olimpíada, com gerações enxergando a mulher como fraca e incapaz, há ainda o que celebrar fora das quadras, pistas, piscinas e dos campos.

“Hoje eu fico muito feliz não só por ver atletas mulheres em maioria, mas porque a nossa luta está reverberando além do esporte: também há mais mulheres acompanhando as Olimpíadas e mais jornalistas cobrindo o evento. É daí pra mais”, diz, da capital francesa, a criadora de conteúdo feminista e esportivo Jojoca.

Mas, apesar do êxito numérico em 2024, o jogo não está definitivamente ganho. Faltam igualdade de incentivo, de visibilidade, de cuidado e de condições entre esportistas e esportes praticados por pessoas de ambos os gêneros.

Para ilustrar, Jojoca cita o caso de Izabela Silva, do lançamento de disco, que recebeu apenas itens masculinos para competir na França por falta de numeração feminina maior do que o tamanho M — ela veste G.

Nas redes sociais, a atleta ficou indignada: “Estou bem chateada, porque pedi algumas peças masculinas, e me deram todas. Já as femininas, não me deram nada. Sabe como isso é triste? Pegar seu uniforme para a competição e fazerem uma dessas, falando que não tem numeração? Um top vai até o M. Eu acho que não dá nem para rir de nervoso, de tanta tristeza. Só porque eu sou um pouco maior, e daí? Pede um pouco maior”.

Outro exemplo dado por Jojoca para demonstrar a desigualdade vem do futebol, modalidade proibida no Brasil para mulheres por 40 anos, até 1979. Portanto, é pouquíssimo tempo para se estabelecer uma igualdade de investimento e reconhecimento entre homens e mulheres. “O nosso trabalho é constante, mas, infelizmente, ainda tem muita gente jogando contra, por puro ódio às mulheres. Isso atrasa o processo de igualdade”, comenta.

É do Brasiiiiiil! Quem deve subir ao pódio?

As esportistas brasileiras, que estão em maior número, têm boas chances de brilhar nos pódios Paris afora. A grande aposta do país é em Rebeca Andrade, da ginástica artística, seguida pela jovem skatista Rayssa Leal, a Fadinha. Desde as Olimpíadas de Tóquio, quando saíram laureadas e ovacionadas, ambas vêm em uma crescente nas respectivas carreiras.

A nadadora Ana Marcela Cunha, da maratona aquática, e a boxeadora Beatriz Ferreira também são citadas como possíveis candidatas a medalhas de ouro, assim como a dupla do vôlei de praia Ana Patrícia e Duda.

Jogos Olímpicos Tóquio 2020 - A atleta brasileira Beatriz Ferreira contra a irlandesa K. Harrington em Tóquio. Na foto a brasileira com a medalha de prata.
Jogos Olímpicos Tóquio 2020 – A atleta brasileira Beatriz Ferreira contra a irlandesa K. Harrington em Tóquio. Na foto a brasileira com a medalha de prata.
Jonne Roriz/COB

As velejadoras Martine Grael e Kahena Kunze, atuais bicampeãs olímpicas, a judoca Mayra Aguiar, Raicca Ventura, do skate park, a surfista Tatiana Weston-Webb e a canoísta Ana Sátila são outros nomes que surgem no bolão de palpites para a competição.

Entre os homens, as esperanças giram em torno de: Gabriel Medina, surfista que costuma performar bem nas águas taitianas — como não há boas ondas nos arredores de Paris, as baterias serão disputadas em Teahupo’o, no Taiti, destino clássico do surfe que pertencente à Polinésia Francesa —; Isaquias Queiroz, que tem quatro medalhas olímpicas; Alison dos Santos, o Piu, do atletismo; Marcus D’Almeida, do tiro com arco, que, em 2023, foi eleito o melhor arqueiro do mundo; e Augusto Akio, do skate.

Em Tóquio, o Brasil subiu ao pódio 21 vezes e, segundo estimativas da revista norte-americana Sports Illustrated para os jogos parisienses, a expectativa é que os atletas brasileiros tragam para casa 22 medalhas. Bora torcer?

Breaking olímpico

Modalidade estreante nas Olimpíadas de Paris, o breaking se junta ao surfe, ao skate e à escalada como um chamariz do COI para modernizar a competição e atrair um público mais jovem para os jogos.

Nascido na década de 1970 em Nova York, nos Estados Unidos, trata-se de uma dança urbana que faz parte da cultura hip-hop e conta com movimentos ligeiros, giros sobre a própria cabeça e deslocamentos pelo chão. Tudo executado com criatividade, flexibilidade, força e improviso, ao som surpresa das batidas de um DJ. Sim, os competidores não sabem o que vai sair das carrapetas dos disc-jóqueis.

O Brasil não conseguiu se classificar para Paris, mas tem uma porção de b-boys e b-girls — alcunhas dadas a dançarinos e dançarinas de break — dançando e treinando por aí desde 1983, quando o breaking chegou às periferias de São Paulo e, logo, se espalhou para outros estados.

Eu, como atleta, me vejo participando de um momento histórico

A mineira Nathana Venancio, 33, que integra a seleção brasileira e está no meio desde os 16 anos, é uma dessas b-girls. Para ela, o breaking como esporte olímpico só traz benefícios à categoria e à cultura. “Até pouco tempo o breaking era muito marginalizado e visto como uma dança para quem não tinha nada para fazer. Eu, como atleta, me vejo participando de um momento histórico.”

Venancio enfatiza que a chegada da modalidade às Olimpíadas traz ganhos para a carreira de vários dançarinos, dando visibilidade e abrindo possibilidades para que marcas possam patrocinar b-boys e b-girls. Dessa maneira, praticantes do breaking têm a chance de se dedicar integralmente à dança. “É importante para que as pessoas entendam que o breaking transforma vidas e pode ser uma profissão, assim como outros esportes”, afirma.

O b-boy Samuel Henrique, o Samuka, 27, que, com o grupo ILL-Abilities, vai participar da cerimônia que dará as boas-vindas olímpicas ao breaking, em 9 de agosto, concorda com a colega. Ele acredita que é fundamental colocar em evidência quem, por muitos anos, foi visto com “maus olhos”.

“Estar no âmbito olímpico abre portas. Grandes patrocinadores começam a enxergar os dançarinos de forma diferente. Assim, muita gente pode mudar de vida e viajar para competições e intercâmbios”, analisa.

Quando uma nova modalidade entra em cena nas Olimpíadas, termos antes restritos a uma comunidade específica passam a ser conhecidos e repetidos por todos os espectadores dos jogos. Foi assim em 2021 com o skate, e há grandes chances de ser assim com o breaking em 2024.

Ouviremos falar bastante, conforme explica a b-girl Nathana Venancio, de “power moves”, movimentos poderosos em que os dançarinos impulsionam o corpo em giros rápidos e contínuos, equilibrando-se nas mãos, nos cotovelos, na cabeça ou nas costas. Os “footworks” (trabalho de pé, em tradução livre), quando um dançarino coloca as mãos no chão para dar suporte ao corpo enquanto move os pés e as pernas de diversas maneiras, também devem aparecer.

Rebeca Andrade X Simone Biles: o duelo do ano

Após desistir das Olimpíadas de Tóquio no meio da competição e de fazer uma pausa de dois anos na carreira — brilhante — para cuidar de questões relacionadas à saúde mental, a norte-americana Simone Biles chega aos Jogos de Paris como “o” nome da ginástica artística. É a mais premiada da história do esporte. Com sete medalhas olímpicas — quatro de ouro, uma de prata e duas de bronze — e seis títulos mundiais, somando 30 medalhas, a ginasta é a favorita da edição para ganhar cinco ouros e, ainda, quebrar alguns recordes.

É contra esse fenômeno da natureza que duela a brasileira de Guarulhos Rebeca Andrade, que fez sua estreia numa Olimpíada em 2021, conquistando a prata no individual geral e o ouro no salto, ocupando assim o posto da primeira ginasta do país a subir ao pódio olímpico.

Jogos Olímpicos Paris 2024 - Ginástica Artística. Na foto, Rebeca Andrade.
Jogos Olímpicos Paris 2024 – Ginástica Artística. Na foto, Rebeca Andrade.
Gaspar Nóbrega/COB

Desde então, a atleta vem numa crescente. Em 2023, no Mundial de Ginástica Artística da Antuérpia, ela ganhou ouro no salto, prata no solo, por equipe e individual geral, e bronze na trave.

No evento, aliás, Biles e Andrade compartilharam a maioria dos pódios e, numa demonstração de carinho e respeito pela opositora, a ginasta dos EUA reverenciou a guarulhense com uma coroa imaginária ao ser batida pela esportista na final do salto.

O aparelho é a principal aposta da brasileira em Paris que, inclusive, submeteu na quinta-feira (25) um vídeo ao Comitê Técnico da Federação Internacional de Ginástica realizando um elemento inédito para o salto, o Yurchenko com tripla pirueta. Isso significa que há possibilidade da atleta apresentar o novo salto na competição — nos treinos, ele é mantido em sigilo absoluto, é a sua carta na manga.

Comentarista da modalidade na CazéTV, Andrea João, ex-ginasta, ex-treinadora da seleção, árbitra internacional e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, acredita que no esporte, no cenário que temos hoje, sobretudo no salto, o resultado vai depender de Biles, que já está no topo.

“A questão é: será que ela vai acertar, será que ela não vai acertar? Porque a Biles é a favorita disparada. Se errar, ela pode não medalhar e até perder o individual geral. Na sequência, brigando, vem a Rebeca e a Sunisa Lee [dos EUA]. No individual geral também tem muita menina boa”.

Mesmo com esse panorama, a especialista menciona o quesito surpresa e as decisões tomadas instantes antes de o atleta iniciar um aparelho, depois de analisar concorrentes, os treinos prévios e os treinos de pódio. “A Rebeca tem alguns upgrades para fazer, mas penso que nem ela sabe ainda o que vai fazer, essa estratégia é montada na hora, observando as outras ginastas e equipes.”