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RepertórioDez livros sobre pais e filhos
Prato cheio para escritores desde o início dos tempos, a relação familiar está no centro desta lista literária
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Dez livros sobre pais e filhos
Prato cheio para escritores desde o início dos tempos, a relação familiar está no centro desta lista literária
Uma relação complexa e complexamente rica desde que a primeira família botou os pés sobre a Terra, a dinâmica entre pais e filhos sempre foi uma das maiores fontes de inspiração para a literatura. De “Os Miseráveis”, do francês Victor Hugo, a “Os Irmãos Karamázov”, do russo Dostoiévski, são inúmeras as obras clássicas que se debruçam sobre as muitas facetas desse relacionamento.
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Na lista a seguir, Gama reúne alguns livros contemporâneos também centrados nessa dualidade familiar, seja em registro ficcional ou memorialístico, pelo ponto de vista de pais ou filhos, em relações conturbadas ou amenas.
Devido à vasta literatura sobre o tema, também ficaram de fora outras obras importantes. Para citar apenas dois exemplos notáveis: “K – relato de uma busca”, de Bernardo Kucinski (Companhia das Letras, 2016) e “A Morte do Pai”, de Karl Ove Knausgard (Companhia das Letras, 2009), que certamente valem a leitura. A seguir, veja a lista completa:
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“O que É Meu”, de José Henrique Bortoluci (Fósforo, 2022)
Ao longo dos 50 anos em que trabalhou como motorista de caminhão, José, pai do sociólogo e professor José Henrique Bortoluci, vivenciou parte importante da história do Brasil: dos delírios megalomaníacos da ditadura militar, como a construção da Rodovia Transamazônica, à violenta chegada de um suposto progresso no interior do país. Consciente da inconstância e, principalmente, da subjetividade da memória, Bortoluci parte das entrevistas que fez com o pai, diagnosticado com câncer em 2020, para traçar essa história recente tanto da própria família quanto do Brasil. Combinando depoimentos e anedotas com referências literárias e reflexões, “O que É Meu” enovela numa prosa elegante e afetuosa a trajetória das marcas no corpo do José pai, cicatrizes antigas e profundas como muitas estradas que cortam o Brasil, num projeto desenvolvimentista que perdura até hoje no imaginário nacional.
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“Trilogia do Adeus”, de João Anzanello Carrascoza (Alfaguara, 2017)
Construída como um tríptico que se aprofunda cada vez mais nas relações familiares de pais e filhos, a “Trilogia do Adeus” reúne algumas das obras mais relevantes e impactantes de Carrascoza. A série começa por “Caderno de um Ausente”, premiado com um Jabuti em 2015, em que um pai escreve uma longa carta para Beatriz, sua filha recém-nascida, para o caso de não estar presente no futuro dela. Depois, em “Menina Escrevendo com Pai” e “A Pele da Terra”, são os rebentos do protagonista que destrincham a relação não só com o patriarca como, no caso de Mateus, irmão de Beatriz, com seu próprio filho. Praticamente um especialista na ficcionalização do cotidiano, da passagem do tempo e das relações familiares, o escritor, professor e redator publicitário Carrascoza lança aqui um olhar difícil de esquecer sobre os vínculos entre pais e filhos. E também a respeito de como pequenas ações do dia a dia podem nos marcar para sempre.
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“O Filho Eterno”, de Cristovão Tezza (Record, 2007)
Já considerado um clássico da literatura brasileira contemporânea, o relato com vívidos toques autobiográficos narra as tentativas de um pai para lidar com o nascimento do filho com síndrome de Down, espelhando parte da vivência do próprio autor. O livro, vencedor de prêmios como Jabuti e Oceanos, foi inclusive adaptado para as telas de cinema em 2016. Expondo as pequenas vitórias e inúmeras dificuldades de criar um filho com síndrome de Down na década de 1980, quando se sabia muito menos sobre o assunto, “O Filho Eterno” acompanha a jornada dos personagens atravessando médicos e consultórios, a superação das negações iniciais da paternidade e o impacto da chegada do filho em vários aspectos da vida. Sem romantizar ou suavizar os obstáculos e as reações da figura paterna, a obra ressoa como uma narrativa verdadeira e naturalmente emocionante a respeito do que significa ser pai.
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4
“Notas Sobre o Luto”, de Chimamanda Ngozi Adichie (Companhia das Letras, 2021)
Em junho de 2020, ainda no primeiro ano da pandemia, o pai da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie se tornou uma das vítimas fatais da covid-19. Consciente do seu luto em meio ao de milhões de pessoas no mundo todo naquele momento, a autora de “Americanah” (Companhia das Letras, 2014) e “Meio Sol Amarelo” (idem, 2008) faz sim de “Notas Sobre o Luto” um retrato das dimensões familiares e culturais do sofrimento, mas também das lembranças de um homem forte e honrado, de quem a autora era extremamente próxima. “Uma coisa dessas, temida durante tanto tempo, finalmente chega, e na avalanche de emoções vem também um alívio amargo e insuportável. Esse alívio se torna uma forma de agressão, e traz consigo pensamentos estranhamente insistentes. Inimigos, atenção: o pior aconteceu. Meu pai se foi. Minha loucura agora vai se revelar”, escreve num dos momentos mais pungentes do livro.
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“Pai, Pai”, de João Silvério Trevisan (Alfaguara, 2017)
Nascido numa família de classe média baixa de uma cidadezinha do interior de São Paulo, o escritor, dramaturgo e cineasta João Silvério Trevisan testemunhou desde cedo a forma rude como o pai tratava a mãe, que vinha de uma origem mais humilde. Ele mesmo vítima da violência de um pai que não aceitava sua existência de “menino maricas”, João ingressou no seminário aos dez anos para escapar da atmosfera de casa. Mas fosse no ambiente doméstico, no autoexílio nos EUA durante a ditadura ou durante suas descobertas literárias e artísticas, o pai seguiu sempre fazendo sombra sobre sua existência. Mesclando passado e presente, análises pessoais e referências culturais, “Pai, Pai” é um livro que traça uma narrativa complexa sobre uma tumultuosa relação entre pai e filho, cortada em quase todos os momentos pelo preconceito e a intolerância.
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“Quem Matou Meu Pai”, de Édouard Louis (Todavia, 2023)
Em 2017, o escritor francês Édouard Louis publicou no New York Times o artigo “Por que meu pai vota em Le Pen”. No texto, às vésperas da eleição presidencial francesa, o autor apresentou a figura paterna como parte da classe operária do país, alguém que se desiludiu com a esquerda. Um ano depois, Louis expandiu o escopo do artigo, num texto que acabou se tornando o livro “Quem Matou Meu Pai”. Na obra, o cultuado escritor aborda a saúde em deterioração do pai, que se machucou num grave acidente de trabalho. Figura distante desde a infância do autor, marcada por uma frieza paterna autoritária, machista e homofóbica, o sujeito que Louis descreve no livro é surpreendentemente sensível, sonhador e profundamente infeliz — mas somente nas entrelinhas. É com esse indivíduo, que o autor praticamente desconhecia até então, que ele tenta fazer as pazes durante uma última visita. Leia um trecho do livro aqui.
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“Crônicas de Pai”, de Leo Aversa (Intrínseca, 2021)
Ser pai hoje é muito diferente do que era nos anos 1980 ou 1990? Na coletânea “Crônicas de Pai”, que reúne crônicas inéditas e também algumas das melhores que publicou em sua coluna no jornal O Globo, o fotógrafo e escritor Leo Aversa compartilha com o leitor sua experiência tanto na posição de filho quanto de pai ao longo das décadas — hoje já tendo estado em ambos os lados da relação. Não são apenas histórias comoventes ou com grandes lições de vida. Pelo contrário, elas também englobam as pequenas dores corriqueiras, as saudades que batem de repente e a relação cotidiana do escritor com o filho Martín, por vezes com um olhar irônico, sentimental, nostálgico ou até filosófico, na veia dos pensamentos que só o dia a dia sabe despertar. Leia um trecho do livro aqui.
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“A Cabeça do Pai”, de Denise Sant’Anna (Todavia, 2022)
Como lidar com as inevitáveis fragilidades físicas frente à força dos nossos sentimentos e conexões familiares? É por reflexões como essa que leva o tortuoso caminho de “A Cabeça do Pai”, romance de estreia da historiadora e professora Denise Sant’Anna na ficção. Nele, uma janela para a memória afetiva se escancara em frente à narradora no momento em que seu pai sofre um AVC hemorrágico. Idoso, ele vinha trabalhando à exaustão para cuidar da esposa com Alzheimer. A partir desse acontecimento trágico, o livro tece uma teia envolvendo relações familiares, a consciência cada vez mais próxima da morte e o desenvolvimento da relação que mantemos com nossos pais já na maturidade. Tudo isso contado no estilo levíssimo da autora, que usa nossa capacidade de transformar em histórias a memória daqueles que nos deixaram como a forma mais eficaz de lidar com a frágil condição humana.
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“A Estrada”, de Cormac McCarthy (Alfaguara, 2006)
O escritor estadunidense Cormac McCarthy (1933-2023) pode ter nos abandonado este ano, mas também deixou como legado obras marcantes como “Meridiano de Sangue” (Alfaguara, 2020) e “Onde os Velhos Não Têm Vez” (idem, 2006). Talvez nenhum outro de seus livros seja tão emocionalmente impactante, no entanto, quanto a dolorosa narrativa pós-apocalíptica de “A Estrada”. Na obra, a relação entre um pai e seu filho é reduzida à sua essência, retratada principalmente nos esforços cotidianos para sobreviver em um mundo hostil e decadente. Mais focado no laço que existe entre os dois protagonistas do que propriamente em criar um universo complexo e mirabolante ao seu redor, o livro é um conto que equilibra a dureza da subsistência e o que resta do amor entre pai e filho quando todo o resto some do horizonte. Vencedor do Pulitzer de ficção e adaptado para os cinemas de forma igualmente brilhante, o livro foi inspirado por uma viagem que o autor fez ao lado do filho.
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“O Pai da Menina Morta”, de Tiago Ferro (Todavia, 2018)
Nascido de uma tragédia que o autor vivenciou em 2016, “O Pai da Menina Morta” é uma narrativa fragmentada para explorar as muitas faces do luto na vida do protagonista. Mostrando como a morte de uma menina de oito anos se reflete na vida do pai, o primeiro romance do escritor e editor Tiago Ferro não se limita apenas a retratar a dor de uma perda quase impossível de dimensionar. Aqui, o autor também trata de questões de autoimagem, sexualidade, humor, confissão, memória e fabulação em um registro consciente e irônico, num mundo que se recria para o personagem a partir do pior dos traumas. Um dos fundadores da editora e-galáxia e da revista Peixe-elétrico, Ferro se revela já na estreia uma das vozes mais marcantes da literatura brasileira contemporânea.
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CAPA Como ser um bom pai?
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