Como explorar sua sexualidade?
Com opções que vão de sex toys a novos tipos de relações, para inovar no sexo também é essencial dialogar e superar tabus
Um casal junto há muitos anos que se encontra num restaurante, desta vez fingindo serem dois desconhecidos que saem pela primeira vez. O convite a um terceiro para se juntar ao sexo que até então vinha sendo de uma nota só, ou de uma dupla só, na cama. Um vibrador ou masturbador que chega para revolucionar a vivência sexual. Ou relações que se abrem a terceiros, quartos, quintos, sempre com suas regras e complexidades.
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São muitas as formas como imaginamos que alguém pode buscar inovação no sexo, até porque a lista de possibilidades é também enorme. Mas há um ponto em comum. Praticamente todas começam num mesmo lugar: a insatisfação. E sentir-se insatisfeito com a vida sexual está mais próximo de ser a regra do que a exceção. Um levantamento feito pelo Instituto Ipsos em 2022, por exemplo, mostrou que quatro em cada dez brasileiros estão descontentes com a forma como as coisas estão fluindo na cama.
Um dos motivos, de acordo com o psicólogo e sexólogo clínico Giovane Oliveira, é que raramente damos tanta importância ao sexo quanto a outros aspectos de nossas vidas, como o trabalho ou os estudos — embora ele tenha um impacto primordial para nossa saúde e bem-estar.
Sentir-se insatisfeito com a vida sexual está mais próximo de ser a regra do que a exceção
“Manter o desejo ativo às vezes é um desafio”, reconhece Oliveira. “Não deveria ser a coisa mais difícil do mundo, mas a gente acaba dando atenção para tudo, o trabalho, a faculdade, os amigos e a família, mas nem sempre para o sexo.” Quando fala no assunto, o sexólogo tem intenção de ir além de só fazer sexo com mais frequência. Segundo ele, quando se trata da vida sexual, é preciso que todos os membros de uma relação reflitam e dialoguem sobre seus desejos e vontades na cama.
Como tratamento de choque para iniciar um diálogo sobre o assunto, o psicólogo sugere aos casais que frequentam seu consultório construir uma linha do tempo da relação sexual. “Não é ficar remoendo que antes transavam mais. Proponho relembrar as transas boas, que marcaram”, explica. Um resultado interessante, segundo ele, é que as transas e momentos citados costumam ser diferentes para cada membro da relação. “Com esse exercício, a gente consegue entender como o desejo opera e o que excita cada um.”
A partir daí, se a opção é passar a frequentar um sex shop, comprar o Kama Sutra ou partir para uma casa de swing, fica a critério do casal, diz Oliveira. O importante, segundo o especialista, é criar uma janela para falar sobre sexo, da ausência dele aos desejos ainda não realizados. O sexólogo também incentiva diálogos mais naturais, leves e até engraçados, embora sempre levados a sério — o que, admite o psicólogo, é coisa rara de acontecer. “Eu até brinco que existem três grandes tabus, sobre os quais os casais não conversam: dinheiro, morte e sexo.”
Novos começos e diálogos
Sair da rotina é essencial para o sexo porque “o ser humano vive de começos”, na visão da sexóloga e colunista da Vogue Brasil, Luciane Angelo. “Por isso, até numa relação estável, é essencial alimentar novidades. Afinal, o ser humano é um eterno insatisfeito”, afirma Angelo, que é também terapeuta tântrica e instrutora de pompoarismo — exercícios de contração dos músculos do períneo e da vagina para aumentar o prazer sexual.
Foi essa mesma busca por inovar e deixar a rotina de lado na cama que marcou desde o início a relação entre a artista plástica Heloisa Etelvina, 43, e a designer de moda Izabela Starling, 36, mais conhecidas como Lola e Iza, que foram casadas por dez anos. “A primeira coisa que dei de presente para ela foi uma peninha e uma venda”, relembra Lola. “Fizemos várias experimentações com fetiches. Estávamos buscando explorar não só os genitais, porque o sexo envolve o corpo todo.”
Embora a relação tenha acabado, essa fome por novas experiências inspirou a dupla a criar em 2018, ao lado de um amigo, a sex shop virtual Pantynova, uma das marcas pioneiras e hoje mais conhecidas do mercado de bem-estar sexual no Brasil. Segundo Lola, entre os principais objetivos, estava fugir dos padrões heteronormativos que ditam a indústria. Entre os vibradores, dildos e lubrificantes com formatos, materiais e finalidades diversas, investiram em acessórios que não necessariamente reproduzem o formato do pênis ou a textura da pele humana e que tenham o conforto como norte.
Quanto mais a gente se relaciona, mais pode se abrir para alguns desejos que antes nem entendia direito
A questão do diálogo, ou da falta dele, também estava entre as prioridades. “Fizemos até um jogo baseado nisso. São várias cartas que você põe na mesa para iniciar uma conversa que ajuda os casais a melhorar essa troca dentro de casa”, revela Lola, que também afirma sempre ter tido um diálogo aberto e franco sobre o tema em suas parcerias.
O caminho que a sexóloga Luciane Angelo sugere como mais eficaz é conversar sobre o assunto desde o início do relacionamento, mesmo que a vida sexual esteja satisfatória. “Até porque a gente vai mudando ao longo do tempo, pode ter outras vontades, ler coisas diferentes, então por que não tentar? Quanto mais a gente se relaciona, mais pode se abrir para alguns desejos que antes nem entendia direito.”
E iniciar um relacionamento amoroso vai sempre significar uma primeira vez. Como a especialista aponta, o sexo raramente é sensacional no início de uma relação. Afinal, ninguém nasce com um manual de como transar com uma determinada pessoa. “Se eu faço de uma forma com alguém, não quer dizer que o outro tem que gostar. É importante alinhar isso, dizer e perguntar do que gosta. Não é uma fraqueza”, esclarece Angelo.
Sem estabelecer esse canal franco logo cedo, abrir o jogo sobre uma insatisfação pode se tornar um desafio cada vez maior ao longo do tempo. “Uma paciente casada havia cinco anos me contou que nunca tinha gozado com o marido”, conta a sexóloga. “É complicado porque eles nunca tiveram uma conversa antes. Como agora falar isso para ele?”
Para todos?
Uma pesquisa realizada online em 2022 pela Pantynova mostrou que a relação com nossa própria sexualidade pode estar mudando. Segundo o Censo do Sexo, 87% dos participantes se sentem confortáveis para falar sobre sexo e masturbação e 79% admitem estar dispostas a tentar novas experiências.
Dentro da comunidade de usuários e clientes da plataforma, Lola conta que é comum receber relatos de pessoas que acabam de passar por novas experiências sexuais — seja num relacionamento heterossexual ou LGBTQIA+ “As pessoas dão feedback, o que ajuda várias outras a se descobrirem e se entenderem”, afirma Lola.
Claro que estar em mais de um não é requisito para redescobrir e experimentar a sexualidade. “Não precisa ter um parceiro fixo na primeira vez que você vai a uma casa de swing ou BDSM, muito menos para comprar seu primeiro vibrador. Dá para viver sozinho essa experiência e entender se você tem esse fetiche ou se foi só uma curiosidade”, afirma a sexóloga Luciane Angelo. “Mas, quando se trata de sexualidade, é importante se informar muito bem antes de qualquer experiência”” acrescenta.
Da masturbação à popularização de vibradores e dildos, o prazer feminino também vem se tornando cada vez menos tabu para mulheres de diferentes faixas etárias, dentro ou fora de uma relação. Segundo especialistas, após séculos de repressão e limitações, o tema segue avançando, ganhando visibilidade e estimulando mulheres a explorar o sexo cada vez mais.
Para Angelo, porém, a visão masculina sobre o sexo segue muito heternormativa, focada na ereção e penetração. Tanto que a brochada, apesar de um fenômeno natural, segue sendo motivo de piada e preocupação constante entre os homens. “A primeira brochada é extremamente atordoante, ainda mais num país machista como o Brasil. Não à toa, o viagra é um dos medicamentos mais vendidos do mundo. É nessa hora que o homem precisa refletir e entender que sexo não é só penetração.”
Os homens que não sentiam prazer
Uma das mensagens que mais chamaram a atenção de Lola nos últimos tempos na Pantynova foi de uma mulher contando sobre a experiência de penetração anal de seu namorado. “Recebemos muitas DMs de homens perguntando como introduzir o tema com a parceira, porque querem experimentar um toy anal. A questão do prazer masculino vindo da próstata ainda é um tabu gigante”, conta.
A história de que o homem é livre sexualmente é uma ilusão, de acordo com o especialista em sexualidade e fundador do canal Prazerele, Claudio Serva. “99% dos caras que atendo só se masturbam tocando o próprio genital. Não tocam nem a barriga, as coxas, os mamilos, quiçá a região anal”, diz Serva.
Muitas vezes, por causa do machismo, o homem acha que não pode sentir nem expressar o seu prazer
Na opinião do especialista, além do tabu, os homens costumam ser confrontados de forma precoce com a pornografia, que acaba incentivando um sexo mais oprimido e focado exclusivamente nos genitais. “Muitas vezes, por causa do machismo, o homem acha que não pode sentir nem expressar o seu prazer, a ponto de não conseguir nem soltar um som durante o estímulo sexual.”
“Quando pergunto para um homem o que o excita, a resposta número um é: dar prazer à parceira ou parceiro”, conta o psicólogo Geovani Oliveira. Apesar de a reação alheia ser importante do sexo, para o especialista, a resposta aponta a incapacidade da maioria dos homens de explorar o prazer e o próprio corpo. Mais um exemplo, segundo ele, é o impasse do sexo a três numa relação heterossexual. “Quase sempre pode ser com outra mulher, mas raramente com outro homem.”
Desabrochar
Após viver uma juventude sexualmente reprimida, como um jovem homossexual no seio de uma família conservadora, o designer Marcelo Silva — como preferiu não se identificar, o nome é fictício — deixou aos 20 anos a cidade onde morava, no interior de Minas Gerais, para estudar em Belo Horizonte. “Eu desabrochei. Era uma semente e virei uma flor. Comecei a sentir as dores e delícias de ser quem você é, a sair e achar pessoas mais parecidas comigo”, relembra.
A mudança, segundo ele, foi radical. Se antes tinha um acesso muito restrito à própria sexualidade, vivida quase sempre de forma escondida, logo passou a explorar seus desejos abertamente. Mas muitos dos traumas familiares acabaram impactando essa experimentação, principalmente um complexo de inferioridade surgido na infância. “Fiquei achando que essa sexualidade tinha que estar muito atrelada à marginalidade, a fetiches com coisas como cheiros degradantes e os clássicos ‘banheirões’ de rodoviária”, conta. Só depois de fazer terapia Silva conseguiu entender de onde vinham essas necessidades e equilibrar sua vida sexual.
Se o homem quer buscar não apenas inovar no sexo, mas explorar a sexualidade de forma mais completa, na opinião de Serva, é preciso trabalhar em diferentes frentes: conversar com parceiros e amigos sobre o tema, desconstruir o machismo internalizado no dia a dia e acompanhar perfis e pessoas que falem mais abertamente da sexualidade masculina, para que ela se torne mais naturalizada. E, com o intuito de entender melhor as zonas erógenas do corpo, o ideal é experimentar sozinho, num lugar íntimo como o chuveiro, se permitindo pouco a pouco essa mesma abertura nos encontros sexuais, diz o especialista.
Também vale lembrar que a sexualidade e os interesses não permanecem os mesmos ao longo da vida. “Transar aos 35 anos não é igual a transar aos 20 ou 40. E não estou falando de quantidade, mas de como você encara e vivencia o sexo quando passa por esses marcadores de tempo”, declara Oliveira. Hoje, aos 33 anos, o que Silva tem procurado é vivenciar um sexo com mais afeto. “Meu maior fetiche tem sido esse, ter alguém com essa completude, que conheça todas as minhas esferas como ser humano. E estou super aberto a essa experiência, que talvez seja a mais difícil.”
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CAPA Como foi sua primeira vez?
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1Reportagem Como explorar sua sexualidade?
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2Semana Um guia para cada nova etapa da carreira
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3Podcast da semana Tássia Magalhães: "Encaro premiações sem pirar"
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45 dicas 5 dicas para sair da casa dos pais
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5Bloco de notas Dicas de livros, filmes e outros conteúdos sobre o tema: primeira vez