Coluna da Isabelle Moreira Lima: Já escolheu o que vai beber no ano novo? — Gama Revista
COLUNA

Isabelle Moreira Lima

Já escolheu o que vai beber no ano novo?

As dicas que faltavam para você eleger o espumante do Réveillon. Saiba mais sobre as regiões, os métodos de produção, os diferentes estilos e veja dicas de como servir melhor e de que rótulos comprar

29 de Dezembro de 2021

Já escolheu que garrafa vai abrir hoje? Faz tempo que ficou entendido que espumante não é só vinho de comemoração, que é uma bebida gostosa para se tomar quando se quer. Ao mesmo tempo, a primeira coisa que passa pela nossa cabeça na hora de uma celebração é abrir um vinho com deliciosas borbulhas. Passado um ano tão difícil quanto 2021, mesmo que o próximo ainda seja cheio de desafios, é um alívio danado deixar para trás meses penosos. Daí eu pergunto: o que vai estar na sua taça na hora da virada?

Se ainda não tem ideia, quero abrir um papo aqui para falar do incrível mundo das borbulhas — ou pérlage, o termo técnico usado para designar essas bolhinhas fininhas que sobem até a borda do vinho e formam a mousse, aquela espuma desejavelmente cremosa. A maior característica dessa bebida enquanto categoria, eu diria, é sua imensa variedade de perfis: têm os levinhos para tomar sozinhos, com os amigos, num dia de sol, na balada; os que são ótimos para qualquer petisco e arrasam nos coquetéis ou no começo de um jantar; os supergastronômicos, que encaram qualquer prato, inclusive ingredientes que são inimigos históricos do vinho como ovo, azeitona, aspargos; e os supercomplexos, que eu não recomendaria para um dia de calor ou de festa porque precisam de atenção profunda, e que podem envelhecer por décadas.

Passado 2021, mesmo que o próximo ano ainda seja de desafios, é um alívio danado deixar para trás meses penosos

Os espumantes mais famosos do mundo são os de Champagne, feitos por tradicionais maisons (como são chamadas as vinícolas por lá), que misturam muitas safras para adquirir sua marca — tem os mais festivos, os mais elegantes, os mais austeros, os gastronômicos. Os champagnes são feitos com Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier e costumam ser caros e cheios de informações sensoriais. Esses de grandes maisons dividem hoje o mercado com outros de pequeno produtor, que são o novo must da região.

Acontece que há um mundo infinito de borbulhas para além de Champagne. Mesmo na França, há os Crémants de Borgonha e os Blanquette de Limoux, só para dar outros exemplos. Eles são feitos em outras regiões francesas, com outras uvas e algumas vezes outros métodos. Com as mudanças climáticas, a Inglaterra tem se destacado na produção de espumantes (mas eles ainda são raros por aqui) e até os franceses têm comprado terras lá.

A Espanha ficou conhecida por seus cavas, feitos com uvas autóctones da Catalunha, e que estão cada vez mais famosos por aqui, com suas notas muito cítricas. O Freixenet, por exemplo, entrou com tudo no mercado brasileiro há alguns anos e virou figurinha carimbada nos supermercados. Da Itália, o Prosecco, feito com a uva Glera, foi superpopularizado nos início dos anos 2000 e virou uma onda gigante que varreu o planeta. É uma bebida levíssima, com aromas de fruta branca delicado e floral, nos melhores exemplares. Por aqui ficou conhecido porque uma das participantes dos primeiros BBBs bradava seus desejos por taças de Prosecco.

Chegando ao Brasil, podemos dizer com orgulho que fazemos ótimos espumantes já há bastante tempo. Nossos exemplares usam as uvas de Champagne, mas trocamos a Pinot Meunier pela Riesling Itália. Eles têm acidez alta, logo, são muito refrescantes. Os aromas costumam ser frutados e delicados nos mais bem feitos, mas há alguns que trazem até um tostadinho de brioche, característica que adquirem por passar mais tempo em contato com leveduras. O sul é a região mais famosa para essas bebidas. O Rio Grande do Sul tem algumas indicações de procedência como Vale dos Vinhedos e Pinto Bandeira e muitas, mas muitas vinícolas que fazem espumantes deliciosos, como Cave Geisse, Família Valduga, Estrelas do Brasil, Salton, isso sem falar no novo e moderno mundo dos pét-nats. Mas há agora lindos vinhos feitos na região da Mantiqueira e até uma nova produção na Chapada da Diamantina.

Mais vale um bom espumante brasileiro que um francês desconhecido. Tem muito importado com cheiro de sabonete por aí

*

Uma dica valiosa aqui no meio, provavelmente a mais importante desta coluna e espero que o leitor tenha chegado até aqui: mais vale um bom espumante brasileiro que um francês desconhecido. Tem muito importado barato (ou nem tanto) com cheiro de sabonete por aí.

*

Além das regiões e estilos, na hora de comprar é importante saber que há métodos diferentes de produção. O Champenoise ou tradicional (ou, ainda, clássico), em que a segunda fermentação do vinho, essa que dá a borbulha, é feita em garrafa. Depois que o vinho base está pronto, é adicionado o licor de tiragem, uma dose de vinho, com açúcar e um novo aporte de leveduras, e a garrafa é fechada por uma tampinha de cerveja. Esse vinho fica em contato com as leveduras por alguns meses, num processo chamado autólise, que forma as borbulhas mas também concede mais complexidade e cremosidade.

Por fim de alguns meses, essas leveduras são retiradas no dégorgement e, então, é adicionada uma nova dose de açúcar (a chamada dosage), que vai designar o tipo de espumante, que começa no Nature (mais seco) e passa pelo Extra-Brut, Brut, Seco, Demi-Sec e, finalmente, o Doce.

O outro método, o Charmat, é o de tanque, onde tudo isso acontece em grandes volumes. O mesmo tipo de gás é produzido, mas a bebida tem menos contato com as leveduras, o que faz uma bebida mais leve e fácil, para ser tomada mais descomplicadamente.

Há ainda o método ancestral, em que a segunda fermentação é feita na garrafa, sem que haja qualquer outro procedimento depois dela — e a tampinha de cerveja vai para a prateleira do mercado.

*

Para ter felicidade completa, na hora de servir, atenção a essas dicas: enxague muito, muito bem as taças. Detergente e borbulha não são muito amigos.

As taças tipo flûte, aquelas compridinhas, são boas para preservar as borbulhas por mais tempo. Mas se for beber algo mais especial, as taças universais, de vinho tranquilo, são boas para perceber os aromas.

Espumante gelado nesse calor é melhor que apenas frio. Gele bem, menos de 10ºC, e tenha um balde de gelo pronto para depois que abrir a garrafa.

Para abrir, deixe o polegar sempre firme no topo da garrafa, ao abrir o arame da gaiolinha e mesmo ao girar a rolha na hora h. Estas rolhas são loucas e voam a até 40km/h. Elas saem com mais força se a bebida está gelada como a gente quer.

Para encher a taça, sirva primeiro 2cm do espumante, espere a mousse baixar, e aí sirva uma segunda vez até um pouco acima de meia taça. Vale um brinde, saúde, feliz 2022!

Saca essa rolha

BORBULHAS DIVERTIDAS
Nada é mais divertido do que tomar um pét-nat, o espumante feito com método ancestral que falei apenas en passant nesse texto mas que é esmiuçado aqui neste outro. Os borbulhantes da Vivente, da Vinhas do Tempo, da Arte da Vinha e da Casa Viccas são deliciosos. Também já há pét-nats importados, como um supreendente rosé de Tannat uruguaio chamado Simples, que é ótimo e tem bom preço. Fora os pét-nats, outro espumante de método tradicional e divertido é o Bodega Sossego CAMP4ÑA Brut Rosé, que é bem correto e é perfeito pra limpar o paladar entre um petisco e outro.

PÉRLAGE ELEGANTE
As vinícolas mais tradicionais brasileiras fazem tanta coisa boa! Sou fã da Casa Valduga, que visitei há alguns anos e fiquei impressionada com a dupla de enólogos-chefes, sua precisão e dedicação ao estudo. O 130 é a linha mais clássica da casa e vale a prova, mas todas as linhas são corretíssimas, da entrada à mais cara. Para sair do comum, a dica é provar o Casa Verrone Brut, feito na região da Mantiqueira. E, se a ideia for provar algo de fora do Brasil, o italiano Bernardi Jacur 765 tem preço ótimo e é uma delícia garantida.

MOUSSE COMPLEXA
Outra vinícola cuja fama a precede é a Cave Geisse, de Pinto Bandeira, vale provar tudo e qualqeur coisa deles, o que couber no bolso. (Só para entender um pouco a lógica do custo: o preço sobe, geralmente, de acordo como tempo de autólise, ou seja, por quanto tempo a bebida fica em contato com as leveduras, o que a deixa mais complexa.) Dos importados, amo de paixão o espanhol Loxarel Brut Nature Reserva 2017, que tem um tostadinho dos deuses e de que já falei bem por aqui também.

Isabelle Moreira Lima é jornalista e editora executiva da Gama. Acompanha o mundo do vinho desde 2015, quando passou a treinar o olfato na tentativa de tornar-se um cão farejador

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões da Gama.

Quer mais dicas como essas no seu email?

Inscreva-se nas nossas newsletters

  • Todas as newsletters
  • Semana
  • A mais lida
  • Nossas escolhas
  • Achamos que vale
  • Life hacks
  • Obrigada pelo interesse!

    Encaminhamos um e-mail de confirmação