Hygge, o segredo dinamarquês para a felicidade
É o traço mais forte da cultura dinamarquesa, um sentimento e um estilo de vida – e parece também um post do Instagram
Topa ser um pouco mais hygge hoje? Não tem ideia do que se trata? É um estilo de vida. Mas é também um sentimento e, mais, um tipo de sabedoria. Mas acima de tudo é o segredo dos dinamarqueses para estar no topo do ranking da percepção de felicidade ao redor do mundo – desde a primeira publicação do World Happiness Report, em 2012, a Dinamarca se destaca entre os três primeiros colocados.
Claro que os altos índices positivos do país, além de indicarem a eficiência do modelo escandinavo, mostram que a felicidade lá existe porque as condições sociais são mais justas do que em outras partes do mundo, com um sistema de saúde universal e educação gratuita para todas as idades. Mas o hygge também explica muito (em bom português, diga “ruga”).
O governo dinamarquês tem dificuldade em definir o termo, mas a ideia está relacionada a reduzir a correria do cotidiano para estar junto das pessoas que você gosta, ou até mesmo sozinho, e relaxar aproveitando os prazeres de uma vida aconchegante. O termo foi adicionado apenas em 2017 ao Dicionário Oxford, que define a palavra como “uma qualidade de aconchego e convívio confortável que gera um sentimento de contentamento ou bem-estar”.
“Hygge pode funcionar como um motor para a felicidade em uma base diária. Hygge nos dá a linguagem, o objetivo e os métodos para planejar e preservar a felicidade –e, ainda, para nos dar um pouco mais dela todos os dias. Hygge pode ser a coisa mais próxima da felicidade quando chegamos em casa depois de um longo dia de trabalho no frio e na chuva”, diz Meik Wiking, escritor dinamarquês e CEO do Happiness Research Institute.
Segundo resenha do New York Times, o conceito explicado em “O Livro do Hygge, o Segredo Dinamarquês para Ser Feliz”, de Wiking, é um acalento para o coração. A recente busca por aconchego em um mundo cada vez mais radicalizado explica a popularidade global do estilo de vida dinamarquês. A hashtag #Hygge no Instagram conta com quase 6 milhões de publicações. Já existem influenciadores hygges e, claro, as marcas pularam em cima da tendência, utilizando-se do termo em produtos sempre que possível – e geralmente quando são confortáveis e aconchegantes.
A popularidade em redes sociais como Pinterest e Instagram é fácil de entender: o apelo do hygge é o conforto, mas também a elegância. O cenário é normalmente um ambiente tranquilo e bonito com muita madeira, mantas, velas, estofados brancos, lareiras, pantufas. Se for verão, pode ser um parque ou uma praça com um piquenique montado. O importante é ser um lugar familiar, em que você gostaria de estar.
A comida é parte importante. Os dinamarqueses associam hygge a uma refeição acompanhada por vinho ou cerveja, ou a um chocolate quente com um pedaço de bolo ou outros doces. Até número musical de Frozen já foi inspirado nele.
Entretanto, os locais não estão totalmente felizes com essa popularidade mundial. De acordo com a jornalista dinamarqueses Laura Byager, o hygge está sendo transformado em uma estratégia comercial para vender velas, meias e cobertores. Segundo ela, o verdadeiro sentimento não pode ser comprado em uma prateleira.
Apesar da recente popularidade, a tradição não é nova: de acordo com o governo dinamarquês, o termo é utilizado desde 1800. E existem registros de palavras similares em língua nórdica antiga que remontam à Idade Média, sempre no sentido de estar “protegido do mundo exterior” e “confortar” ou “consolar”.
Alguns dinamarqueses vão até mais longe, apontando o lado sombrio da cultura. A escritora Dorthe Nors, autora de “Karate Chop”, escreveu um conto intitulado “Hygge”, onde a cultura do conforto acaba em um brutal assassinato. Na introdução do conto, Nors diz que hygge serve também como uma ferramenta de controle social, o que explica a vitória dinamarquesa nas pesquisas de “pessoas mais felizes do mundo” todo ano.
“O Hygge é usado para suprimir sentimentos em famílias ou relacionamentos”, afirma a autora, contando que sempre que alguém quer falar sobre algo desagradável, corre o risco de estragar o hygge, desestabilizando as relações.
Apesar das controvérsias, o hygge faz parte da tradição escandinava, acompanhado pelo Lagom sueco, o Kos norueguês e a própria Lei de Jante, também dinamarquesa. Essas “regras”, ou filosofias, dão instruções de como viver em sociedade, ter uma vida melhor e ser mais feliz. E apesar das críticas, ano após ano os países nórdicos continuam no topo do mundo. Alguma coisa eles estão fazendo certo.