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ConversasFábio Moon: 'Quando a gente estava isolado, os quadrinhos abriram uma janela para um mundo melhor'
Em entrevista a Gama, o artista fala sobre a nova geração de quadrinistas no Brasil e diz que vivemos uma era de ouro das HQs no país, com títulos de mais reflexão
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Fábio Moon: ‘Quando a gente estava isolado, os quadrinhos abriram uma janela para um mundo melhor’
Em entrevista a Gama, o artista fala sobre a nova geração de quadrinistas no Brasil e diz que vivemos uma era de ouro das HQs no país, com títulos de mais reflexão
No Brasil, quando se fala em histórias em quadrinhos, talvez a primeira coisa que venha à cabeça de alguns sejam os personagens de Maurício de Sousa ou tirinhas como as da Laerte. No entanto, já faz algum tempo que a produção nacional de HQs não se resume mais a alguns poucos nomes e opções. Pelo contrário, novos artistas e obras nacionais têm se destacado aos montes não só por aqui, mas no mundo inteiro.
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Alguns dos principais nomes que abriram caminho nesse mercado e nos corações de milhões de leitores vêm curiosamente de dois irmãos, ainda por cima gêmeos, que trabalham juntos desde suas primeiras publicações: Fábio Moon e Gabriel Bá. Eles foram inclusive os primeiros brasileiros a receber um prêmio Eisner, conhecido como o Oscar das HQs, pela hoje famosa série em quadrinhos “Daytripper” (Panini, 2020), criada e roteirizada pela dupla.
“Essa coisa de fazer um quadrinho autoral, em que a gente escreve e desenha, que é publicado lá fora, ganha prêmios e vende bastante mostra que você pode ter uma carreira nos quadrinhos. Se a gente conseguiu, outras pessoas podem conseguir também”, afirma Moon em entrevista a Gama. O quadrinista aponta que premiações como essa e a do brasileiro Marcello Quintanilha – que acaba de receber o título máximo no Festival de Angoulême, a Cannes das HQs, por “Escuta, Formosa Márcia” (Veneta, 2022) –, além de abrirem os olhos dos estrangeiros para as produções nacionais, servem como incentivo para que outros artistas invistam na carreira por aqui.
Página de “Escuta, Formosa Márcia” Divulgação/Veneta
Moon e Bá começaram carreira com o aclamado fanzine underground “10 pãezinhos”, passando por revistas independentes e até uma adaptação da novela “O Alienista” (Quadrinhos na Cia, 2022), de Machado de Assis, para as HQs antes de “Daytripper”. A dupla também já trabalhou em parceria com Mike Mignola, criador do personagem Hellboy, publicou uma tira dominical na Folha de S.Paulo e adaptou para os quadrinhos o romance “Dois Irmãos” (Quadrinhos na Cia, 2015), de Milton Hatoum, e o conto “Como Falar com Garotas em Festas”, de Neil Gaiman. Mais recentemente, a HQ “Umbrella Academy” um trabalho de Bá em parceria com Gerard Way, vocalista da banda My Chemical Romance, virou uma série de sucesso na Netflix – com uma nova temporada a caminho em junho.
Nos últimos dois anos, no entanto, Moon conta que os irmãos não conseguiram trabalhar juntos devido ao isolamento. Hoje, ainda em ritmo mais lento do que o usual, eles vêm retomando essa parceria. “Trabalhar junto – especialmente no mesmo lugar, como voltamos a fazer agora – não é a norma dos quadrinistas, mas ajuda a gente a abandonar essa sensação de que ninguém vê o que a gente faz”, revela o artista.
Além desses temas, Moon também conversa com Gama sobre a nova geração de quadrinistas brasileiros, a falta que fazem os eventos de quadrinhos e como anda esse mercado por aqui.
Hoje as HQs falam para um público mais diverso, são mais profundas, oferecem uma reflexão
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G |Como foi a pandemia para você e seu irmão? Ela afetou a rotina de trabalho?
Fábio Moon |Meu irmão tem uma filha que tinha um ano e meio no começo da pandemia, então era uma idade que demandava muito. Ele teve que parar totalmente, e eu continuei trabalhando, só que de casa, não no nosso estúdio. No começo, eu fazia uma página semanal para o blog da Companhia das Letras, o meu diário do isolamento, onde falava sobre a pandemia. Isso me ajudava a ter um deadline semanal que me permitia não focar só no lado ruim da pandemia, embora estivesse tratando dele. O quadrinista já é isolado, já trabalha só de casa, faz tudo sozinho. E a gente não tinha mais lançamento de livro, evento, livraria, então ficou ainda mais isolado. Isso deu um gatilho que fez as pessoas se sentirem sozinhas e desesperadas, o que também é uma tendência do quadrinista. Eventualmente desenvolvi uma fadiga da pandemia, comecei a querer ver gente e a desenhar mais devagar, produzir menos. Tentei não me culpar muito e entender que faz parte, não dá para abusar da saúde.
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G |Vocês conseguiram retomar o ritmo? Hoje estão trabalhando em algum projeto?
FM |A gente está trabalhando em um projeto para o mercado americano que ainda não tem data para sair, especialmente com a pandemia. Agora temos outro cronograma. Estamos produzindo num outro ritmo, que ainda não é o ideal. Por um lado, já estou acostumado a trabalhar em projetos que demoram anos para ficar prontos. Precisa ter a paciência de ficar avaliando a produção. Se produziu uma só página em um dia, não foi um bom dia… Então estamos produzindo devagar, mas produzindo.
Dupla de páginas da versão em inglês de “Como falar com garotas em festas” Divulgação/Dark Horse Books
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G |Como funciona seu processo de criação?
Fábio Moon |Depende do projeto. Nas histórias de isolamento que eu fazia, guardava o final de semana para concluir o que tinha sentido, visto e experimentado durante a semana, resumia e criava uma página. O perfil do projeto era refletir o momento. Com a história longa, você precisa pensar em tudo, quebrar os pedaços para programar um ritmo de produção. A gente escreve junto e vai conversando em voz alta. Aí decide quem vai desenhar, se é uma história em que funciona ter dois desenhos diferentes, quais páginas cada um vai fazer. A gente divide em capítulos para conseguir ter metas menores. Fizemos isso com “Dois Irmãos”. O ideal seria escrever a história inteira, mas no “Dois Irmãos” a adaptação ia dar muito trabalho, então depois de dois anos trabalhando no roteiro tivemos que começar a desenhar para ter algo tátil na nossa frente e uma noção física do progresso do trabalho.
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G |Trabalhar em dupla é algo que ajuda a romper esse isolamento do artista de que você falou?
FM |Trabalhar junto – especialmente no mesmo lugar, como voltamos a fazer agora – não é a norma dos quadrinistas, mas ajuda a gente a abandonar essa sensação de que ninguém vê o que a gente faz. A rotina de trabalho é algo mecânico, operário. Muita gente faz quadrinhos porque gosta de ler, que é algo dinâmico e rápido, enquanto criar é o contrário. Demora demais. Nessa demora é que as pessoas começam a se sentir sozinhas, ter insegurança sobre o próprio trabalho. Poder conversar sobre o processo, acompanhar o passo a passo, a produção e a vontade do outro de produzir, tudo isso ajuda a superar essas dificuldades da rotina de fazer quadrinhos.
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G |Nesse período, você conseguiu também ler quadrinhos?
FM |Nos dois primeiros meses da pandemia, eu não conseguia me concentrar por mais de cinco minutos. Toda hora parava para pensar em alguma coisa que tinha acontecido, alguém que tinha morrido. Depois consegui lentamente voltar a ler, primeiro quadrinhos, depois livros. O quadrinho é mais rápido de ler e tem imagens, então ele prendia mais. A produção online, aliás, aumentou na pandemia, porque era ao que as pessoas tinham acesso mais fácil. Vários autores publicavam todo dia. Alguns tratavam de temas relacionados à pandemia, outros de histórias normais, mas todos ajudavam a passar o tempo, mergulhar num mundo imaginário e esquecer as incertezas da pandemia. E, com o tempo, voltei a conseguir me concentrar e ler. Agora consigo ler, ver filme, série…
Fazer quadrinhos é algo que só depende do autor, com ou sem pandemia. Mas existia esse fator eventos, que fazia muita diferença na retomada do interesse
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G |Você recomenda alguma coisa que leu recentemente?
FM |A tira “Arlindo” foi uma grata surpresa, poder descobrir o trabalho da Ilustralu, uma jovem de Natal (RN). É sobre um jovem descobrindo a própria sexualidade, um negócio superlegal. Ano passado saiu uma versão impressa. Li um gibi japonês, do Taiy? Matsumoto, chamado “Ping Pong”, que fala sobre dois jovens do subúrbio japonês que participam de competições do esporte. O Matsumoto cria uma história cheia de reviravoltas, em que parece que o pingue-pongue é uma guerra interestelar. Ele dá um caráter épico para a competição que é muito legal.
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G |Acabou de sair uma reportagem da Folha, que diz que o Brasil vive seu melhor momento em anos na produção de HQs. Você concorda com isso?
FM |Essa já é uma conclusão pré-pandemia. A gente estava numa crescente de produção, surgimento de novos autores, trabalhos de qualidade, número de editoras… tudo estava melhorando e aumentando. Os eventos eram um sucesso em apresentar para o público autores que eles não conheciam e mostrar para os autores que existia público. Só espero que as pessoas não tenham ficado desesperadas com o breque dado pela pandemia. Não é um freio total porque quadrinhos continuam sendo publicados. Fazer quadrinhos é algo que só depende do autor, com ou sem pandemia. Mas existia esse fator eventos, que fazia muita diferença na retomada do interesse. Com vários autores num mesmo evento e um público gigante, as pessoas descobriam um monte de coisas que não tinham como achar na internet porque lá está tudo espalhado, sem direção. Isso proporcionou a criação de um mercado superdiverso. A pessoa nunca pensou que ia encontrar uma história sobre pingue-pongue ou sobre a infância de um rapaz numa cidadezinha do interior, que descobre que gosta de outros meninos. Isso, por sua vez, se reflete na vontade dos autores e das editoras de publicar. Inclusive as histórias estão melhorando. Se tem um mercado que possibilita uma carreira, os desenhos tendem a ir se aprimorando. Nesse sentido, é uma época de ouro. A gente não vende tanto quanto nos anos 1980, na época da revista “Chiclete com Banana”, dos “Piratas do Tietê”, mas hoje as HQs falam para um público mais diverso, são mais profundas, oferecem uma reflexão, o que cria um mercado mais legal.
Página de “Daytripper” Divulgação/Panini
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G |Como o perfil do fã de HQs mudou desde que vocês faziam a revista “10 Pãezinhos”? Assim como já existe para histórias de super-heróis, tem um público consolidado para quadrinhos autorais ou independentes?
FM |É um público menor, que às vezes intercepta o de super-heróis e outras publicações, porque são pessoas que gostam de quadrinhos em geral. Quando comecei, essa ideia do que era possível fazer em HQs era muito restrita. Na época, só se publicava humor. Hoje a produção nacional é muito mais diversa que isso, seja para crianças ou adultos. A quantidade de editoras que publicam material estrangeiro também é muito maior. Não chega só super-herói, começando pelos mangás. Tanto o nacional quanto o estrangeiro são diversos. Os autores do começo dos anos 2000 foram os últimos que na adolescência só liam super-heróis porque era o que tinha. A partir de 2010, vieram quadrinistas que liam mangás, e suas histórias eram superdiferentes. Dez anos depois, já tem toda uma geração que cresceu lendo esses autores e quadrinhos de todos os tipos na internet, que costumam ir em eventos, buscam HQs alternativas. Os autores de hoje já enxergam todas as opções, nem pensam que precisam escolher só uma coisa. Nos anos 1980 e 1990, você tinha que fazer quadrinhos de super-heróis. Eu fui atrás disso e descobri que tinha um mercado estrangeiro grande. Mas, até chegar lá, achava que a opção de ser quadrinista era só essa.
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G |Vocês conseguiram inspirar outros autores e também abrir os olhos de leitores aqui no Brasil com o sucesso do “Daytripper”?
FM |Eu e o Bá tivemos conquistas com o “Daytripper” que inspiraram. Essa coisa de fazer um quadrinho autoral, em que a gente escreve e desenha, que é publicado lá fora, ganha prêmios e vende bastante mostra que você pode ter uma carreira nos quadrinhos. Se a gente conseguiu, outras pessoas podem conseguir também. E é uma história que não envelheceu mal, então as pessoas continuam descobrindo ela até hoje. Neste final de semana, o Marcello Quintanilha ganhou o maior prêmio do Festival de Angoulême, na França. Uma das maiores qualidades dos quadrinhos é que eles só dependem do autor. Não é como fazer cinema, em que você precisa de um orçamento gigantesco. Só precisa desenhar. Existe uma facilidade para criar esse mundo onde os leitores vão mergulhar. Esse sucesso de HQs nacionais ao redor do mundo mostra que não importa onde você está, importa o trabalho que você faz. O Quintanilha por acaso vive na Espanha há 20 anos, mas eu e o Bá nunca moramos fora do Brasil. O trabalho é que vai longe.
A gente conseguiu desenhar uma cidade que não existe mais, a Manaus da infância dos leitores. Essa camada visual impressionou até o Milton Hatoum
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G |Vocês estão entre os quadrinistas brasileiros que conquistaram espaços importantes lá fora. Considerando esse prêmio recente para o Quintanilha, dá para dizer que o mercado estrangeiro está abrindo os olhos para a produção nacional?
FM |O mercado internacional não tinha o costume de olhar para o Brasil, no início por causa da língua. Mas ter um autor de sucesso lá fora e descobrir que ele é brasileiro cria uma curiosidade das editoras internacionais. Foi o que aconteceu quando fomos premiados pelo “Daytripper”. A receptividade para autores brasileiros aumentou pelo menos no mercado americano. Os franceses não têm essa dificuldade, porque estão acostumados com HQs do mundo inteiro. Só que eles têm um mercado muito grande, então nem todo editor olha para fora para encontrar o que publicar. Às vezes o autor precisa criar caminhos e mostrar seu trabalho por lá. Quando a gente começou, tinha que viajar ou mandar o trabalho pelo correio. Hoje em dia, você não precisa mais se locomover tanto. A internet já faz esse serviço, e os editores aprenderam a ver portfolios e projetos e ficar alertas para publicações e premiações. Uma coisa boa da premiação é que ela chama atenção para outros mercados. Aí, se é uma coisa brasileira, eles ficam com a pulga atrás da orelha: quadrinhos brasileiros, como será o trabalho desses caras?
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G |Vocês já fizeram adaptações literárias para HQs, com “O Alienista”, “Dois Irmãos” e “Como Falar com Garotas em Festas”, do Neil Gaiman. Os quadrinhos podem ser uma boa porta de entrada para várias dessas obras?
FM |No mínimo, é uma oportunidade de criar uma conversa entre dois públicos diferentes. Uma chance de mostrar para o público literário que as histórias podem funcionar numa outra mídia, o que pode criar um leitor de quadrinhos. Da mesma forma que, com “O Alienista”, a gente mostra Machado de Assis para o leitor, que pode se interessar em ler outras coisas dele. Foi algo que nos motivou a fazer essas adaptações. Fazer quadrinhos é trabalhar em camadas. Tem a imagem, os balões, as palavras e como essas coisas funcionam juntas. Ao fazer uma adaptação, você pode incluir camadas que a outra versão não tem. No caso do “Dois Irmãos” e “Como Falar com Garotas em Festas”, enquanto a gente produzia as HQs, as duas obras estavam sendo adaptadas para o audiovisual, então a gente pôde enxergar escolhas necessárias para mídias diferentes. A adaptação de “Dois Irmãos” para a TV sofreu muito mais do que a gente para recriar Manaus e o passar do tempo. Quando lançamos o livro lá é que a gente percebeu o poder da imagem na adaptação. Os leitores ficaram impressionados com a forma como a gente conseguiu desenhar uma cidade que não existe mais, a Manaus da infância deles. Essa camada visual impressionou até o Milton Hatoum.
Ilustração de “Dois Irmãos” Divulgação/Quadrinhos na Cia.
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G |Como é ver uma produção em que um de vocês trabalhou, como “Umbrella Academy”, ganhar vida em outra mídia, ainda mais numa superprodução da Netflix?
FM |Foi como estar na posição contrária. No começo, tinha um pouco de receio porque, ao criar quadrinhos, você tem o controle de tudo. Quando alguém adapta seu trabalho, não dá para controlar o que as outras pessoas estão fazendo. Foi algo que demorou para o Bá e o Gerard [Way] se acostumarem. No início, ficaram muito receosos pelas coisas que iam ter que mudar um pouquinho no roteiro ou as roupas dos personagens. Foi quando começou a gravar que eles passaram a enxergar que a essência da história, a dinâmica dessa família de super-heróis, funcionava da mesma forma que no gibi. Aí eles entenderam que as mudanças estavam lá para que aquilo funcionasse. São mídias diferentes, então precisa pensar de outro jeito, saber o que é possível realizar, quais efeitos dá para usar. Não ter o controle total ajuda a se surpreender positivamente, como foi com os cenários da mansão e da delegacia de polícia da primeira temporada. Ficamos supercontentes, porque teve um saldo muito positivo, a série ficou boa e as pessoas adoram. Ela também ajudou a introduzir o universo dos quadrinhos, criando curiosidade quanto ao original e aumentando a venda dos gibis.
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G |Temos visto crises sucessivas no mercado editorial brasileiro e agora um aumento do preço do papel, que impacta a produção e o valor de livros e HQs. Você vê um impacto negativo para a produção de quadrinhos?
FM |Impacto tem. Durante a pandemia, o dólar disparou. O problema do papel é mundial, então editoras nos EUA precisaram parar. Tudo isso fez com que gibis ficassem mais caros. O próprio “Daytripper”, que custava R$ 60, hoje está mais de R$ 100. É impossível isso não fazer diferença, precisa ter um público disposto e que tenha dinheiro para gastar com HQs. Talvez nosso público diminua até as pessoas terem mais tranquilidade financeira. Mesmo com a crise, elas não abandonaram os livros. Algumas editoras tiveram seus melhores anos na pandemia porque se percebeu a importância da ficção, das histórias e da arte. Ajuda o mercado de HQs saber a importância de uma arte que estimule as pessoas a sonhar e querer mudar o mundo. A gente teve essa chance, que não foi desperdiçada. Até no Brasil, onde existe um esforço do governo para sabotar a arte e a cultura, elas se mostraram essenciais. Quando a gente estava isolado, os quadrinhos abriram uma janela um mundo melhor, que ajudou os brasileiros a sobreviver à pandemia.
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G |No imaginário popular, as HQs deixaram para trás aquela ideia de serem produções simplistas ou muito infantis? Já se consolidou a visão dos quadrinhos como uma expressão artística diversificada?
FM |Sim e não. Existe ainda essa visão antiga porque é a referência que a gente tem. O Maurício de Sousa publica em banca e chega ao Brasil inteiro. A gente descobre o que são HQs com quadrinhos para crianças, fica muito marcado isso na nossa cabeça, assim como a gente pensa que TV é só novela e “Big Brother”. Mas quem continua consumindo quadrinhos depois que para de ler “Turma da Mônica” já não tem mais essa ideia. Passamos da fase de mostrar que dá para fazer qualquer tipo de história e de discussão. Só precisa ser uma mídia resiliente porque, para avançar, tem que produzir. Assim, cada autor cria uma carreira e um corpo de trabalho, preenchendo prateleiras que viram os exemplos que as pessoas vão ter do que são quadrinhos. Os festivais mostravam essa variedade que existe nas HQs. Esse público que descobre coisas novas não é limitado, ele só tinha um acesso limitado. E, para que o público perceba que existe variedade, os autores têm que continuar produzindo.
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