Sergio Zimerman, da Petz, e o mercado de animais de estimação — Gama Revista
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Isabela Durão

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Conversas

Sergio Zimerman, CEO da Petz: "Hoje, o pet ocupa até o lugar de um filho"

Em entrevista, fundador da maior rede de pet shops do Brasil aborda do salto no mercado de pets à necessidade de mais tributos para os ricos

Leonardo Neiva 08 de Outubro de 2023

Sergio Zimerman, CEO da Petz: “Hoje, o pet ocupa até o lugar de um filho”

Leonardo Neiva 08 de Outubro de 2023
Isabela Durão

Em entrevista, fundador da maior rede de pet shops do Brasil aborda do salto no mercado de pets à necessidade de mais tributos para os ricos

É verdade que a pandemia teve um impacto profundamente negativo para a saúde mental, para os empregos e para boa parte dos setores da sociedade, como o de restaurantes e entretenimento. Mas também fez explodir um ramo que até já vinha em alta, mas que deu um salto vertiginoso no período: o de produtos e serviços para animais de estimação.

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Em 2022, o faturamento desse mercado ultrapassou os R$ 60 bilhões no Brasil, segundo dados do IPB (Instituto Pet Brasil) — um aumento de cerca de 50% na comparação com o ano de 2020. E a projeção para 2023, de acordo com a instituição, é de um crescimento de mais 12% no território nacional.

Nesse ecossistema cada vez mais amplo de negócios, produtos e serviços voltados para os bichinhos — hoje, o país ocupa a impressionante terceira posição no faturamento global, aponta a Abinpet (Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação) —, uma marca ocupa lugar de destaque: a Petz, a líder do setor de pet shops no país.

Ainda que polêmico para muita gente, por comparar o animal de estimação a uma criança, o apelido “mãe” ou “pai de pet” pode explicar parte do êxito desse mercado nos últimos anos. Ao menos é o que aponta o executivo Sergio Zimerman, fundador e CEO da Petz.

“Hoje, o pet é um membro da família e muitas vezes ocupa até o lugar de um filho”, afirma Zimerman em entrevista a Gama. “E esse não é um fenômeno brasileiro, mas sim uma tendência mundial.”

O próprio executivo de 57 anos lembra que, quando começou a empreender no ramo, em 2002, o cenário era bem diferente. Na maioria dos lares brasileiros, por exemplo, os cães não costumavam ultrapassar os limites do quintaL e raramente entravam em casa. Hoje, diz Zimerman, eles dormem na cama com seus tutores e frequentam até restaurantes ao seu lado.

O tratamento dos pets como membros da família se intensificou como consequência da maior permanência [dos tutores] em casa

Na visão do empreendedor, esse comportamento se tornou ainda mais claro e intenso com o isolamento pandêmico. Além de trancar as pessoas em casa com seus pets, ele inspirou muita gente a buscar num gatinho ou cãozinho companhia para diminuir a solidão, o estresse e a ansiedade que foram às alturas na época. Só no Adote Petz, programa da empresa com alcance nacional, o número de adoções cresceu mais de 20% entre 2021 e 2022.

“O tratamento dos pets como membros da família se intensificou, um reflexo da maior interação e proximidade de seus tutores, como consequência da maior permanência em casa”, afirma Zimerman. Segundo ele, o fato de parte das pessoas não poderem gastar fora em áreas como turismo, lazer e gastronomia, também ajudou a concentrar o fluxo de recursos para o mercado pet.

Foi nesse período, em 2021, que, numa iniciativa conjunta de diversas companhias do setor, liderada pela Petz, a empresa aderiu à chamada licença PETernidade. Como o nome sugere, os funcionários passaram a ter direito a um tempo livre assim que adotassem um animal de estimação, na mesma linha de raciocínio que humaniza e trata os pets como membros da família.

“A iniciativa surgiu com o propósito de garantir mais qualidade de vida e bem-estar aos animais, além de apoiar e trazer mais tranquilidade para a rotina dos tutores na fase de adaptação do pet ao novo lar”, explica o CEO. O tempo contemplado pela licença fica a cargo de cada filial. No caso da Petz, são dois os dias para permanecer ao lado do novo companheiro. “Faz todo sentido oferecer esse benefício aos colaboradores, já que muitas vezes o animal é considerado um filho para eles”, complementa Zimerman.

O pai do Freud

Apesar dos mais de 20 anos à frente da rede de lojas voltadas para animais de estimação, a trajetória profissional de Zimerman é bem mais diversa e tortuosa do que parece à primeira vista. Com formação em varejo e administração, o empreendedor cresceu inserido no comércio, mesmo quando isso ainda não era uma questão de escolha. Isso porque ele passou a infância numa casa nos fundos da confecção de roupas infantis que os pais mantinham, no bairro paulistano do Brás.

Hoje também tutor de um cãozinho da raça yorkshire, chamado Freud, o empresário começou carreira aos 18 anos como animador de festas para crianças. Com o tempo, passou a investir na criação de seu próprio buffet, que depois acabou se transformando num mercadinho e, mais tarde, numa grande loja atacadista. De 1991 até 2002, ele esteve à frente do negócio, chamado Super Brasil, que acabou falindo.

Mesmo sem nunca ter investido no setor, Zimerman se inspirou no crescimento e resiliência que identificou no mercado pet já nessa época para se lançar no setor. Então, aproveitou o espaço do antigo atacado, na hiper movimentada Marginal Tietê, em São Paulo, para abrir a Pet Center Marginal. Com o tempo, o negócio foi crescendo, e novas lojas abrindo pelo país. Em 2015, a rede foi rebatizada como Petz.

Eu, como CEO da companhia, pago menos imposto do que um operador de caixa da minha empresa

Hoje entre as maiores empresas do Brasil, e não só dentro do setor pet, o executivo também ganhou as manchetes em 2022 após defender uma maior tributação para os mais ricos no Brasil, apontando a reforma tributária como ferramenta importante de justiça e reparação social — posicionamento raro e não muito popular entre o empresariado nacional. “Eu, como CEO da companhia, pago menos imposto do que um operador de caixa da minha empresa”, chegou a afirmar em entrevista ao Estadão.

Para Zimerman, o fato de sermos reféns desse modelo tributário, que “só aprofunda as desigualdades sociais”, contribui para a atmosfera de medo e insegurança que existe no Brasil. “Meu sonho é viver em um país em que não haja mais necessidade de blindar o carro, colocar cercas elétricas e viver enclausurados em condomínios”, afirma a Gama.

E, de fato, deveria haver até um interesse comercial no combate à concentração de renda, na visão do empresário, já que um varejo forte demanda uma sociedade igualmente forte. “Precisamos desenvolver a consciência de cada vez mais termos uma pirâmide social em forma de losango, e não triangular como a nossa”, diz Zimerman. “Alguns empresários entendem e apoiam, enquanto outros preferem rotular como uma visão esquerdista.”

A revolução dos gatos

Os gatos sempre estiveram atrás dos cães na preferência dos brasileiros. Mas, a julgar pela movimentação nos últimos tempos, o quadro vem mudando. O Censo Pet IPB, um dos principais sobre o tema no Brasil, apontou crescimento recorde de 6% na quantidade de felinos domésticos por aqui entre 2020 e 2021, contra 4% a mais de cachorros.

“Muitas pessoas preferem o gato porque é um animal independente e, portanto, mais fácil de cuidar, que não requer muito espaço e permite ficar mais tempo fora de casa”, lembra Zimerman. O problema é que, segundo o empresário, o mercado ainda oferece poucos produtos e serviços aos felinos na comparação com os cachorros.

O que não significa que a indústria esteja de braços cruzados. O executivo aponta que as principais empresas já vêm se movimentando para ampliar as ofertas de produtos para gatos, com uma maior variedade de rações e areias específicas, mais móveis para a “gatificação” de espaços da casa e uma gama de brinquedos de vários tipos.

No caso da empresa, Zimerman destaca uma unidade da Seres — rede de centros veterinários da Petz — em São Paulo, com salas de espera, consultório e espaço de internação totalmente adaptados para os felinos. O ambiente, segundo ele, inclui até um feromônio sintético, que ajuda a deixar os gatos mais confortáveis e tranquilos por ali.

Bichinhos “naturebas”

Outra tendência forte é a busca cada vez mais detalhada por informações de qualidade sobre produtos voltados para os bichinhos, diz o empresário. E uma alimentação mais natural ou premium costuma estar no topo das preocupações. Tanto que a empresa chegou a lançar recentemente uma linha de alimentos naturais não congelados para cães, com validade média de dez meses.

Mas a demanda por produtos naturais não se restringe à alimentação dos pets. “A sustentabilidade, ainda que de forma inicial, já é um dos valores que os consumidores consideram na hora de comprar um produto ou adquirir um serviço”, confirma Zimerman. Quase 70% dos tutores de pets no mundo, por exemplo, estão preocupados com as mudanças climáticas e dizem tentar causar um impacto positivo no meio ambiente em suas ações cotidianas, segundo pesquisa da consultoria de inteligência de mercado Euromonitor International.

Embora os exemplos ainda sejam escassos, o executivo cita uma linha de tapetes higiênicos produzidos a partir de fraldas defeituosas, cujo material é reciclado. Além disso, numa parceria com a Editora MOL, a rede doa parte da renda arrecadada com a venda de livros em suas unidades para a ONG SOS Mata Atlântica, neutralizando por meio do plantio de árvores a emissões geradas com a impressão dos volumes.

Também já faz algum tempo que o comércio de cães e gatos está na mira de ativistas. Em 2019, a Petz se viu no centro de uma polêmica sobre o tema. A empresa decidiu parar de vender filhotes depois que um canil no município de Piedade, no interior de São Paulo, que mantinha relação comercial com a marca, foi acusado de maltratar centenas de cachorros. Recentemente, a venda de cães e gatos em pet shops também foi proibida por um projeto de lei em São Paulo — a confirmação ainda depende de sanção do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Tudo em um lugar ao mesmo tempo

Para Zimerman, além da venda de itens básicos para esse mercado, como brinquedos e petiscos, ainda há enormes espaços à espera de produtos e serviços que complementem essa nova relação tutor-pet, pontos aos quais todo novo empreendedor no ramo precisa estar atento.

Uma mudança importante sentida pelo mercado como um todo, mas especialmente impactante no setor pet, foi o aumento das vendas por canais digitais, diz o CEO. Se antes da pandemia o comércio digital representava só 8% das vendas na rede, hoje esse número saltou para 36%, segundo dados do último trimestre.

A Petz deve inaugurar sua própria versão de plano de saúde para animais de estimação

Apesar do enorme impulso gerado pela pandemia, a Petz vem encontrando dificuldades para manter o crescimento registrado no período. Com quedas acima dos 60% nas ações da empresa em relação ao ano passado, a expansão dos negócios faz parte das estratégias para se manter à tona e tentar retomar o crescimento. Até o final de 2023, a Petz deve inaugurar na Seres sua própria versão de plano de saúde para animais de estimação, atuando na promoção do bem-estar animal e na prevenção de doenças. O projeto deve bater de frente com outras gigantes do setor que já oferecem o serviço, como a Petlove e a Pet Health.

Na verdade, o plano nada modesto da empresa, como admite seu CEO, é montar um ecossistema completo de produtos e serviços para os animais e seus tutores, tudo debaixo de um mesmo guarda-chuva. Por isso, nos últimos anos, a Petz adquiriu empresas como a Zee.Dog, de acessórios estilosos para cães, a Cansei de Ser Gato, com produtos específicos para e sobre felinos, a Cão Cidadão, empresa de adestramento, e a Petix, fabricante de tapetes higiênicos.

Afinal, hoje o mercado engloba um número cada vez mais impressionante de ofertas de serviços, que vão desde velórios até hotéis e restaurantes pet friendly. “E queremos estar presentes em todos os pontos de contato com o cliente”, afirma Zimerman.