Como anda sua bateria social?
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Ilustração de Luana Silva

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5 dicas

Como carregar a bateria social e conservar as amizades

Especialistas indicam caminhos para combater o esgotamento mental e a falta de disposição física para manter relações saudáveis e presentes com amigos e amigas

Ana Elisa Faria 01 de Junho de 2025

Como carregar a bateria social e conservar as amizades

Ana Elisa Faria 01 de Junho de 2025
Ilustração de Luana Silva

Especialistas indicam caminhos para combater o esgotamento mental e a falta de disposição física para manter relações saudáveis e presentes com amigos e amigas

“Quem tem um amigo tem tudo”, já diz a canção de Emicida. Mas não é só ele que constatou isso. Hoje, há vários estudos que comprovam a importância de cultivar amizades para o bem-estar e a saúde mental. Da infância à velhice, as relações amistosas ensinam empatia, proporcionam apoio emocional, reduzem casos de depressão e contribuem significativamente para o desenvolvimento social e cognitivo.

Mas, apesar de serem essenciais para nós, humanos, muitas pessoas têm relatado um esgotamento tão intenso que falta disposição até para cultivar relações afetivas com amigos e amigas de longa data — os memes sobre o tema estão aí sendo compartilhados. O fenômeno, popularizado nas redes como “bateria social”, revela o quanto interações constantes — provavelmente porque já interagimos online com muita gente ao longo do dia — podem ser exaustivas, especialmente após a pandemia, período que alterou significativamente os padrões de convivência.

A assessora pedagógica Jussara Cristina Barboza Tortella, professora aposentada da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, lembra que amizades precisam ser alimentadas constantemente para serem mantidas. “É uma construção que se modifica ao longo do tempo, e envolve confiança, intimidade e reciprocidade. Sem esses elementos, os vínculos tendem a se enfraquecer”, observa.

Em um vídeo que viralizou, o médico Drauzio Varella alerta para os perigos de negligenciar as amizades, especialmente aquelas chamadas “de baixa manutenção”, também um termo da moda na internet. “Quando você deixa de conversar ou de encontrar com seus amigos, não está prejudicando só a sua vida social, mas também a sua saúde. Sem o suporte de pessoas em quem a gente confia, surgem sentimentos como ansiedade, insegurança, medo”, lista.

O doutor continua: “Até o sono pode ser afetado por causa de pensamentos incessantes ou da falta de atividades no dia a dia.” E responde aos questionamentos dentro desse tema: “Ah, mas é difícil manter e fazer amigos na vida adulta. Claro, não é tarefa fácil. Você vai precisar sair de casa e não só ficar esperando alguém te convidar”, indica Varella. Para os tímidos, ele tem uma sugestão: “Se a timidez for um empecilho muito grande, considere a ajuda de um psicólogo. Se cercar de pessoas queridas faz bem e é essencial para a saúde.”

Pensando nisso, Gama reuniu dicas para recarregar sua “bateria social” e manter as amizades por perto.

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    Ligue para um amigo. Mas também o encontre ao vivo –
    Em dias de cansaço extremo, em que nem um guindaste é capaz de nos tirar do sofá, uma rápida ligação — por videochamada, de preferência — para aquela comadre ou aquele camarada de longa data pode mudar o ânimo para melhor, além de ser um gesto de cuidado e interesse que também ajuda a manter a conexão emocional forte sem exigir grandes esforços. Luciana Karine de Souza, professora do departamento de psicologia do desenvolvimento e da personalidade da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), organizadora do livro “Amizade em Contexto: Desenvolvimento e Cultura” (Casa do Psicólogo, 2012), compartilha que uma ligadinha por vídeo para um grande amigo é importante para a manutenção do relacionamento e para ver o rosto alheio. “Nós, humanos, somos animais sociais e sensíveis à questão da imagem, de enxergar o outro nas nossas interações.” Souza frisa que escrever uma mensagem ou enviar um áudio são ações benéficas para cultivar as relações — “já é uma coisa boa ser procurado por alguém” —, mas não substituem o contato síncrono. “Essas trocas não são instantâneas e espontâneas. Você pode estar em uma depressão federal e mentir que está tudo bem, porque ninguém está vendo a sua expressão facial”, conta. A docente acrescenta que, para melhorar o humor e aumentar os graus de energia quando queremos ficar mais quietos no nosso canto, telefonar para uma amigona ou um amigão para falar besteiras e coisas engraçadas é uma tática feliz. “Você pode ligar dizendo: ‘Hoje eu tive um dia difícil, me conta uma piada?’ ou ‘Estou ligando só para dar um oi e saber como foi o seu dia, porque o meu foi péssimo e quero esquecê-lo’”, sugere. No entanto, a assessora pedagógica Jussara Cristina Barboza Tortella, professora aposentada da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e autora de um capítulo de “Amizade em Contexto”, alerta para que as ligações substitutas dos encontros presenciais não se tornem um hábito. “Se você precisa ficar um pouco quietinha ocasionalmente, tudo bem, mas se essa troca for constante, não é saudável. Hoje, há um movimento preocupante de jovens que só conversam online, que não querem sair de casa. Parece que há uma fobia de encontrar o outro presencialmente, o que tem causado grande preocupação entre pesquisadores e profissionais da saúde”, salienta.

  • 2

    Fique longe de quem drena a sua energia. Não se force a manter uma amizade que é unilateral –
    Sabe aquela pessoa amiga que só fala dela e, quando enfim chega a sua vez de desabafar, ela mal presta atenção? Ou que reclama de tudo o tempo todo? Pois é, amizades do tipo colaboram para minar o ânimo de quem está em volta — ou seja, se você juntou o pouquinho de “bateria social” que restava para vê-la, vai sair do encontro no negativo. Essa drenagem de energia emocional pode intensificar a sensação de exaustão. Por isso, Elisa Kozasa, neurocientista do Instituto do Cérebro do Hospital Israelita Albert Einstein, alerta para a importância de avaliar com quem nos relacionamos. Ela comenta que pais e mães de adolescentes estão sempre preocupados com amigos e colegas dos filhos, avaliando se são más influências ou não, mas, segundo a neurocientista, essa preocupação deve se voltar também aos adultos. “Vale a pena se perguntar: ‘Com quem estou saindo? São pessoas que realmente me fazem bem? Que me incentivam a ter hábitos mais saudáveis? São boas pessoas?’. É necessário que cada um faça uma reflexão sobre o que é o bem viver para si e, a partir daí, selecione melhor as companhias”, diz. Outra dica da profissional é ter amigos com valores similares aos seus. Jussara Cristina Barboza Tortella lembra uma das lições de Aristóteles. Para o filósofo grego, uma amizade verdadeira necessita de “uma boa vontade recíproca e reconhecida”. A pedagoga explica que não adianta se forçar para manter uma relação unilateral, que só é interessante para uma das partes. “Precisamos nos preservar e pensar no nosso bem-estar emocional”, analisa.

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    Deite, tome um banho relaxante, converse com uma criança –
    Dona e proprietária da Associação dos Sem Carisma, a escritora e podcaster Camila Fremder é famosa por perder a alma carismática e ficar com a energia baixa, lá nos dedinhos dos pés, após um dia intenso de trabalho com trocas profissionais excessivas. Uma das dicas que ela dá para quem está com a “bateria social” zerada é um bom descanso na horizontal, seja na cama, no sofá ou no chão mesmo. “Quando o meu carisma é esgotado, eu preciso deitar porque tenho uma teoria de que ele sobe pelo pé. Às vezes, até levanto as pernas para ver se o carisma vem descendo”, divide. Tomar um banho na quietude também é uma das estratégias de Fremder. “O abafado e o som do chuveiro ajudam demais. O que mais me exaure é o burburinho dos ambientes. Então, preciso muito ficar quieta, num lugar onde não tenham pessoas falando ao meu lado.” Mais uma indicação da autora é falar com o filho, Arthur, 7, que tem o poder de reenergizá-la. “Quando ele chega com os probleminhas da escola, acho tudo tão fofo e bonitinho que reativa o meu carisma na hora”, menciona. A última ideia prática dela para trocar a pilha da socialização é encontrar os amigos, não qualquer um, mas os de fé. “Meus amigos próximos, meus cinco amigos, conseguem me revigorar, mesmo exausta, depois de falar, apresentar, trabalhar.”

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    Organize sua agenda a partir das atividades essenciais ao bem-estar –
    A neurocientista Elisa Kozasa recomenda fazer o que ela chama de agenda invertida. Sabe do que se trata a técnica? Nada mais é do que começar o planejamento semanal, ou diário, reservando tempo para atividades essenciais ao bem-estar, como dormir, se alimentar adequadamente e ter momentos pessoais prazerosos. Dessa forma, vamos acostumando a ter momentos ou tarefas inegociáveis com nós mesmos — e, de quebra, melhoramos o ânimo e o humor. “Geralmente, as pessoas iniciam o preenchimento da agenda com os compromissos de trabalho e as funções domésticas, como levar e buscar os filhos na escola e no balé. Não faça isso. Reserve, antes de tudo, os seus horários de sono”, ensina. Kozasa aponta que a primeira coisa que precisa ser preservada na vida de alguém, esteja essa pessoa esgotada ou não, é o descanso noturno. “O sono tem uma implicação tremenda na saúde física e na saúde mental, é uma coisa extremamente importante. Você precisa dormir bem, e sem Zolpidem [remédio utilizado para insônia].” Jussara Cristina Barboza Tortella aconselha ainda exercícios de atenção plena e respiração consciente.

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    Reconheça quando está emocionalmente exausto –
    No rol das dicas de bem-estar ele sempre está lá: o autoconhecimento. Aqui, não poderia ser diferente, conforme as especialistas consultadas. De acordo com Tortella, para recarregar a energia social é necessário reconhecer quando estamos emocionalmente exaustos. “Identificar as emoções é fundamental. A escrita pode ajudar muito, eu sempre indico. Escrever sobre o que sentimos proporciona instantes de reflexão e consciência”, assinala. Entender o que está por trás do cansaço facilita a escolha por decisões mais saudáveis, permitindo saber com clareza quais relações são benéficas e quais podem estar nos sobrecarregando. “Esse cansaço social, muitas vezes, se dá pelo excesso de contato no trabalho, na academia. Em qualquer lugar que você vá, há um acúmulo de pessoas.” A assessora pedagógica também orienta a mudar os locais de encontros com a turma. Em vez de uma noite em um barzinho barulhento, com movimentação de garçons e clientes, pode ser que um café à tarde ou uma caminhada no parque seja mais proveitoso — e socialmente menos desgastante.

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