Livros antirracistas para ter à mão
Escritores e pensadores negros consultados por Gama indicam as leituras antirracistas que não podem faltar
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“A Cor da Ternura” (1990), de Geni Guimarães
Indicação de Conceição Evaristo, escritora
“Geni consegue, com uma sensibilidade muito grande, produzir uma narrativa que traz uma temática tão brutal e tão triste. Através da linguagem poética, ela consegue fazer uma discussão que toca profundamente a pessoa que tiver lendo este livro. É uma narrativa em que a personagem principal recebe o nome de Geni, e nós podemos acompanhar a trajetória dessa menina até a vida adulta, e ela passando por situações de racismo. Quem não conseguir acessar o livro ‘A cor da Ternura’, editado pela FTD, tem uma outra alternativa: comprar ‘Leite do Peito’, pela editora Mazza. É o mesmo livro, a única diferença é que ‘Leite do Peito’ traz duas ou três narrativas a mais que não estão em ‘A Cor da Ternura’.”
Publicado pela editora FTD Educação
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2
“Memórias da Plantação: Episódios de Racismo Cotidiano” (2019), de Grada Kilomba
Indicação de Thiago Amparo, advogado e professor de direito da FGV
“Kilomba traz em seu livro vozes negras e seus relatos de racismo cotidiano. Por meio desses relatos cotidianos, Grada evidencia como políticas racistas estão engendradas no dia a dia, na forma como pessoas negras navegam o mundo e seus espaços brancos. Kilomba é uma artista múltipla: além da escrita, ela é artista visual. Questiona os limites que são impostos a pessoas negras a serem quem elas são.”
Publicado pela editora Cobogó
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3
“Crítica da Razão Negra” (2013), de Achille Mbembe
Indicação de Lubi Prates, poeta, tradutora, editora, curadora de literatura e psicóloga
“Geralmente, quando se fala sobre racismo, os olhos se voltam imediatamente para as pessoas negras presentes, quando, na verdade, o racismo é uma problemática branca e precisa ser discutido e combatido sobretudo por elas. Indico este livro porque ele foi um marco no meu desenvolvimento como pessoa e como intelectual, principalmente por trazer, de maneira muito potente, essa ideia que eu mencionei.”
Publicado pela editora N-1 Edições
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4
“Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada” (1960), de Carolina Maria de Jesus
Indicação de Renata Felinto, artista, professora e pesquisadora
“O interessante do diário de Carolina Maria de Jesus é que ele não é um diário ensimesmado no indivíduo que é essa mulher; e, sim, na relação dessa mulher com a sociedade e, consequentemente, com todo o machismo e o racismo que engendram essa sociedade na qual ela tem que lutar pela sobrevivência na favela, sendo mãe sozinha de três crianças muito pequenas. O livro se inicia com o relato do aniversário da sua filha Vera Eunice, a mais nova, e que queria um simples par de sapatos, mas que a mãe não podia comprar, porque inclusive neste dia ela não tinha alimento para dar às crianças; e finaliza no primeiro dia do ano de 1960, com uma frase muito curta: ‘Levantei às 5h e fui carregar água’. Ela consegue também traçar uma análise política sobre a questão da fome. A fome é companheira de Carolina Maria de Jesus durante toda a obra, assim como os episódios de racismo e de humilhação. Mas também tem muito sonho nessa obra. Tem sonho, altivez e tem já a expressão do orgulho de ser uma pessoa preta, porque há um momento em que ela fala que se pudesse escolher de novo como nasceria, nasceria preta novamente. Nós pessoas pretas temos orgulho do que somos, mesmo com todas as tentativas de nos colocarem num lugar de inferioridade. A obra de Carolina Maria de Jesus serve para que quem ainda não acredita que existe racismo tenha em mente que hoje há mulheres acordando às 5h da manhã para buscar água, assim como havia mulheres nessa condição no dia primeiro de janeiro de 1960. Mais de 50 anos depois, há pessoas pretas no brasil, há mães sozinhas no brasil, vivendo as mesmas condições que Carolina Maria de Jesus enfrentou.”
Publicado pela editora Ática
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5
“O Black Power de Akin” (2020), de Kiusam de Oliveira
Indicação de Djamila Ribeiro, filósofa e escritora
“Considerada uma das dez escritoras mais importantes para formação infantil pela ONU, destaque na Feira do Livro de Bolonha, uma das mais conceituadas para literatura infanto-juvenil, Kiusam de Oliveira é uma brasileira visionária, brilhante com as palavras e responsável pela construção da auto-estima de crianças no país, a qual sabemos ser todo tempo colocada em xeque pelo sistema que nos desumaniza. Com seu trabalho, Kiusam também é fundamental para a disseminação da mitologia de tradições africanas, algo urgente na formação e desenvolvimento de relações sociais pautadas na pluralidade.”
Publicado pela editora De Cultura
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6
“Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo” (1945), de Virginia Leone Bicudo
Indicação de Joice Berth, arquiteta e escritora
“Este livro é a primeira tese sobre relações raciais no Brasil. Escrito em 1945 pela socióloga e também pioneira na psicanálise brasileira Virgínia Leone Bicudo, o livro traça um panorama de como a discriminação racial constrói relações precárias entre os negros, resultando em rejeições e disputas dentro desse grupo social que se molda a partir do racismo e de suas práticas. Foi a dissertação de mestrado da autora, em 1945, mas continua muito atual e traz informações históricas, como a formação da Frente Negra Brasileira, primeiro partido político negro, entre outros fatos marcantes da história da negritude no país.”
Publicado pela editora Sociologia e Política
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7
“O Feminismo é para Todo Mundo: Políticas Arrebatadoras” (2000), de bell hooks
Indicação de Renata Felinto, artista, professora e pesquisadora
“Neste livro, bell hooks provoca a intersecção entre as lutas feministas e a luta contra o racismo. É um livro que parte de uma percepção de que não haveria avanço se as escritas sobre feminismo fossem direcionadas apenas a um pequeno grupo de entendidas e entendidos dentro das universidades. Era necessário traduzir essa discussão para quem quisesse saber sobre ela. A partir do afeto, da sinceridade e de um compromisso teórico de traduzir o pensamento das mulheres negras, essa obra demonstra como o feminismo é um movimento de diferentes mulheres ao redor do mundo, que busca pensar na união entre mulheres, numa consciência crítica sobre o que é ser mulher, sobre a relação com o corpo e com o ser-estar dentro desse corpo. Também trata da luta de classes dentro do próprio movimento feminista, que é um ponto delicado, na medida em que feministas brancas de classe média alta e feministas pretas empobrecidas estão em pólos opostos. Aí ela vai trazer a questão das mulheres no mercado de trabalho e da diferença das mulheres no mercado de trabalho, que é muito importante de ser pontuada neste momento de pandemia, a partir do incidente que ocorreu anteontem com o menino Miguel. Quando nós falamos das relações de trabalho entre mulheres pretas e brancas, existe aí um fosso que precisa ser discutido e existe a realidade que estamos vivendo neste momento na qual mulheres brancas podem gozar do isolamento, mas obrigam as suas empregadas a irem trabalhar para que as sirvam. Então, temos aí uma crueldade histórica fundamentada nas diferenças de cor e, portanto, nos privilégios que foram reunidos pelas mulheres brancas a partir de uma opressão exercida também pelos homens brancos. Ela vai falar um pouco também sobre o amor como uma possibilidade de revisão das relações humanas. Não um amor cristão, de dar a outra face, mas o amor de entender a humanidade do outro. Então, quando nós falamos sobre racismo na sociedade hoje é muito importante ter esse amor, que podemos traduzir também como uma empatia quando uma criança preta morre, como o Miguel morreu, desassistido. Enquanto a pessoa branca de fato não fizer o exercício de identificar que ela precisa se mobilizar em ações concretas para que nós tenhamos o tal do mundo melhor que dizemos que queremos ter, nós continuaremos a ter racismo. O combate ao racismo não é papel das pessoas pretas, mas da sociedade como um todo e não basta colocar um quadrado preto no seu feed. É preciso agir junto da população preta.”
Publicado pela editora Rosa dos Tempos