As cores e o misticismo de Isaac Silva
O estilista baiano que já vestiu Taís Araújo e Djalmila Ribeiro e colaborou com a Havaianas revela um pouco de seu universo pessoal em dez objetos
Os objetos do estilista Isaac Silva, 31, contam sobre seu amor pelas cores, pelo misticismo, pelas religiões afro-brasileiras e pelo seu ofício.
Nascido em Barreiras (BA), ele passou parte da juventude em Salvador e há dez anos vive em São Paulo transitando pelo mundo da moda. A marca própria nasceu em 2015, e de lá para cá, Silva já desfilou na São Paulo Fashion Week e vestiu gente como Taís Araújo, Camila Pitanga, Gaby Amarantos, Djamila Ribeiro e Liniker.
Ele é conhecido pelas roupas fluidas de modelagem democrática que vestem corpos diversos e não têm distinção de gênero. Suas coleções têm nomes como “Panterona” (esta inspirado no movimento antirrascista dos Panteras Negras), “Cores da Bahia”, “Boca da Mata”, “Flores para Yemanjá”. “Eu gosto muito da mata, é um lugar que une a cultura afro e a indígena”, diz.
A frase “Acredite no seu axé”, seu lema pessoal, funcionou como estímulo para encarar a pandemia. “Achei que ia ter que demitir colaboradores, que a marca ia acabar. Mas aconteceu o contrário”, conta. O axé foi forte, de fato: Silva abriu uma segunda loja em São Paulo, em Pinheiros; não desistiu de aportar em outros estados; e fez a maior colaboração de sua carreira, com a Havaianas, que levou seu nome à Europa.
A Gama, ele selecionou alguns de seus objetos pessoais que contam a sua história, pertences que remetem ao seu universo. “Como eu moro só, os objetos são meus amigos. Minha casa é tipo o castelo de ‘A Bela e a Fera’, onde as coisas falam, sabe?”
1 | Troféu-chinelo
“Essa colaboração com a Havaianas me fez acreditar ainda mais no meu trabalho. Nesse caos da pandemia, foi incrível poder criar com uma das maiores marcas nacionais, reconhecida internacionalmente. Deixo esses chinelos em casa como um troféu, mesmo. E fico feliz que eles tenham um preço acessível, então muito mais gente pode comprar.”
2 | Oráculo pessoal
“Eu tenho esse tarô desde os 13 anos, quando tive uma fase bruxa; acho que todo jovem brasileiro tem essa fase Wicca. É o tarô que eu tiro no dia a dia, para ajudar a tomar decisões. Sempre que posso eu recorro a ele, fica na minha sala.”
3 | Livro de cabeceira
“Eu sempre gostei muito de ler. Como eu sou uma pessoa muito afeminada, muito do universo feminino, na época de escola eu sofria muito bullying. E um jeito de me proteger dessa violência era a leitura, então eu ficava em casa lendo, revista, gibi, livro, tudo. Quando fui morar em Salvador, do lado da escola tinha uma biblioteca gigantesca, e lá eu vi esse livro da Carolina Maria de Jesus. Ele abriu minha cabeça para o Brasil, para a desigualdade social. Ele representa muita coisa. E esse é um original do primeiro lançamento. Já li várias vezes, ele está sempre presente na minha vida.”
4 | Caixa dos desejos
“Quando eu quero alguma coisa, escrevo num papel e coloco dentro dessa caixinha de música. Quando acontece, eu vou lá, tiro, rasgo e agradeço. Às vezes eu vou lá checar o que tem, olho e penso ‘ah, isso aqui o universo ainda precisa resolver’ (risos). E a maquininha de costura me lembra meu trabalho.”
5 | R.I.P. Elza
“É um disco dos anos 1970, ‘Nos Braços do Samba’, foi um dos momentos auge da Elza Soares. Como eu a vesti durante muito tempo bem no início da minha carreira, eu tenho uma ligação muito forte com ela. E eu amo a roupa que ela está usando aí, macacão, camiseta, meio ‘hippie-chique’. Eu deixo esse disco pela casa como um quadro. Eu queria ter estado junto com ela nessa época, mas eu nem era nascida.”
6 | Amor por azulejos
“Eu acho lindos esses azulejos do banheiro da minha casa atual. Eu amo azulejo, eu imagino uma casa cheia de azulejos temáticos, adoro cozinha antiga com aqueles de galinha, de fruta, de planta. Eu não sei a história desses, mas acho que são bem famosos, porque já vi outros iguais em apartamentos que visitei.”
7 | Companheira de trabalho
“Essa foi minha primeira máquina de costura profissional, e é a que eu uso no dia a dia. Quando decidi sair do trabalho de carteira assinada, usei minha rescisão para comprá-la e aí comecei a fazer as primeiras peças da marca. Já são sete anos juntas costurando roupas lindas cheinhas de boas energias.”
8 | Viva Cosme e Damião!
“Eu nasci em 27 de setembro, dia de Cosme e Damião, os santos gêmeos na religiosidade católica e os ibejis na religiosidade afro. Eu tenho esse altar na loja e em casa, são meus protetores, confio muito no axé dos ibegis. Esse quadro é da artista e estilista Adriana Meira.”
9 | Amuleto no pulso
“Eu uso muitos acessórios, colares, pulseiras, anéis; são complementos para a roupa. A figa está no logo da minha marca, símbolo de resistência e proteção. Essa pulseira foi feita pelos artistas Márcio e César, da marca MKWC. Ela é de resina, polida manualmente, e tem uma energia muito significativa.”
10 | Iemanjá ressignificada
“Essa imagem clássica de Iemanjá ficava em uma pousada que minha tia Jacira tinha na minha cidade natal na década de 1970. Há uns dez anos, ela me deu de presente. Aí, encontrei uma artista que ressignifica santos e orixás e pedi para ela fazer um trabalho em cima do quadro. Ele é um amuleto e uma conexão com a minha infância e com a minha tia, que faleceu durante a pandemia.”