Livros para pensar o presente — Gama Revista

Cultura

Livros para pensar o presente

Alexandre-Louis-Marie Charpentier / Wikicommons

Para quem quer se perder em um tema de destaque na sociedade, seja o racismo ou o meio ambiente, Gama separou uma lista de lançamentos que valem a pena ter em casa

Leonardo Neiva 27 de Julho de 2021

Se 2021 tem sido um ano ótimo para a literatura, também é para livros teóricos e de não-ficção sobre os temas mais variados. Aqui no Brasil, temas e causas sociais como racismo e feminismo têm dividido a atenção nas prateleiras, físicas ou virtuais, com assuntos de grande relevância no mundo, como a proteção ao meio ambiente, a alimentação e as novas tecnologias.

Para quem quer se perder e cansar de pensar sobre esses e outros temas, Gama separou uma pequena lista de livros lançados nestes primeiros sete meses do ano, abordando assuntos que estão em pauta hoje na sociedade.

Divulgação / Todavia / Fósforo

Afropessimismos

Hoje o racismo e a violência contra pessoas negras ainda são características indissociáveis da nossa sociedade, e a principal luta é para superá-los. Mas e se esse for um ideal inalcançável? Pode ser um pensamento desalentador, mas é sobre essa premissa que se lança Frank B. Wildersson, professor de estudos afro-americanos da Universidade da Califórnia, em “Afropessimismo” (Todavia, 2021). Criado por ele, o movimento intelectual de mesmo nome considera que a subjugação do negro, iniciada na escravidão, é o mecanismo que alimenta a civilização, e por isso é hoje inseparável dela.

Para entender melhor o que isso significa, vale a pena dar uma olhada no conto de ficção especulativa “O Cometa”, do sociólogo americano W.E.B Du Bois, lançado também este ano pela Fósforo junto com o ensaio “O Fim da Supremacia Branca”, da intelectual Saidiya Hartman. A história, que conta a jornada de um homem negro e uma mulher branca, únicos dois sobreviventes de uma Nova York pós-apocalipse, é considerada um exemplo precoce de literatura afropessimista.

Divulgação / Intrínseca / Paralela / Companhia das Letras

O futuro da Terra

Como o meio ambiente e a natureza vão sobreviver ao ser humano é uma questão pisada e repisada, mas talvez nunca tenha parecido tão urgente quanto agora. Três livros lançados este anos buscaram jogar uma luz sobre uma questão cheia de possíveis soluções, mas ainda longe de ser resolvida. Em “Sob um Céu Branco” (Intrínseca, 2021), a jornalista vencedora do Pulitzer Elizabeth Kolbert entrevista biólogos, engenheiros genéticos e outros especialistas para entender se é possível modificar a natureza a ponto de salvar a ela e a nós mesmos. O escritor e especialista em design para sustentabilidade André Carvalhal, por seu lado, busca ações concretas e imediatas para começarmos hoje a proteger o futuro de amanhã em “Como Salvar o Futuro” (Paralela, 2021). E, por fim, até mesmo Bill Gates deu seus pitacos sobre o tema com “Como Evitar um Desastre Climático” (Companhia das Letras, 2021).

Divulgação / Bazar do Tempo / Oficina Raquel / Ubu

Ser mulher

O feminismo e as diversas facetas do que significa ser mulher e lutar por direitos em um mundo ainda machista foram assuntos que apareceram inúmeras vezes na literatura em 2021. Para citar algumas delas, vale ir atrás de “A Invenção das Mulheres” (Bazar do Tempo, 2021), da socióloga nigeriana Oyèrónké Oy?wùmí. O livro busca maneiras de entender o papel social da mulher através de referências africanas, com destaque para a cultura iorubá. “Cidade Feminista” (Oficina Raquel, 2021), da geógrafa canadense Leslie Kern, reflete sobre a vida urbana feminina e o redesenho e redistribuição de um espaço tradicionalmente construído por e para homens. E, para quem quer entrar mais a fundo no pensamento feminista, conhecer suas bases pode ser tarefa essencial. “Sexo, Gênero e Sexualidades” (Ubu, 2021), da filósofa francesa Elsa Dorlin, retoma as filosofias feministas dos últimos cinquenta anos e as combina a conceitos inovadores do pensamento atual, ajudando a situar os iniciantes em meio a um mar teórico bravio.

Divulgação / Todavia

As revoluções da comida

Quando você dá uma bela dentada num hambúrguer da sua rede de fast-food favorita, faz ideia do que está colocando na boca? Sabe os processos pelos quais a indústria alimentícia precisou passar nos últimos 50 anos para que aquele pão acompanhado de carne e batatas fritas chegasse à sua mesa? A resposta provavelmente é não para a maioria das pessoas. Mas, para quem quer se inteirar sobre o assunto, é interessante buscar nas prateleiras o livro “As Revoluções da Comida” (Todavia, 2021), do jornalista especializado em gastronomia Rafael Tonon. Na obra, ele explora o quanto a tecnologia, a criação de conglomerados alimentícios mundiais e a ascensão dos chefs como fenômeno pop influenciaram e devem continuar influenciando a forma como comemos hoje.

Divulgação / Ubu / Intrínseca

Estamos sendo vigiados

Toda evolução ou nova tecnologia chega para o bem, mas também traz no estômago, como um cavalo de Troia, uma série de problemas modernos e complexos. Em “A Era do Capitalismo de Vigilância” (Intrínseca, 2021), a professora de Harvard Shoshana Zuboff aborda um dos mais inquietantes atualmente. O que ela chama de capitalismo de vigilância inclui as tentativas, por meio de inúmeros tipos de tecnologias, de analisar, prever e até modificar nosso comportamento com fins financeiros e mercadológicos — questão que, ela argumenta, deve marcar a vivência do século 21. Já “Políticas da Imagem” (Ubu, 2021) explora, em seis ensaios, o que pensa a artista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP Giselle Beiguelman sobre como as imagens norteiam as relações sociais e os conflitos num ecossistema de vigilância digital que a autora chama de dadosfera.

Divulgação / Paz e Terra

Ah, a leitura

Sinônimo de educação no Brasil, Paulo Freire traça em “Alfabetização” (Paz e Terra, 2021) as bases para o que considera uma leitura do mundo. Em parceria com o teórico crítico Donaldo Macedo, o educador parte de sua experiência pedagógica em Guiné-Bissau, onde começou a construir seu modelo de alfabetização de adultos, para fazer uma exploração da leitura em suas várias dimensões, com o objetivo de auxiliar o ensino. Como em seu conceito de pedagogia crítica, o autor desenvolve aquele que considera um ensino da leitura como ferramenta de libertação dos oprimidos e tomada coletiva de uma consciência social. Essa nova edição vale para os aficionados por educação e também para quem quer entender o pensamento de um dos principais educadores brasileiros.

Divulgação / Zahar

A era dos muros

Talvez tenhamos hoje a impressão de que nunca antes falamos tanto sobre muros — em parte devido à retórica do ex-presidente americano Donald Trump. Em seu “A Era dos Muros” (Zahar, 2021), porém, o jornalista e escritor britânico Tim Marshall, especialista na cobertura de conflitos estrangeiros, mostra que o assunto não é recente. Na verdade, vem de milênios atrás. E é a partir dessa longa história que Marshall explora os milhares de quilômetros de muros e cercas que vêm sendo construídos ao longo do século 21 — sejam muros físicos, digitais ou mesmo culturais. Numa época em que a migração forçada é uma enorme realidade e o número de refugiados continua a crescer, discutir as barreiras que nos dividem, do que são formadas e como elas devem moldar as relações geopolíticas nos próximos anos parece não só uma ação necessária, mas essencial.

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