Jarbas Homem de Mello, Jucyléia Machado e Claudia Lima falam sobre etarismo — Gama Revista
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Isabela Durão

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Depoimento

O etarismo em diferentes idades e ambientes

Em depoimento a Gama, pessoas de diversas áreas de atuação, como dançarinos, professores, cozinheiros, criadores de conteúdo e jornalistas, relatam situações de preconceito etário no dia a dia

Emilly Gondim e Ana Elisa Faria 24 de Setembro de 2023

O etarismo em diferentes idades e ambientes

Emilly Gondim e Ana Elisa Faria 24 de Setembro de 2023
Isabela Durão

Em depoimento a Gama, pessoas de diversas áreas de atuação, como dançarinos, professores, cozinheiros, criadores de conteúdo e jornalistas, relatam situações de preconceito etário no dia a dia

A discriminação etária está por todos os lugares e acontece cotidianamente, às vezes de maneira perversa e intencional, mas em muitas ocasiões o preconceito por conta da idade aparece em falas corriqueiras, talvez sem intenção, por ignorância ou em forma de piada. Para pensar sobre questões relacionadas ao etarismo, Gama convidou pessoas de diversas áreas e várias idades que relataram preconceitos sofridos no dia a dia.

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    Reprodução/Instagram

    “O mundo que agora é dos jovens, em breve será das idades mais maduras”

    Jarbas Homem de Mello, 54, ator, cantor e dançarino comenta sobre paternidade e o etarismo sofrido pela esposa, a atriz Cláudia Raia, durante a gravidez do filho Luca, aos 55 anos

    “O etarismo recai mais agressivamente sobre as mulheres. A Cláudia [Raia, atriz] foi muito questionada ao ter um filho com 55 anos — a mim, ninguém perguntou. Engraçado que para o homem é normal ter filho mais velho, aos 60, 70. Outros artistas mesmo tiveram filhos recentemente e ninguém comentou, como o Pedro Bial e o Serginho Groisman. Mas para a Cláudia tinha muita crueldade, falavam sobre a idade que ela vai ter conforme o nosso filho crescer. Eu acredito que ser pai na maturidade dá um outro entendimento sobre a vida. Você já fez escolhas, pelos menos aquelas que ditam a sua personalidade e o seu caráter. Ter um filho mais novo, aos 20, aos 30, é um outro desafio, passa tanta coisa na cabeça; naturalmente, há uma ansiedade maior. Os 50 te dão mais calmaria, não que eu saiba tudo ou tenha vivido tudo, mas a maturidade dá o entendimento que você ganha tempo quando você está presente naquele momento. Outro pensamento que tenho é que conforme envelhecemos é óbvio que a morte se aproxima. Claro, eu trabalho para viver 120 anos, mas não deixo de perceber que a morte está mais perto. Por isso, tenho entendido o meu próprio tempo, o que eu vou fazer com ele, com quem vou dividir e que assuntos quero tratar. Não quero gastar meu tempo com coisas que não me dão prazer, felicidade ou conhecimento. Por já ter vivido 50 anos, sei diferenciar o que eu quero ou não, e isso dá uma paz maior ao criar uma criança. Quando minha esposa foi atacada ao anunciar a gravidez do nosso filho [Luca, agora com sete meses], senti muita tristeza pela raça humana, pela crueldade das pessoas. Mas entendemos que a gravidez dela pegava num lugar sensível para as mulheres, principalmente as mais velhas, que são deixadas de lado pela sociedade ao chegarem na menopausa. Tem um termo da medicina que é falência ovariana, significa a falência do aparelho reprodutivo da mulher, o que faz pensar que a mulher só é útil à sociedade enquanto consegue procriar. Depois, a mulher fica fadada a ficar em casa, a não ter planos de longo prazo, e tudo isso é colocado na cabeça das mulheres desde o nascimento. Então, quando uma mulher engravida aos 55 anos, ela esfrega na cara da sociedade que não morreu. Mulheres podem ter sonhos a longo prazo, muito além de filhos, elas também podem fazer uma viagem, conhecer o mundo, mudar de emprego, qualquer coisa, as mulheres podem sonhar muito além dos 50. Percebemos também que as críticas não eram sobre a maternidade, e sim a uma mulher que pensa que pode tudo, enquanto a sociedade está o tempo todo dizendo que ela não pode nada. Ou seja, pensamentos concebidos para as mulheres pela sociedade machista e patriarcal. Mas o mundo está envelhecendo, nossa saúde, nossa alimentação e a vida em geral tem melhorado, e, por consequência, a expectativa de vida aumentou. Assunto como envelhecer e etarismo precisam ser colocados em pauta. Na Europa e no Japão, a taxa de natalidade caiu. O mundo que agora é dos jovens, em breve será das idades mais maduras.”

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    Divulgação/Band

    “Não desistir é o que prolonga a vida”

    Jucyléia Machado, 57, semifinalista da décima edição do programa “Masterchef” fala sobre o preconceito ao tentar realizar sonhos

    “A primeira vez que senti o preconceito gritar mais alto foi quando contei para as pessoas que iria me inscrever no ‘Masterchef’. Naquele momento, esperava apoio, mas ouvi: ‘Você não tem mais idade para isso’. Inclusive, essa frase é muito comum. E eu sempre me questionei: ‘Como assim?’. Sei que o tempo está passando e exatamente por isso eu teria de ser mais forte. A maturidade me faz ver que temos mais comprometimento e o lado emocional mais lapidado, justamente por conta do tempo, e isso é muito bom. Naquela época, percebi que existia um certo preconceito, foi quando compreendi melhor sobre o tal etarismo. A sensação, a princípio, foi de desânimo e tristeza. Achei que não conseguiria. Eu estava com 54 anos. Mas era um sonho pessoal de muito tempo e eu não desistiria, porém, sabia que seria mais difícil do que imaginava — lidar com os comentários me deixava, de certa forma, enfraquecida. O que me deu forças foi poder mostrar para todos que não era impossível. Se eu conseguisse participar do programa, possibilitaria que tantas pessoas desacreditadas e desanimadas também pudessem correr atrás do próprio sonho, independentemente de qual fosse. Não desistir é o que prolonga a vida. Durante o programa, senti que alguns participantes colocaram o fato de eu ser mãe e avó como algo negativo. Porém, esses papéis eram reais. Eu sou mãe desde os 24 anos. Avó com muito orgulho. Fui professora por muito tempo, desde os 18, então, é natural eu agir como uma mãezona. Envelhecer requer planejamento, assim como tudo na vida. Tenho sempre a mente ocupada com atividades constantes, tento fugir da rotina, cuido da alimentação, faço exercícios físicos, faço contas para gastar dentro das minhas possibilidades e planejo o meu futuro para ter um envelhecimento o mais saudável possível em todos os sentidos. Não se acanhe e erga a cabeça, pois temos a mesma vontade de viver de quando tínhamos 20 anos — ou até mais por termos envelhecido.”

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    Arquivo pessoal

    “Tenho 53 anos, mas continuo sendo a mesma pessoa que sempre fui”

    Claudia Lima, 53, jornalista, criadora de conteúdo, colunista do canal Sua Idade, da Vogue Brasil, e editora da newsletter Yabás, aborda questões etárias no mercado de trabalho

    “Acho importante falar sobre o etarismo no mercado de trabalho porque passou da hora das empresas abrirem os olhos para os profissionais de ‘50 mais’ que estão no mercado e que não vão parar de trabalhar tão cedo. Então, é interessante as organizações pensarem em como vão reter esses trabalhadores e, também, de que forma vão absorver outros profissionais, como os que estão chegando aos 40 anos. Tenho 53 anos, mas continuo sendo a mesma pessoa que sempre fui, não penso em parar de trabalhar tão cedo. Antigamente, a pessoa fazia 60 anos e se aposentava, hoje está todo mundo no mercado de trabalho, trabalhando, fazendo coisas, criando coisas novas. Estamos vivendo mais e mais ativamente e, além de querermos trabalhar, precisamos trabalhar por mais tempo. Fora que a troca geracional é muito boa para todos. Quem é mais maduro pode trocar com pessoas mais novas, aprender com elas, e vice-versa. Sempre há o que aprender, com todo mundo, e é fundamental para dar um refresh na mente e na vida, além de deixar os lugares mais diversos etariamente. Eu, por exemplo, faço parte de um grupo de WhatsApp chamado Herdeiras de Gloria Maria, com jornalistas negras de várias idades, talvez eu seja a mais velha ali, mas há trocas sensacionais, compartilhamos muita coisa. Falando em negritude e mercado, é preciso falar sobre a invisibilização das mulheres negras nesse tema. Se as mulheres brancas acham que são invisibilizadas depois dos 50, as negras então, ninguém toca no assunto. Nós, as asiáticas e as indígenas sofremos muito mais. Na vida pessoal, eu não sinto tanto o etarismo, não sei se por conta do jornalismo, que é uma área em que convivemos com bastante gente de todas as idades — uma das minhas grandes amigas, por exemplo, tem 28 anos e eu conheci no trabalho —, ou se por interesses meus que seguem os mesmos. Gosto das mesmas coisas que gostava antes, adoro rap, adoro o hip-hop, então eu saio para dançar com amigas mais jovens e está tudo certo.”

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    Arquivo pessoal

    “Podemos continuar bonitas em qualquer idade; a menopausa é um recomeço, e não o fim”

    Drica Divina, 53, influencer e maquiadora de pele madura com mais de 500 mil seguidores, aborda a beleza e o tesão de viver na velhice

    “A primeira vez que sofri um ataque etarista, que partiu de outras mulheres, inclusive, foi quando iniciei as minhas redes sociais falando de beleza madura. Eu tinha uns 49 anos, e aquilo me surpreendeu. Senti muita indignação, tristeza e surpresa, mas serviu para abrir o meu olho para o fato de que a gente ainda vive num mundo muito machista, mais do que isso, ainda vivemos num mundo onde as mulheres são machistas. Os ataques me fizeram refletir sobre a minha importância como criadora de conteúdo, uma vez que eu tenho esse papel de desconstruir e desmistificar o envelhecimento, principalmente o da mulher, em um mundo onde ainda a juventude é muito valorizada. Comecei nas redes sociais com o intuito de desconstruir a imagem de que o envelhecimento é ruim, e promover um ambiente em que a mulher possa se inspirar, em vez de se comparar. Mostro que podemos continuar bonitas em qualquer idade, que a menopausa é um recomeço, e não o fim, que podemos buscar novos relacionamentos e metas na vida. A maturidade traz muitos benefícios, mais autoconfiança e autoconhecimento, é isso que eu tento mostrar para o meu público. E isso é o mais legal do envelhecer: conhecer uma nova beleza e uma paixão pela vida. Nosso tempo está passando e valorizamos isso com menos ansiedade. Isso é tão bonito, é um tesão. Há libido em viver. E a gente só passa a ter consciência do etarismo quando alguém fala que você está ridícula naquela roupa, que não pode usar batom vermelho, que mulher madura tem que ficar em casa, que tem que se aposentar, que a vida acabou com a menopausa, que a vida sexual acabou com a menopausa, que perdemos o brilho, que perdemos a nossa identidade, o nosso valor. E falam até mesmo que perdemos nossa importância por conta da idade. Então, passei a lidar com a dor das mensagens de haters como inspiração para os meus vídeos. Fazer do limão uma limonada.”

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    Arquivo pessoal

    “São situações que dão um certo choque na gente porque é uma exclusão perversa”

    Milton Júlio de Carvalho Filho, 59, antropólogo e professor da Universidade Federal da Bahia, cita o etarismo em situações cotidianas, como na paquera e na academia

    “Eu não tinha noção de algumas questões de preconceito em relação à idade. A gente vai tendo conforme vive as realidades. Embora eu não seja negro, tenho bastante noção do preconceito racial porque tenho filhos negros, também conheço de perto o preconceito ligado à orientação sexual porque sou gay. E, agora, estou com 59 anos, faço 60 em fevereiro de 2024, e tenho sentido mais o etarismo, às vezes como ataque, mas na maioria das ocasiões como um preconceito recreativo expressado em forma de ‘brincadeiras’, inclusive feitas por pessoas mais velhas também e, por vezes, na frente das crianças, que reproduzem essas falas. Também tenho visto o preconceito etário nas paqueras. Acabei de me separar, depois de 11 anos de relacionamento — fui casado com um homem 26 anos mais novo que eu, então já tinha vivido o preconceito da diferença de idade —, e, solteiro, sinto que as pessoas me consideram um homem bonito, interessante, mas quando chega no tema idade, dizem coisas como: ‘Ah, se você fosse 20 anos mais novo’. É muito comum usarem o termo velho e acho que as pessoas, inclusive, muitas vezes nem percebem que estão sendo preconceituosas. Outro dia, saí com um homem de 36, estávamos com um casal espanhol e ele disse que eu parecia um cantor brasileiro, a espanhola perguntou o nome do artista e ele respondeu assim, naturalmente: ‘Ah, é uma bicha velha’. No meio gay, os homens mais velhos, da minha idade, por exemplo, acham que um companheiro da mesma faixa etária vai estabelecer muita velhice à relação, então não querem saber. Já os mais novos acham que o cara que passou dos 50 é um decrépito. Isso é bem complicado. Nada disso, no entanto, abala a minha autoestima ou a minha autoconfiança, mas dá um certo entristecimento. Outro exemplo: eu vou à academia todos os dias, e como os meus horários são muito loucos, vou me adequando dia a dia. Por isso, perguntei para uma instrutora que estava ali qual costumava ser o horário mais vazio. Ela disse: ‘Olha, das 6h às 8h, normalmente, vem a galerona, a galera que depois vai trabalhar. Das 8h às 10h, aí vem os velhos’. Situações assim dão um certo choque na gente porque é uma exclusão perversa. E é interessante pensar que, atualmente, as pessoas estão vivendo mais, se aposentando com mais idade, tendo acesso a um melhor padrão de alimentação, de bem-estar, com mais informação. No entanto, ao mesmo tempo que a gente conquista isso, parece que nas relações as coisas ficaram piores.”