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5 dicas

Como se reinventar na carreira sem mudar de profissão

Recomendações para quem quer se movimentar no trabalho aproveitando os talentos que já tem e a bagagem profissional que construiu

Flávia Mantovani 13 de Abril de 2025

Como se reinventar na carreira sem mudar de profissão

Flávia Mantovani 13 de Abril de 2025

Recomendações para quem quer se movimentar no trabalho aproveitando os talentos que já tem e a bagagem profissional que construiu

Que atire a primeira carteira de trabalho quem nunca teve vontade de largar o emprego ou mesmo a profissão, recomeçando a carreira em outra área que parece menos estressante ou mais valorizada.

Uma pesquisa divulgada na última semana em reportagem do jornal O Globo mostra que muitos brasileiros estão dando um passo concreto nesse sentido. O número de empregados formais que pediram demissão no país bateu recorde em janeiro deste ano, com 37,9% dos desligamentos feitos a pedido do trabalhador, segundo levantamento da LCA 4intelligence com base em dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). Esse percentual foi ainda maior entre profissionais com ensino superior (45%) e entre jovens de 17 a 24 anos (42%). 

Os fatores que explicam o fenômeno são muitos — do baixo índice de desemprego no país à maior preocupação do brasileiro com a saúde mental, o comportamento ético nas empresas e a flexibilidade na carga horária. Muita gente não vê mais sentido em passar horas do dia em um trabalho em que se sente explorado ou sem um senso de propósito.“O mundo organizacional cansa, às vezes é tóxico, agressivo. As pessoas querem algo que faça sentido, não querem sentir que vivem só para pagar as contas”, observa a psicóloga e coach Taly Jaya. Jaya falou mais sobre a angústia de trabalhar demais ao podcast da Gama em 2024.

Equilibrar esse ímpeto de renovação com as demandas da vida real, porém, não é simples. Dependendo da fase da carreira em que se está, uma mudança radical pode não ser o melhor caminho — e, em muitos casos, nem é o que se deseja de verdade. “Muitas vezes, o que a pessoa precisa não é mudar de profissão, mas de modelo de negócio, de modelo de relações de trabalho”, acrescenta Jaya.

“Existe essa ideia de que é preciso ir atrás do seu objetivo com cada fibra do seu ser, mas não é assim que o mundo real funciona. A gente tem contas para pagar, uma história que está em construção. É importante criar pontes com a nova carreira antes de jogar tudo para o alto”, afirma o psicólogo Gabriel Toschi de Mattos, sócio da consultoria especializada em transição de carreira e recolocação profissional Connection HR.

Em sua opinião, fazer uma movimentação que aproveite os conhecimentos que o profissional já tem é um caminho mais consistente para que essa mudança seja sustentável e sólida. “Essa é uma reflexão importante: como transferir aquilo que eu acumulei de experiências e conhecimento para outras formas de atuação”, diz.

A boa notícia é que o mercado está se tornando mais diverso e as profissões não estão mais fechadas em caixinhas tão rígidas. “Antigamente, havia poucas profissões e era tudo muito mais restrito. Hoje, as funções não estão tão definidas, expandiram-se as possibilidades de formação e as empresas estão mais abertas a essa diversidade de conhecimentos”, afirma a psicóloga e administradora Vanessa Cepellos, professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas).

Gama reuniu cinco dicas para quem quer se movimentar na carreira sem deixar de lado os talentos que já tem e a bagagem profissional que construiu.

  • 1

    Entenda o que te incomoda em seu momento profissional –
    Muitas vezes, o sentimento de insatisfação é abstrato: sabemos que algo não está bom, mas não entendemos exatamente o que. A primeira dica, então, é buscar entender quais são os fatores que geram incômodo, até para evitar cair nos mesmos problemas em uma nova função ou modalidade de trabalho.

    “Às vezes, a pessoa faz um supermovimento de mudança sem ter clareza sobre o que exatamente a está deixando insatisfeita”, alerta Vanessa Cepellos, da FGV. “É muito importante ela se perguntar o que está faltando, o que está gerando essa inquietação. É a equipe? O chefe? A empresa? O salário? A área em que está atuando? É se sentir estagnada depois de muito tempo na mesma atividade? O primeiro passo é entender isso”, completa.

    Durante esse exercício de autoconhecimento, vale lembrar que uma atividade ou um estilo de vida que traziam satisfação em outro momento da vida podem não ser mais compatíveis com o presente. Sair do automático ajuda a entender o que tem sentido para a pessoa que você é hoje. “A gente vai mudando, criando novos interesses, valores, necessidades. Alguém que entrou muito jovem em uma área pode estar em outro momento, com filhos, no qual um trabalho flexível faz mais sentido.”, diz a professora.

  • 2

    Avalie seu histórico profissional e suas habilidades –
    Tomar um rumo diferente depois de dedicar a carreira a uma mesma área de atuação pode despertar o receio de jogar fora a experiência acumulada durante anos. Mas não precisa ser assim. “Muitas competências — técnicas, comportamentais, acadêmicas — podem ser transferidas para outra atividade. Aqui, mais uma vez entra o autoconhecimento, para saber como tudo isso que ela desenvolveu pode ser útil para sua próxima atuação”, afirma Cepellos.

    Mattos, da Connection HR, recomenda fazer um “inventário do histórico profissional”. “Isso te permitirá entender as responsabilidades e atribuições que teve na carreira, as áreas pelas quais passou, os resultados que obteve, onde você entregou mais, onde você se via atuando com maior competência, onde gostava de contribuir”, diz.

    Paralelamente, ele sugere avaliar as demandas do mercado e onde há oportunidades de aportar o conhecimento e as competências que o profissional adquiriu. “Quando você faz essa reflexão, consegue ter um direcionamento mais claro e entender quais oportunidades estão mais alinhadas ao seu perfil técnico e também àquilo que você acredita que quer daqui para a frente.”

    Há muitos caminhos possíveis: mudar de área dentro da mesma empresa, mudar de empresa dentro do mesmo segmento, buscar um novo segmento que tenha sinergia com o seu, empreender com um negócio próprio ou com uma franquia, seguir carreira acadêmica, participar de conselhos empresariais ou tornar-se consultor são alguns exemplos.

  • 3

    Conecte-se com o seu propósito –
    Diante de tantas possibilidades, nem sempre sabemos para onde direcionar nossos esforços. Para descobrir, a dica de Taly Jaya é abraçar a dúvida e tentar se conectar com seu propósito — palavra desgastada, mas que, em sua opinião, deve servir como um norte para as nossas decisões. “Propósito é saber quais são os meus valores, o que eu quero trazer para o mundo, o que dá sentido à minha vida. O trabalho toma muito tempo, então, é natural que esse tempo seja investido em algo que me faça feliz, que eu sinto que estou dando alguma contribuição.”

    Segundo Jaya, muita gente toma decisões impulsivas por não se dar o tempo necessário para olhar para dentro. “Vivemos na cultura do resultado, do entretenimento, do imediatismo. Temos uma grande dificuldade de habitar a incógnita, o incômodo de não saber. Mas esse tempo de investigação e de exploração de possibilidades pode ser a grande oportunidade de dar um salto não só na carreira, mas na sua maturidade, na sua forma de se relacionar com a vida. Aprender a aguentar a angústia de se encontrar com você mesmo pode te levar a desenhar caminhos muito autênticos”, encoraja.

    Ela acrescenta algumas dicas para fazer isso na prática. “Pegue um caderninho e se faça perguntas. Tome café com pessoas que você admira ou que te inspiram, escute muitas histórias, assista a TED Talks, ouça podcasts, se inspire. No começo, não se preocupe tanto com o ‘como’. Abra-se para caminhar e ir descobrindo qual é o seguinte passo.”

  • 4

    Veja quais competências te faltam e tente suprir essas lacunas –
    Uma vez decidido para onde a mudança vai te levar, é preciso entender quais habilidades são necessárias para chegar lá — e correr atrás daquelas que você ainda não tem, ou ao menos de uma parte delas.

    “Tem que entender esse ‘gap’ de competências e então se preparar. Pode ser que seja um mestrado, um MBA, um curso de idiomas ou de algo mais técnico, como aprender a usar uma ferramenta ou software. Também vale participar de eventos, palestras, webinários… Há um mundo de possibilidades, tanto para se informar, quanto para estabelecer conexões”, afirma Cepellos, da FGV.

    Como algumas dessas preparações tomam tempo, o ideal é começar esse planejamento com antecedência. “É comum as pessoas deixarem para pensar nisso na hora em que saem da empresa ou quando o trabalho não está tão legal. Mas esse tipo de coisa não se faz da noite para o dia. O ideal é arquitetar isso enquanto já tem algo em andamento”, diz Mattos, da Connection HR.

  • 5

    Comunique a vontade de mudar –
    Raramente as novas oportunidades chegam sem que as pessoas se mobilizem e comuniquem seu desejo de uma transição profissional. Uma das maneiras de fazer isso é demonstrando interesse por essa nova área em redes sociais como o LinkedIn. “Posicione-se de forma alinhada com essa nova personalidade, mostre o que te mobiliza profissionalmente. Os algoritmos unem pessoas com os mesmos interesses e podem te trazer oportunidades, mesmo que seja um post sobre um evento, um congresso que você nem sabia que existia”, diz Cepellos.

    Contatos presenciais também podem ajudar — o clássico “vamos tomar um café?” continua válido. “Vale bater um papo com quem fez essa transição ou está naquela área para onde você deseja ir para entender como aquela pessoa chegou lá, qual é a formação necessária. E ela pode lembrar de você caso surja uma oportunidade”, afirma a professora.

    Dependendo de onde se trabalha, é possível tentar um reposicionamento dentro da própria empresa. É uma opção vantajosa para quem quer mudar totalmente de área de atuação. “As empresas brasileiras são muito protetoras da experiência de mercado. Nas divulgações de vagas, é comum pedirem experiência no setor farmacêutico ou de agronegócio, por exemplo. Nesses casos, a transição vai ser muito facilitada quando já há pessoas que confiam no seu trabalho e sabem do potencial das suas entregas”, afirma Gabriel Mattos.

    Essa vontade pode ser manifestada de forma mais ou menos explícita para a chefia, dependendo do caso. “Tem empresas que estão mais à frente na gestão de pessoas e apoiam a livre movimentação de talentos, mas ainda existem gestores que têm melindres. É preciso ter a sensibilidade de avaliar como é sua liderança e qual abertura sua empresa tem”, diz o consultor.

    Uma forma mais sutil é propor acompanhar temporariamente o trabalho em outro setor – o chamado “job rotation” — ou contribuir em projetos de outras áreas. “Hoje, nas empresas, a gente fala de carreira em nuvem. Aquele sequenciamento de cargos, de analista júnior para pleno, sênior, coordenador etc. não é mais tão linear. Existem oportunidades de contribuições laterais, o que é uma excelente oportunidade para criar relacionamentos e se conectar a outras áreas.”

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