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Reportagem

Você já se chateou com uma mensagem hoje?

Como melhorar a comunicação por mensagens de áudio e texto pelas plataformas digitais, e uma reflexão sobre o que é estar conectado hoje

Tereza Novaes 09 de Novembro de 2025

Você já se chateou com uma mensagem hoje?

Tereza Novaes 09 de Novembro de 2025

Como melhorar a comunicação por mensagens de áudio e texto pelas plataformas digitais, e uma reflexão sobre o que é estar conectado hoje

Texto ou áudio, emoji ou figurinha são os novos signos com os quais nos apresentamos, interagimos e reagimos ao outro. Uma transformação brutal na comunicação, que segue em curso e, de tão veloz, ainda nos faz tatear para entender seus significados e regras de bom uso.

“De fato, as redes sociais e a internet comercial, da forma como a gente conhece hoje, mudaram para sempre a nossa relação com as outras pessoas e conosco mesmo”, afirma o escritor e pesquisador André Carvalhal, que está lançando “A Alegria em Ficar de Fora: Como se desconectar do mundo digital e se reconectar com você, as pessoas e a natureza”.

Ele lembra que muitas dessas plataformas que surgiram depois do advento da internet tinham como proposta conectar as pessoas. “Durante um momento, elas até proporcionaram isso, mas hoje geram muito mais desconexão, muito mais distanciamento do que poderiam ou pretendiam gerar.”

Se as redes sociais e os aplicativos de mensagem estão nos tornando mais distantes, será que melhorar nosso padrão de comportamento e de comunicação pode nos salvar? Será que estamos na mesma frequência sobre como usamos essas ferramentas?

Abreviações de palavras

Logo no início da “era das mensagens de texto”, definimos não ser de bom-tom escrever em letras maiúsculas e que isso significa uma forma rude, gritada, de falar. Hoje, chegamos às abreviações de palavras com muita gente escrevendo “pf”, em vez de por favor, e preferindo “obg” à obrigada.

“É difícil criar uma tabela do que pode e do que não pode, do que é grosseiro ou cortês, porque depende muito do contexto. Existe, sim, um certo descaso com a polidez, uma educação que o digital força a gente a deixar para trás, como se pertencesse só ao velho mundo analógico”, observa o escritor e jornalista Sérgio Rodrigues, autor de “Escrever é Humano: Como dar vida à sua escrita em tempo de robôs”.

Existe, sim, um certo descaso com a polidez, uma educação que o digital força a gente a deixar para trás

“Dependendo da conversa, do tom e da relação entre as pessoas, pode ser grosseiro encher de abreviações. Mas se você está falando com uma amiga íntima, não vejo problema. Cada caso é um caso”, completa.

Para ele, a aceleração da cultura digital nos deixa menos dispostos a usar fórmulas de cortesia, mas exagerar nessa tendência pode ser prejudicial à própria imagem de quem usa. “Se você pede um favor, um emprego, ou fala com alguém em posição de poder, pode passar uma imagem ruim e parecer grosseiro. A comunicação é feita de nuances, o ajuste fino é muito importante.”

Além do desuso das vogais nas famigeradas sopas de consoantes que são as abreviações, Rodrigues ressalta que a pontuação está igualmente caindo no ostracismo. “Isso pode criar problemas de interpretação graves, não saber se a frase é uma pergunta ou uma afirmação, por exemplo.”

Várias mensagens de texto ou uma longa?

Há quem defenda que o ideal é menos é mais, ou seja, escrever uma única mensagem, ainda que longa, em oposição aos que consideram melhor picotar o texto em frases curtas.

Na visão da consultora de etiqueta Claudia Matarazzo, não há problema nenhum em enviar até quatro mensagens curtas. “Se você mandar um textão para um desconhecido, corre o risco de a mensagem se perder, ele pode rolar para baixo, a pessoa não vê ou deixa para responder depois. Então, mandar mensagens separadas, até três ou quatro, pode ser mais eficiente.”

E ela garante que isso não é deselegante: “É apenas uma forma prática de garantir que a comunicação aconteça”.

Um “oi” sozinho

Rodrigues menciona o curioso hábito de quem envia apenas um “oi” solitário a um desconhecido, uma atitude tão estranha quanto desagradável. ”Alguém que não te conhece manda uma mensagem só com oi e fica em silêncio. É melhor dizer quem é e o que quer. É um erro comum e passa uma falta de noção, um desrespeito ao tempo da pessoa.”

Nesse tópico, ao abordar alguém desconhecido, Claudia também concorda que vale se apresentar e já dizer ao que veio. “É fundamental dizer algo como, por exemplo: ‘Sou fulana, da empresa tal. Gostaria de falar com você sobre esse assunto’. Não tem como fugir disso.”

Porém, para quem você segue no Instagram, por exemplo, ela não vê necessidade de puxar assunto ao responder uma foto ou vídeo postado no story. “Não acho que a pessoa precise se apresentar sempre nos directs. Ela pode simplesmente mandar a mensagem: ‘Ah, gostei’, ‘Achei isso ou aquilo’. No direct, você já localiza quem está falando”, lembra ela.

Posso te mandar um áudio?

Não há unanimidade em vários tópicos relacionados ao uso do WhatsApp, mas talvez o terreno mais pantanoso seja o das mensagens de voz, modalidade amada pelos brasileiros. No ano passado, Mark Zuckerberg revelou que, por aqui, mandamos quatro vezes mais áudio do que a média mundial.

“Como boa prática, é interessante checar se a pessoa está aberta a conversar e a receber um áudio. É muito importante se preocupar com o outro, com o momento do outro”, destaca André Carvalhal.

“A gente diz: ‘Ah, vou te mandar um áudio que é mais fácil’. Mais fácil para quem? É mais fácil para você, mas e para a pessoa que está recebendo? Então, checar se ela pode falar é o mínimo, é como bater à porta da casa de alguém antes de entrar”, compara Carvalhal.

Claudia Matarazzo dá outra dica prática: use “legendas” que expliquem em texto do que se trata a mensagem de voz. “Hoje as pessoas estão muito ansiosas, quando recebem um áudio, já querem levantar para ouvir. Se estão em uma reunião e colocam para tocar, as outras acham estranho ou até se sentem ofendidas. Então, é bom mandar com legenda: ‘Olha, é sobre aquele assunto, ouve quando puder’”, exemplifica.

“Assim, a pessoa já sabe do que se trata e entende se é ou não urgente. A legenda já orienta o tom da mensagem.” Além disso, ela afirma que esse tipo de “legenda” ajuda quem recebe a encontrá-la com mais facilidade, se precisar reouvir seu conteúdo, e é indispensável no contexto profissional.

Foguinho e coração

Emojis e mais recentemente as figurinhas também expandiram as fronteiras do nosso vocabulário, algumas com sentido tão consagrado que poderiam entrar para o Houaiss: reagir a uma foto, sobretudo em mensagem direta, com foguinho, berinjela, banana ou pêssego implicam conotação sexual. Assim como as carinhas com expressões mais comuns, de alegria, tristeza ou dúvida, ou corações, são extremamente claros no seu significado.

“Acho bastante funcionais, se bem usados. Eles ajudam a dar leveza e indicar o tom de uma mensagem. A comunicação escrita, especialmente no celular, é muito suscetível a mal-entendidos de tom e o emoji ajuda a sinalizar a intenção, humaniza a comunicação escrita, que costuma ser dura, preenchendo essa lacuna entre a fala e o texto”, aponta Sérgio Rodrigues.

Nem tudo, no entato, é tão literal e cristalino, e o flerte com a ironia no campo das figurinhas feitas sob medida muitas vezes deixa os destinatários sem entender o seu real sentido -algumas se tornam uma espécie de marca do remetente e são usadas indiscriminadamente seja na alegria ou na tristeza. Para o bem da comunicação, talvez seja melhor limitá-la como uma piada interna, restrita aos entendedores que a entenderão.

Ao postar fotos

Há uma regra de ouro para a convivência, no mundo real ou digital: saber respeitar o espaço dos outros. Por isso, antes de postar fotos de alguém, especialmente crianças; ou da casa de uma pessoa; ou de um momento especial que não é seu; certifique-se que a imagem não será considerada um desrespeito à privacidade.

“Fazer a foto de grupo pode, mas é preciso perguntar se pode postar. Pergunte primeiro para o dono da casa, para o anfitrião ou para quem organizou o encontro, e também para as outras pessoas do grupo. ‘Vocês se incomodam se eu postar?’ Se alguém se incomodar, não é para postar”, afirma Claudia.

No caso de crianças, ela aconselha a evitar de modo geral. “Se quiser muito publicar, é essencial perguntar aos pais. Tem que pedir autorização.”

Conexão real com o outro

Por fim, é importante destacar a necessidade de senso crítico diante das plataformas e uma conexão real com as pessoas. “Não precisamos só de boas práticas de educação, porque perguntar: ‘Oi, tudo bem?’, e a outra responder: ‘Tudo bem’, no automático, não vai mudar a nossa relação nas redes”, reflete Carvalhal.

“É mais sobre entender e buscar como podemos recuperar essa conexão que, em algum momento, já existiu. E como transportamos essa conexão para o ambiente digital de forma verdadeira, genuína e não encenada”, propõe.

A vida nas redes sociais, destaca ele, cria aquela sensação de que o outro está próximo e faz parecer que estamos em uma conversa infinita com as pessoas.

“Por isso, ninguém pergunta mais como o outro está, não dão mais bom dia ou boa noite. Elas encaminham uma coisa, comentam algo que você postou, podem te conhecer ou não, mas é como se o fato de te acompanhar e te ver ali diariamente, faça com que elas saibam o que você está vivendo e o que está passando. Como se aquela aparência fosse o suficiente para sustentar uma conexão real, verdadeira, profunda, quando, na verdade, não é.”

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