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Aleksey Cherenkevich/Unsplash

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Depoimento

O que é receber bem hoje?

A atenção aos detalhes, as gentilezas, o acolhimento. Profissionais da gastronomia dizem o que faz alguém se sentir especial, confortável e satisfeito em um restaurante, bar ou café

09 de Novembro de 2025

O que é receber bem hoje?

09 de Novembro de 2025
Aleksey Cherenkevich/Unsplash

A atenção aos detalhes, as gentilezas, o acolhimento. Profissionais da gastronomia dizem o que faz alguém se sentir especial, confortável e satisfeito em um restaurante, bar ou café

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    “A hospitalidade está nos detalhes e eles não custam mais caro”

    Marcelo Fonseca, eleito sommelier do ano pelo guia Michelin e sommelier-chefe do Evvai. Tem 36 anos, 18 anos dedicados à alta gastronomia

    “Receber bem é fazer o simples muito bem feito. É ter sorriso, simpatia, chamar o cliente pelo nome. Isso faz com que ele se sinta acolhido. Por mais que pareça pouco, trocar o guardanapo, limpar a mesa, trocar os pratinhos, acompanhar ao banheiro, tudo isso faz diferença. A hospitalidade está nos detalhes — e esses detalhes não custam mais caro. Servir a água, observar se o cliente está com frio e levar uma manta, ou se o ar está incomodando e ajustar. Uma vez, meu celular estava descarregando e alguém trouxe um power bank sem eu pedir. Isso é hospitalidade: atenção genuína.

    Mas não gosto da expansão exagerada, é uma linha delicada: ser próximo sem ser invasivo. Há limites —eu não puxaria uma cadeira e sentaria com o cliente. Cada mesa tem sua ‘cúpula’, uma espécie de espaço sagrado, e a gente precisa se comunicar de forma respeitosa, mantendo essa barreira com elegância. É um serviço cuidadoso, carinhoso e técnico ao mesmo tempo. No Evvai, servir é um ato de respeito, não de subserviência.” (Depoimento a Isabelle Moreira Lima)

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    “Quando se tem prazer genuíno em receber, a hospitalidade acontece naturalmente”

    Rodrigo Oliveira, chef do Mocotó

    “Penso que receber bem é compartilhar o que se tem de mais especial. Independentemente se estamos recebendo em casa, oferecendo um peixe frito numa barraca de praia ou uma experiência gastronômica superexclusiva num restaurante estrelado, a hospitalidade sempre vai depender da generosidade.
    Diferente do serviço, que pode ser entendido como o que você faz para os convidados, a hospitalidade é sobre como você faz as pessoas se sentirem. Quando se tem prazer genuíno em receber, a hospitalidade acontece naturalmente, pois não há nada mais poderoso do que pessoas felizes focadas em fazer você feliz.
    Minha dica é simples: não inventar muito. Claro que a gente dá sempre uma caprichada na arrumação, mas se você estiver relaxado, cozinhando uma receita que já está acostumado (ou mesmo pedir aquela pizza que você adora), sem grandes preocupações com a etiqueta ou um ‘roteiro’ de como tudo deve acontecer, penso que os convidados também relaxam e a chance de sucesso é de 100%.” (Depoimento a Isabelle Moreira Lima)

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    Rubens Kato

    “Receber bem, hoje, é também desacelerar um pouco o tempo”

    Katherina Cordás, diretora de hospitalidade e pesquisa do restaurante Tuju

    “Para mim, receber bem é sobre criar um espaço autêntico, verdadeiro. Um lugar onde as pessoas se sintam vistas, acolhidas, cuidadas. Muito alem do servir, receber bem é sobre escutar, perceber o outro, entender suas necessidades. É sobre sensibilidade. Receber bem, hoje, é também desacelerar um pouco o tempo. Fazer com que durante as horas que alguém passa aqui, o mundo lá fora pese menos.” (Depoimento a Tereza Novaes)

  • “É uma entrega sincera, transformar o ato de alimentar em uma celebração da conexão humana”

    Gil Oliveira, chef do Sushi do Gil, em Trancoso (BA), restaurante especializado em Omasake

    “O que é receber bem? Pensei muito bem sobre essa resposta e me veio uma lembrança  de um curso que fiz com o chef Jum Sakamoto. Ele falava sobre restauração, sobre o que é um restaurante, um restaurante serve pra restaurar a pessoa. Isso começou a mudar minha visão sobre o serviço e eu comecei a pesquisar mais sobre o Omotenashi, a arte do cuidado com o outro, com o coração, de forma genuína, desinteressada. É como se fosse a gente tivesse fazendo uma apresentação de balé em que cada detalhe, cada elemento do ambiente, da comida, do serviço… tudo ali cria um sentimento de bem-estar e um apreço genuíno. E não estou falando de luxo ou de formalidades, mas de entrega sincera, transformar o ato de alimentar em uma celebração da conexão humana. É fazer com que o convidado não se sinta apenas bem-vindo, mas genuinamente cuidado.” (Depoimento a Luara Calvi Anic)

     

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    “Cada lugar tem seu estilo, mas a gentileza é o que resolve tudo”

    Alê D’Agostino, bartender que está inaugurando o Coda, na Vila Buarque, em SP

    “Principalmente depois da pandemia, começamos a sentir uma necessidade maior de acolhimento nos lugares. Produto, todo mundo oferece, não é mais só sobre isso.
    Claro, que dá para criar um drinque novo, um prato diferente, mas isso não é mais tanto um diferencial. O que faz a diferença é como você recebe a pessoa, como cuida dela. A gente sempre quer voltar àquele lugar que tem alguém que te conhece, te chama pelo nome e diz: “Que bom que você voltou”. Isso cria vínculo. O atendimento precisa de treinamento, você percebe quando um lugar tem uma ordem, uma orientação. E quase sempre isso reflete a postura dos donos. É muito difícil o atendimento não ser um reflexo da gentileza de quem comanda o espaço. O que me incomoda é quando há afetação, quando o serviço tenta ser algo que não é. Cada lugar tem seu estilo, mas a gentileza é o que resolve tudo.”(Depoimento a Tereza Novaes)

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    “Comprometa-se em fazer o melhor em todas as pontas. Isso é proporcionar a melhor experiência de hospitalidade”

    Carla Pernambuco, chef do restaurante Carlota, em SP, há 30 anos

    “Você precisa estar comprometido com o que se propôs. Quer abrir um restaurante? Comprometa-se em fazer o melhor, em buscar qualidade em todas as pontas, em estimular a equipe e, por fim, acolher o cliente em sua casa. Isso é proporcionar a melhor experiência de hospitalidade, com profissionalismo, técnica e afeto. E comida boa, lógico. 

    Hoje há um cuidado maior para estar por dentro do que o público quer — e há diferentes públicos. Comida saudável e mais leve, menos açúcar, mas sem dispensar sobremesas, vinhos naturais, cafés especiais, ingredientes frescos, receitas aprazíveis e criativas, sofisticadas mas descomplicadas. Surpreender não é luxo, mas conforto sim.

    O Carlota é um restaurante de bairro de cozinha cosmopolita e multicultural, essa é sua essência. Fazemos comida comfort, temos um ambiente acolhedor, mas somos conectados às inovações e aos movimentos da cozinha no mundo. Quem vem ao Carlota espera encontrar o calor de uma casa afetuosa e vivaz e a gastronomia moderna e rica sempre atualizada. Nossos clientes são, em sua maioria, clientes fiéis que vêm ao Carlota por esse motivo: sabem que vão ser acolhidos, conhecem o estilo e o funcionamento da casa, e também sabem que viverão novas experiências — nunca é igual, mas é sempre bom!” (Depoimento a Amauri Terto)

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    “A palavra que mais sintetiza o ato de receber bem é cuidado”

    Ana Massochi, fundadora do Martín Fierro, na Vila Madalena. O restaurante argentino acaba de completar 45 anos

    “A palavra que mais sintetiza o ato de receber bem é cuidado. É você passar claramente a sensação para o cliente de que ele está sendo cuidado. Ao chegar no restaurante, ele precisa sentir que, ali, nós vamos tomar conta dele. Não é algo que precisa ser dito, a pessoa vai perceber com ações concretas. Por exemplo, quando o cliente está na espera, que é algo chato — ninguém gosta de esperar —, tem de haver uma atenção redobrada, oferecer uma água ou até uma taça de champanhe. São pequenas coisas que fazem a diferença. No cotidiano, há diferentes formas de fazer o cliente se sentir cuidado.” (Depoimento a Ana Elisa Faria)

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    “Criar um ambiente onde a pessoa possa se sentir confortável e aproveitar o seu momento de pausa”

    Murilo Nogueira, sócio do HM Food Café (SP) e arquiteto

    “Hoje, receber bem é você acolher essa pessoa que sai de casa pra ir num restaurante ou num café, ela não tá só procurando só comer ou beber, ela tá em busca de um momento, de pausa, de um refúgio, de um pequeno prazer aí no meio de todas as loucuras da nossa vida. E o nosso papel é entender isso, criar um ambiente onde ela possa se sentir confortável pra ter esse momento, seja sozinha ou com amigos, ou mesmo trabalhando. E criar esse espaço e esse cenário, pra mim, é o sinônimo de receber bem hoje. Dentro dessa missão, a gente tem que ter um olhar bastante atento para receber bem muitos tipos de clientes, entender, ter a sensibilidade para atender com atenção sem ser invasivo e entregar algo autêntico.  O comportamento das pessoas mudou bastante, acho que desde todo o caos da pandemia, as pessoas valorizam mais o tempo, essa saída com um propósito, seja para celebrar ou simplesmente ter um respiro. Acho que isso é algo novo dentro do setor de hospitalidade. É fundamental conseguir criar um clima para que a pessoa possa ter essa percepção desse momento. Seja por meio do ambiente, da música, da luz, da comida. O ideal é ter tudo isso junto, ter esse clima para criar essa conexão com o visitante, para que ele possa sair um pouquinho melhor do que chegou. Isso pra mim hoje é o verdadeiro significado da hospitalidade.” (Depoimento a Luara Calvi Anic)

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