O que te deixa mais exausta em ser mãe e profissional?
Quando uma mãe para de trabalhar?
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Isabela Durão

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Depoimento

O que te deixa mais exausta em ser mãe e profissional?

Advogada, professora, trabalhadora doméstica, jornalistas, apresentadora de TV, cabeleireira e escritora respondem a Gama o que as deixa mais cansadas no combo maternidade e carreira

Ana Elisa Faria 05 de Maio de 2024

O que te deixa mais exausta em ser mãe e profissional?

Ana Elisa Faria 05 de Maio de 2024
Isabela Durão

Advogada, professora, trabalhadora doméstica, jornalistas, apresentadora de TV, cabeleireira e escritora respondem a Gama o que as deixa mais cansadas no combo maternidade e carreira

As mães estão exaustas — de sentir culpa, da falta de descanso, da hipervigilância, do trabalho do cuidado, de não dar conta, da carga mental, de gerenciar mil papéis, de tentar equilibrar muitos pratos de uma vez só, da constante privação de sono, da sobrecarga de tarefas em casa e no campo profissional. A lista, infelizmente, é infinita e diversa. Para cada uma, há uma dor diferente.

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Com o objetivo de conhecer o que aflige as mulheres que têm filhos e uma ocupação além dos serviços prestados ao lar, o que já dá um trabalhão, Gama perguntou o que as deixa mais cansadas no combo: maternidade e carreira. Trabalhadoras de várias áreas responderam e você lê abaixo.


 Arquivo pessoal

“O que mais me deixa exausta é tentar buscar um equilíbrio entre carreira e filhos, o que eu suspeito que nem exista”
Andressa Reis, 38, criadora de conteúdo digital e escritora, autora de Da Cor que Eu Sou (Editora Matrescência, 2021). É mãe da Maria Antônia, 5, e do Caetano, 4

“O que mais me deixa exausta é tentar buscar um equilíbrio entre carreira e filhos, o que eu suspeito que nem exista. Quando você foca mais no trabalho, acaba deixando alguns momentos importantes com os filhos escaparem pelos dedos. E quando você prioriza os filhos, as portas profissionais se fecham ou você precisa se virar em várias para conseguir não escolher entre um e outro. E isso cansa, esgota, exaure.”


 Arquivo pessoal

“O que mais me deixa cansada é a constante falta de tempo. Estou sempre pensando pelos outros, para os outros”
Daniela Delatore Alonso Warner, 40, professora de educação física e pedagoga. É mãe da Clara, 7, e do Benjamin, 3

“Nunca parar é o que me deixa mais exausta em ser mãe e profissional. Acordo cuidando das crianças, saio de casa cuidando das crianças, chego no trabalho e cuido das crianças — dos outros, no caso. No fim do dia, pego o meu pequeno na escola e vou no carro conversando, que é para ele não dormir. Chego em casa, é um tal de mamãe para cá, mamãe para lá, e aí meu marido também quer atenção. Daí, quando eles vão dormir, quando está todo mundo na cama, eu sempre penso na aula que ainda preciso planejar, no material que não guardei, no aluno que fez alguma coisa. Aí você pensa na festinha de aniversário que vai ter, no presente que precisa comprar, na louça que precisa lavar, na roupa que precisa passar. É exaustivo. Além de tudo, tenho uma autocobrança muito grande por não passar mais tempo com os meus filhos. Estou sempre deixando de fazer outras coisas para passar tempo com eles, porque acho que se eu não ficar com eles, apesar de saber que não sou uma mãe ruim, a minha cabeça diz isso. Então, o que mais me deixa cansada é essa constante necessidade de dar atenção, é essa constante falta de tempo. Ter que pensar por mim mesma e por mais outras pessoas. Eu estou sempre pensando pelos outros, para os outros. E aí, quando paro para pensar em mim, me sinto culpada, porque acho que deveria estar pensando nos outros, pelos outros. Isso me deixa exausta. Por mais que as pessoas falem que eu seja uma mãe muito boa, existe uma cobrança social bastante grande para que a gente consiga fazer tudo.”


 Arquivo pessoal

“A carga mental é a coisa mais exaustiva”
Graziele Almeida dos Santos Segatti, 34, advogada. É mãe da Maitê, 2

“Sem dúvida, a carga mental é a coisa mais exaustiva para mim. Quando estou no trabalho, fico pensando sobre o dia da Maitê amanhã. Aí, chega o amanhã, estou trocando ela e refletindo sobre o meu trabalho. E, quando estou no trabalho, penso que tenho que sair em tal horário para buscá-la na escola. Então, é essa organização que a gente vai fazendo mentalmente para conseguir dar conta e entregar o melhor que podemos nos dois âmbitos. O que me deixa mais cansada é o exercício de estar inteira nos dois lugares. Estou aqui, mas pensando se vai ter lanche para a semana, se preciso passar no mercado, se tenho de ir à feira. Quando estou com a criança, penso que tenho coisas do trabalho para entregar. Acredito que essa cobrança da sociedade é um pouco injusta com as mães. Porque se eu viver só no presente, amanhã ela não tem uniforme para a escola, não vai ter lanche para levar. Vivo sempre no desafio de organizar esses pratos, de escolher qual vou deixar cair, porque não dá para organizar todos, mas também tento conseguir fazer essa organização da melhor forma para que as coisas fluam bem.”


 Divulgação

O que me deixa mais exausta não é o trabalho ou a maternidade, é não conseguir descansar
Isabela Reis, 28, jornalista e podcaster do “Angu de Grilo” e do “Conselhos que Você Pediu”. É mãe do Martin, 3

“Eu tenho estudado, lido e me interessado muito pela pauta do descanso, um direito protegido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que diz que toda pessoa tem direito ao repouso. E a gente não tem. Esse direito é muitíssimo violado pelo mercado de trabalho e muitíssimo violado também pela sobrecarga materna. O que me deixa mais exausta não é o cansaço do trabalho ou o cansaço da maternidade, é não conseguir descansar desse cansaço. Isso é o que diferencia mulheres cuidadoras de mulheres que não são cuidadoras. E aí não entram só as mães, são avós que cuidam de netos, tias que cuidam de sobrinhos e mulheres que cuidam de idosos. A hipervigilância do cuidado é exaustiva. Eu termino a minha jornada de trabalho, que é de seis a sete horas — o tempo em que meu filho está na escola —, e todas as outras 17 horas do dia eu estou hipervigilante. O sono, por exemplo, é mais leve porque estamos o tempo todo atentas à criança. Podemos descansar o corpo, mas temos uma mente que não se permite descansar, está o tempo todo hipervigilante. A soma dessas duas coisas é difícil, e é preciso de uma rede grande para uma mulher conseguir descansar. Ela precisa deixar o filho numa escola, com uma cuidadora ou com uma família de confiança para a cabeça dela, finalmente, sair desse modo de hipervigilância. E que mulher pode ter essa rede de confiança e ir descansar? Portanto, isso é o que me deixa mais exausta em ser mãe e ser profissional. Não é só pela quantidade de trabalho, pela sobrecarga, que é imensa mesmo, mas é pela dificuldade de descansar a mente e o corpo, já que essas duas jornadas entram uma dentro da outra, e, muitas vezes, sem um tempo necessário de descanso. Somar esses dois papéis significa que a gente não tem janela para descansar quase nunca. Deveríamos ter esse direito atendido, mas dificilmente temos. É preciso de muito trabalho e muita logística para ter, o que também gera mais uma camada para essa exaustão.”


 Lucas Viggi

“A cada dia, você escolhe o que vai ignorar”
Luiza Voll, 40, sócia-fundadora da Contente. É mãe do Tom, 3

“Antes de viver a maternidade, eu não conseguia ter dimensão do quão difícil é encaixar em uma vida só o trabalho do cuidado e o trabalho como ofício. Parece que é uma fatia de pizza que não cabe. Antes de ter filho, lembro da sensação de conseguir minimamente encaixar os cuidados com a casa, comigo e o trabalho, a coisa fluía. Quando um filho nasce, a quantidade de trabalho que entra parece humanamente impossível. E eu nem vou falar de equilíbrio porque parece uma coisa completamente impossível. Então, a cada dia, você escolhe o que vai ignorar, escolhe qual parte vai deixar não atendida. Quando isso é algo referente aos cuidados que compõem o cuidado de uma criança, é muito duro para os cuidadores. É fazer caber uma vida que, no papel, parece que cabe, mas qualquer pessoa que vive sabe que não cabe. E vira uma mistura de sentimentos, culpa, frustração, cansaço. E aí vem o dia seguinte. E essa sequência é bastante complexa.”


 Arquivo pessoal

“Eu sempre tenho muito medo de não dar conta”
Maria Fernanda Veras, 32, trabalhadora doméstica. É mãe do Thallys, 10

“Hoje está menos difícil porque o meu filho já tem dez anos, mas mesmo assim eu sempre tenho muito medo de não dar conta — das coisas dele e das coisas na casa onde trabalho. Fico insegura. É uma exaustão mental, além de física. Acordo às 5h e o Tales, às 5h20. Ele se veste, toma café da manhã e saímos de Jardim Pinheiros [bairro próximo ao Butantã, em São Paulo] para Pinheiros, onde ele estuda. Em seguida, pego outro ônibus e vou para o trabalho, na Pompeia. Quando chego lá, tenho que fazer as coisas muito rápido para sair às 14h40 e dar tempo de pegar o meu filho na escola. Daí, voltamos para casa, e eu vou fazer todas as tarefas domésticas. Às segundas, quartas e sextas, o Tales vai para o jiu-jitsu, então levo e busco ele também. Depois, conversamos sobre o que aconteceu na escola e tento ajudá-lo com os deveres. Quando ele fica doente, é mais complicado ainda porque preciso me virar em dez para dar conta do meu trabalho e da criança que está doente. O meu marido até me ajuda, só que o trabalho dele é mais difícil e, se ele faltar um dia no serviço, é descontado bastante do salário. Graças a Deus, tenho a Jessica e o André [os patrões], que compreendem e me ajudam a conciliar a minha rotina com a rotina do Tales. Às vezes, se ele adoece, eu o levo ao médico e vou trabalhar, aí ele fica com uma senhora que é uma rede de apoio para mim. Mas é isso, tenho que me desdobrar. Agora, depois de dez anos, estou começando a ter um pouco mais de tempo para mim. Mas, geralmente, estou muito cansada para fazer algo. Então, o Tales dorme às 20h e às 20h30 ou às 21h, no máximo, eu também já vou dormir.”


 Arquivo pessoal

“Não é só cansaço físico, é cansaço mental também porque a gente vai ocupando a mente, vai ficando tensa, preocupada”
Maria Lúcia Teixeira da Silva, 46, cabeleireira. É mãe da Kalyane, 12, e da Manuela, 9

“Ser mãe e profissional é cansativo. Nossa, como é cansativo. Moro no Campo Limpo, em São Paulo, acordo cedo e preparo as minhas filhas para a escola — eu levo uma e meu marido leva a outra. Às vezes, volto para casa rapidinho e preparo algo para elas comerem no almoço. Depois, vou para o trabalho, em Perdizes, e gasto entre duas horas e duas horas e meia para chegar. Até me programo para voltar cedo para dar atenção às minhas filhas, mas às vezes demoro para sair do trabalho. Então vai dando aquele cansaço. E não é só cansaço físico, mas cansaço mental também porque a gente vai ocupando a mente, vai ficando tensa, preocupada, a hora vai passando e fico imaginando quando vou chegar em casa. Às vezes meu marido não consegue chegar cedo, e eu tenho que chegar, preparar o jantar para as crianças e dar um pouco de atenção a elas. Quando vou dormir, estou exausta. Já foi muito pior. Lembro que quando uma das minhas filhas era bem pequena, ela não dormia nem de dia nem de noite. Voltei a trabalhar quando ela tinha dois meses e passava praticamente a noite inteira acordada. Ia para o trabalho e quando arrumava uma cadeira no ônibus, dormia. Eu desmaiava, muitas vezes na cadeira preferencial. Aconteceu em algumas ocasiões de acordar e ver uma pessoa idosa em pé ao meu lado. Eu morria de vergonha porque estava dormindo no assento preferencial e levantava toda sem graça. E a pessoa respondia assim: ‘Minha filha, você está tão cansada, tão cansada, que eu vejo que seu sono está tão bom e, por isso, prefiro que você continue aí’. Esse é o nível do cansaço. Então, ser mãe e trabalhar não é nada fácil. Nessa época, eu ficava feliz da vida por poder cochilar durante 20 minutos no horário do almoço. Eu já chegava no trabalho destruída. Mas nunca desisti porque amo o que eu faço.”


 Arquivo pessoal

“Depois que viramos mãe, perdemos a licença para ficar doente. Perdemos a permissão para sumir”
Titi Müller, 37, apresentadora de TV. É mãe do Benjamin, 3

“O que me deixa mais exausta em ser mãe e profissional é tentar conseguir equilibrar todos os pratinhos que a vida vai jogando quando a gente já está assoviando e empinando pipa ao mesmo tempo. E eu tenho uma rotina bem carregada de compromissos, meus e do Benjamim. Assumi a organização de um evento muito legal em Brasília, o Festival CoMA, estou em processo do piloto de um programa para a TV e na pré-produção do Acessíveis Cast. E isso sou eu num momento de controle total da minha vida profissional. Na época em que eu apresentava o programa de viagem, foi um descontrole total porque eu não tinha a menor noção de como seria minha agenda para dali a duas semanas. Também apresentava festivais no meio das viagens. Realmente, vi que precisava dar um tempo, pisar no freio, focar na maternidade, até porque meu filho ainda era muito pequeno. Enfim, é uma exaustão por saber que, por mais que a gente possa ter uma rede de apoio — e a minha é muito limitada, tenho uma única pessoa com quem posso deixar o meu filho e ela está sobrecarregada também —, nós somos insubstituíveis, não só no estar lá fisicamente, mas na carga mental que a gente tem. E não é só a carga mental dos agendamentos de vacinas, dos compromissos escolares, de lidar com as questões emocionais dos nossos filhos, mas a carga mental de entender que depois que viramos mãe, perdemos a licença para ficar doente — é bom falar que estamos no Maio Furta-cor, que fala sobre a saúde mental materna. Perdemos a permissão para sumir porque temos esses bichinhos, esses seres humanos que dependem 100% da gente. Sobretudo quando falamos de maternidade solo. Mas, ao mesmo tempo, é o nosso recarregador, né? Todos os dias, quando vou colocar o Benjamin para dormir, sinto que meu coração fica igual a uma bateria recarregando. Ele sai do vermelho, vai para o verdinho e aí eu vou dormir. No dia seguinte, começa tudo de novo. Acho que a vida adulta é sobre isso também, principalmente quando a gente toma uma decisão consciente sobre a maternidade, que eu achei que tivesse, mas descobri que dei uma bela romantizada. Mas é sobre isso, sobre gerenciar mil papéis ao mesmo tempo.”


 Pablo Saborido

“A mulher se torna incapaz de pensar com clareza e de existir plenamente”
Vanessa Barbara, 41, jornalista e escritora, autora de livros como “Três Camadas de Noite” (Fósforo, 2024) e “Mamãe Está Cansada” (Companhia das Letrinhas, 2023). É mãe da Mabel, 5

“A constante privação de sono — não poder dormir o tanto quanto eu preciso. Às vezes falamos na falta de liberdade das mulheres que têm filhos, mas para muita gente é algo até mais anterior: um corpo que não consegue descansar não se restaura. Vai passando pelos dias em um estado confuso, autômato, em uma espécie de resfriado permanente. A mulher se torna incapaz de pensar com clareza e de existir plenamente. É claro que uma pessoa que mal consegue se manter de pé não vai conseguir criar com o mínimo de liberdade e autonomia, e isso pode inviabilizar o trabalho criativo, que já não é valorizado. (Só este ano recebi quatro propostas de trabalho sem nenhuma remuneração, tanto no campo literário quanto jornalístico. É revoltante.) De modo que eu tenho dois ofícios que não são valorizados ou adequadamente remunerados: a maternidade e o trabalho criativo. Não recomendo.”