Ouro líquido
Com apenas duas safras comerciais, azeite produzido na Serra da Mantiqueira coleciona medalhas internacionais
O azeite Sabiá, produzido em Santo Antônio do Pinhal (SP), na Serra da Mantiqueira, tem poucos anos de vida, apenas duas safras no mercado, mas já impressiona quem o prova. Falamos aqui em especialistas: entrou no guia Flos Olei 2020, que reúne os 500 melhores azeites do mundo; foi indicado ao prêmio italiano Leone D’Oro Internacional, que no mundo dos azeites equivale ao Oscar; e levou três prêmios no Lorciolo D’Oro, o mais antigo concurso internacional. Na última semana, foi incluído no topo da lista dos dez melhores azeites do mundo, na competição Brazil iOOC, por qual levou medalha de ouro e troféu de melhor do Hemisfério Sul.
O curioso é que a Fazenda do Campo Alto, onde ele é produzido, só agora comemora o início da idade adulta de suas oliveiras, que chegam aos cinco anos. Com essa “maioridade”, a expectativa é que as safras, hoje minúsculas, sejam maiores.
O empreendimento é um projeto do casal formado pela jornalista Bia Pereira e o administrador Bob Costa, dono também da agência de publicidade nova/sb, que já tinham a fazenda há 17 anos e onde criavam gado de corte. Há dez anos, perceberam o florescimento de pomares de oliveiras na região e, pouco depois, as primeiras marcas de azeite da Mantiqueira surgiram no mercado.
Até que Bia foi procurada por uma vizinha da região que produzia um azeite, o Oliq. Ela estava interessada em informações sobre gado e Bia aproveitou para aprender um pouco mais sobre as oliveiras. Começou ali a pesquisa que levou Bia e Bob a pensar sobre virarem produtores. “Eu já queria plantar alguma coisa, mas não sabia o quê. Ela estava superempolgada, o azeite era gostoso”, conta. De lá, partiram para uma série de cursos no Sul do Brasil e na Itália, e poucos anos depois colhiam a primeira safra, em 2018. De tão pequena, não chegou a ir ao mercado, mas foi suficiente para mostrar que o negócio era promissor.
Nova fronteira
Bia e Bob fazem parte de uma turma que têm transformado a Mantiqueira como produtor de café, vinho e agora azeite. A primeira extração da região foi feita em 2008 na fazenda experimental da Epamig (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais), em Maria da Fé (MG), espécie de propulsora de negócios e produtos com base na agricultura local. (A título de curiosidade, foi a Epamig que começou a vinificar as primeiras uvas produzidas em Minas Gerais há menos de uma década e que já levaram também prêmios internacionais.)
Nesses 12 anos, 45 marcas foram surgindo na Mantiqueira, com azeite produzidos em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. “Apesar do grande número de produtores, o volume produzido ainda é pequeno, menos de 0,5% do consumo total no Brasil”, explica Paulo Freitas, consultor e especialista em azeites.
Segundo ele, a região tem uma condição única de cultivo, uma vez que ocorre a mil metros de altura, com noites frias e calor para a floração e produção dos frutos na época certa. Essa é a parte boa, mas também há adversidades: “As oliveiras ainda estão se aclimatando na região, as árvores mais antigas não passam de 15 anos. A produção tem oscilado bastante nos últimos três anos. Há também uma curva de aprendizado natural entre os produtores, no trato agrícola das oliveiras”, afirma.
Na Mantiqueira (e no Brasil), entre os maiores problemas está a chuva. O solo, idealmente, deve ser arenoso para drenar bem. Na serra, são argilosos. O que “resolve” a questão ali é a altitude, que faz com que a água escoe.
Azeite bom é azeite novo
Ainda assim, o azeite da Mantiqueira tem uma grande vantagem, que é o frescor. Azeite bom é azeite novo, fresco, em que a intensidade dos aromas e sabores estão mais preservados e presentes. O que consumimos costumeiramente no Brasil é importado e é comum que perca qualidade ao longo do processo de muitas etapas: da produção ao envase, que muitas vezes não são feitos pela mesma empresa; passando pela a viagem marítima, que pode ser longa, e por um eventual “estágio” no porto; e uma possível passagem a um distribuidor até o supermercado. Para chegar finalmente à sua cozinha, são cerca de 60 dias.
Por isso mesmo, é preciso fazer uma distinção na comparação do azeite produzido por pequenos produtores locais, como Bia Pereira e Bob Costa do Sabiá, e os gigantes vendidos no supermercado, que são uma espécie de “commodity”. Os deles, se você mora em São Paulo, são feitos a duas horas e trinta minutos de casa.
Além do frescor, o perfil do Sabiá é outro diferencial. Um bom azeite tem amargor e picância, algo avaliado em concursos internacionais. Isso é buscado no ponto de maturação da oliva colhida na fazenda do Sabiá. “A gente procura fazer um azeite mais verde, picante, com aroma de grama, um cheiro gostoso”, afirma Bia.
Na Mantiqueira, o casal tem quatro variedades plantadas: arbequina, arbosana, koroneiki e grappolo. Além dos azeites monovarietais, eles fazem blends. Animados com a produção, acabaram comprando outras terras no sul do país, na região da Serra do Sudeste, onde há também produção intensa de vinhos, com marcas como Chandon e Valduga. “Como lá a produção começou depois da nossa pesquisa, a gente tratou a terra melhor e mais profundamente, a 60 cm. Na Mantiqueira, tinha sido a 20 cm. As safras devem ser bem maiores.”