Até onde você iria por um filme?
Streaming e pirataria crescem lado a lado durante a quarentena. Não importa em qual site esteja o título, todos buscam ver o filme desejado
Lançado há quase uma década, o filme “Contágio” (2011), de Steven Soderbergh, parece ter previsto o futuro. Distopia sobre um vírus letal trazido da China que vira pandemia (com Gwyneth Paltrow doente), o título se tornou tão atual com a COVID-19 que virou alvo de um súbito crescimento de interesse, segundo o Google Trends.
Mas “Contágio” não está disponível no streaming tradicional. Só assinantes da HBO e do itunes, por exemplo, podem “alugá-lo”, segundo o portal JustWatch. Então como tanta gente tem visto o filme, que atrai comentários e análises em todo canto? Acertou quem pensou no logo do navio pirata do site de downloads mais ilegal da Terra.
Em poucos dias, o número de downloads do filme aumentou de algumas centenas para quase 20 mil. E chegou ao top 10 do Itunes em países como Austrália. “Contágio” é um exemplo específico. Mas com cada vez mais gente em casa por conta da nova pandemia do coronavírus, vive-se o auge da era do streaming – e também da pirataria.
A infinidade de filmes e séries à disposição via streaming seria a maior qualidade do serviço. Mas a abundância é atrapalhada pela fragmentação das plataformas, o que explica a retomada da pirataria, de acordo com um estudo da Sandvine, empresa norte-americana de inteligência de rede.
A explosão de opções de serviços de streaming, sua fragmentação, explica a retomada da pirataria
Na última década, o mercado viveu uma explosão de novas opções de streaming. Antes liderado pela Netflix (R$ 21,90 a R$ 45,90 ao mês), o cardápio de plataformas agora inclui: Amazon ($9,90), HBO Go (R$ 34,90 a 45,90), Apple (R$ 9,90), GloboPlay (R$ 22,90), Looke (R$ 16,90 a R$ 26,90), Mubi (R$ 27,9), TelecinePlay (R$ 37,90) e por aí vai: cada ano surgem novas opções.
É só fazer as contas. Como parte das produções é exclusiva, os conteúdos estão cada vez mais divididos em diversos. Como nem todo mundo quer gastar mais de R$ 150 por mês para ver o que quiser, a pergunta virou “o que assinar?” – e a resposta reside, cada vez mais, nos conteúdos ilegais. O consumidor então assina um ou dois serviços, e pirateia o resto.
Com o mundo trancado dentro de casa, usando a internet para trabalhar, se entreter, pedir comida e ligar para amigos e familiares por vídeo, o tráfego online explodiu e sobrecarregou muitos sites. Para tentar evitar o colapso, Youtube e Netflix já reduziram a qualidade de suas transmissões na Europa. Mais um elemento que parece ter deixado as versões pirata atraentes.
Mesmo o Popcorn Time, plataforma de streaming (ilegal) que viveu seus dias de glória há vários anos, vive agora um revival por causa do coronavírus. Com até o antigo The Pirate Bay, site (igualmente ilegal) usado para baixar filmes e séries, testando o lançamento de um streaming próprio, uma nova ordem de consumo de vídeos pode estar a caminho.
Além da pirataria ser crime, o prejuízo para a industria cinematográfica é gigante, o que só deve piorar nestes tempos em que as filmagens e a produçao de séries e filmes está parada. Por aqui, a perda anual com pirataria é de 4 bilhões por ano, segundo um estudo realizado pelo Instituto Ipsos encomendado pela Motion Picture Association (MPA).