Especialistas apontam caminhos para fiscalizar o poder e participar da democracia neste novo ano
Parece redundante dizer que a política é um lugar de todos, já que o próprio significado da palavra remete à vida coletiva, mas essa noção não é tão óbvia quando tratamos os candidatos eleitos como figuras distantes. Para se aproximar da política e garantir que os mandatos respondam às demandas da cidade, estado ou país, é preciso compreender que a função dos administradores públicos é trabalhar em prol da sociedade. “São nossos impostos que pagam os salários, então isso precisa ter um retorno em políticas públicas”, explica Lana Faria, diretora de operações da Legisla Brasil, organização sem fins lucrativos que visa potencializar a atuação dos agentes políticos.
Por outro lado, é impossível se desvencilhar completamente da política, mesmo que haja uma crescente descrença no sistema democrático. Amanda de Albuquerque, diretora executiva da Rede A Ponte, instituição focada em auxiliar carreira de mulheres nos poderes públicos, exemplifica que “até o preço que pagamos no pão é afetado pela inflação, que é influenciado por decisões políticas”. Ela defende a recuperação do “lado positivo” da democracia: a possibilidade de participar em mudanças que interferem na vida de todos.
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Áurea Carolina, que foi vereadora em Belo Horizonte e deputada federal por Minas Gerais, conta que ouvir a população foi fundamental para ter uma orientação de trabalho. “Apresentamos projetos de lei ou convocamos audiências públicas a partir de provocação da sociedade.” Albuquerque relata um exemplo, dentre muitos, em que a participação cidadã foi essencial: “No caso da Lei da Ficha Limpa, quem estava no poder claramente tinha o interesse de que ela não fosse aprovada. Com muita pressão durante alguns anos, foi possível criar uma lei que hoje é extremamente eficiente e útil para garantir a transparência”.
O ano de 2025 é uma oportunidade para quem deseja começar acompanhar política, pois será um momento crucial para os vereadores e prefeitos que venceram as eleições de 2024. Eles terão uma missão importante: até o final do ano precisam aprovar o novo Plano Plurianual (PPA), que é proposto pelo poder executivo e determina o orçamento, as diretrizes, objetivos e metas de médio prazo da administração pública. “Os próximos quatro anos de legislatura dependem deste primeiro”, resume Faria.
Se pensa em melhorar a relação com a política, confira as dicas que essas três especialistas deram a Gama. Elas falam sobre como acompanhar e participar dos mandatos e de como iniciar projetos coletivos para o seu bairro ou cidade.
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Entenda o papel de cada agente político, incluindo o seu –
O que faz Lana Faria continuar acreditando na democracia brasileira, entre outros fatores, é entender a complementaridade dos cargos políticos. Eles se organizam de uma forma lógica para que as políticas públicas cheguem até nós. Pode acontecer de esses papeis se misturarem ou até mesmo de candidatos em uma eleição fazerem promessas que são de responsabilidade de outro cargo, e não do que estão concorrendo. Nesses casos, cabe a nós, os cidadãos, nos atentarmos e cumprirmos o papel de fiscalização. E para exigir os direitos efetivamente, precisamos saber de quem solicitar cada demanda. Faria pontua sobre os cargos do município: “O prefeito tem o papel de tirar planos do papel, então a creche eu vou cobrar do prefeito e o que eu vou cobrar dos vereadores é que eles façam por exemplo o levantamento dessa demanda, como ‘quantas creches o nosso município precisaria? Qual é a situação das novas creches?’”. Sobre vereadores, ela também aponta que esses são os agentes mais próximos da população e devem ser cobrados a voltarem nos bairros mesmo quando não é época de eleição. Este vídeo do YouTube explica a diferença dos cargos de um jeito descontraído. Outros materiais oficiais, como este da Câmara dos Deputados, também podem ajudar. Uma outra pesquisa interessante é sobre os 29 partidos que existem no Brasil. Você pode até fazer testes na internet para descobrir quais deles representam melhor as suas ideologias e convicções. Todos esses estudos podem não ser tão simples, mas compensam a longo prazo. “A participação cidadã exige algum preparo, algum letramento. À medida que as pessoas participam, mais elas aprendem e mais condições têm de exercer um papel político mais maduro e eficaz, no sentido de cobrarem, de fiscalizarem ou exigirem aquilo que elas defendem como causa, necessidade ou direito e que as pessoas eleitas precisam responder”, pontua Carolina. -
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Acompanhe ativamente as mídias sociais dos eleitos, mas não apenas –
Seguir o perfil dos candidatos que votamos é quase uma obrigação para entender quais são as pautas em debate. “A pandemia fez com que os políticos quisessem ter a rede social como um canal de divulgação e comunicação”, diz Faria, da Legisla Brasil. Para quem não gosta das redes, um outro meio de monitorar o dia a dia dos gabinetes são os boletins informativos, newsletters e listas de transmissão, que são um investimento de boa parte dos parlamentares. Mais do que consumir esses conteúdos, é importante interagir com os representantes políticos nesses canais. “Além de comentar em um post que a pessoa aprovou ou foi contra algum PL, por exemplo, você pode mandar uma mensagem no direct, ou acessar o WhatsApp. Muitos políticos disponibilizam uma conta comercial no WhatsApp para receber demandas. Também tem um e-mail oficial que é obrigatório, sempre informado no site do TSE“, lembra Albuquerque. Caso você precise de um dado que um político não gostaria de ceder, pode recorrer a Lei de Acesso a Informação: com ela, as casas legislativas divulgam registros que não necessariamente estariam no site. Os políticos podem utilizar esses meios para divulgar audiências públicas, reuniões com a sociedade para debater assuntos de interesse público – ótimas chances para você falar das suas reivindicações e opiniões sobre o tema debatido. Áurea Carolina ressalta a importância do contato próximo como uma forma de apoiar, além de fiscalizar e pressionar, candidaturas de minorias. “Essas lideranças quando eleitas enfrentam muitas dificuldades para atuar e permanecer no sistema político. Então não é só no sentido de cobrança de pressão, mas também de prestar suporte e demonstrar que a eleição dessas pessoas é importante para o avanço das causas que a cidadania também defende.” -
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Confira jornais e fontes oficiais, como os sites da Câmara e do Senado –
Sabemos que não dá para confiar apenas nas redes dos políticos. Carolina explica que “ali acontece uma seleção. O que se escolhe publicar ou não diz muita coisa”. Por isso, uma boa opção é recorrer aos jornais que têm compromisso com a democracia, com a apuração e com a objetividade na apresentação dos fatos. Há também fontes oficiais, como o portal da transparência que permite a fiscalização do poder executivo e os sites da Câmara e do Senado, que mostram os projetos de lei que estão tramitando no Congresso Nacional. É possível ainda se informar sobre o que acontece no poder judiciário, como facilita este podcast do Supremo Tribunal Federal, que resume os julgamentos da semana. Albuquerque aconselha reservar um momento do dia para estudar sobre as políticas do município, para entender qual é o perfil da câmara dos vereadores da sua cidade e o que estão debatendo. Segundo ela, é no nível local que grandes questões do nosso dia a dia se definem, como as políticas de transporte, de saúde e de educação. “Se não acompanharmos, vai ser muito difícil promover mudanças que de fato gostaríamos que acontecessem.” Ela indica particularmente visitas presenciais nas Câmaras: “No Congresso Nacional, você pode acompanhar online, ver o que está acontecendo no dia da votação e participar ali nos comentários colocando sua opinião, mas a presença de fato na Câmara Municipal é interessante em um dia que vai acontecer uma votação importante para você”. -
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Investigue quais causas te movem e converse com as pessoas ao seu redor –
O que mais te revolta? Pensar sobre isso pode impulsionar a sua participação cidadã. Como o tempo é um fator limitado e não será possível entender tudo sobre todos os assuntos, você pode investir nos que mais te instigam. Claro, na hora de votar, é importante considerar todas as propostas de um candidato, não apenas suas causas pessoais, mas isso não impede que você mergulhe profundamente em assuntos como feminismo, lutas trabalhistas ou no que mais te interessar. Carolina defende que as ações coletivas surgem a partir dos desejos de mudança em áreas que mais valorizamos. Nesse sentido, ela indica conversar com quem está perto. “Pode ser para discutir uma causa de mulheres, de jovens, de como se sente. Daí pode haver uma politização da vida.” -
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Envolva-se ou crie iniciativas para melhorias públicas. Há vários caminhos para se tornar um cidadão mais ativo –
A partir dessas conversas com vizinhos, amigos e familiares, você pode identificar problemas para os quais tem as soluções. “Reclamar é válido, cobrar é válido, mas nem sempre vai resolver. Tem hora que a gente precisa arregaçar as mangas e se prontificar também a cumprir um papel de interesse público”, diz Carolina. Há várias formas de dividir a responsabilidade com a política. De forma institucional, os conselhos municipais são um bom lugar para começar. Informalmente, qualquer ação voltada para a comunidade em que você vive se torna uma forma de fazer valer a cidadania. “Pode ser organizar uma feira de alimentos, uma feira literária, uma mostra cultural ou fazer um mutirão para dar manutenção numa praça, para remover um lixão, para revitalizar uma área verde, para cuidar de uma escola, para fazer um evento esportivo….” Carolina afirma que não há fórmula mágica para se tornar um cidadão mais ativo, mas existem vários caminhos.
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