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DepoimentoO que podemos esperar para a COP30?
Especialistas da área ambiental e ativistas indígenas falam sobre o que poderá ser debatido e avançar na 30ª Conferência do Clima da ONU, que ocorre na Amazônia, em 2025
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O que podemos esperar para a COP30?
Especialistas da área ambiental e ativistas indígenas falam sobre o que poderá ser debatido e avançar na 30ª Conferência do Clima da ONU, que ocorre na Amazônia, em 2025
Sediada na Amazônia, a 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas terá muito a debater e negociações a serem firmadas. A COP30, que ocorre em Belém, no Pará, em novembro de 2025, vai trazer para o centro da mesa questões importantes que vêm sendo arrastadas de uma cúpula do clima à outra.
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Um desses temas é o financiamento, ou seja, os investimentos por parte dos países ricos para apoiar as nações em desenvolvimento em ações de mitigação e adaptação aos impactos do colapso climático.
As metas e os compromissos que cada país assume para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, as chamadas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas), também devem entrar na pauta, assim como perdas e danos, conceito que se refere às consequências da mudança climática que se dão quando não é mais possível resistir ou se adaptar aos impactos das transformações do clima.
Para saber o que esperar da COP de Belém, e como essas temáticas chegarão à capital paraense após passarem, ainda em 2024, pela COP29, em Baku, no Azerbaijão, Gama escutou especialistas da área ambiental. Eles contam o que desejam com a reunião “em casa”: maior presença e participação efetiva de indígenas, mais envolvimento da sociedade civil, pressão pública para avançar em agendas como demarcação de terras indígenas, diminuição do desmatamento, melhoria da produção de alimentos e menos emissões de carbono, além de uma adaptação antirracista e que valorize a sociobiodiversidade brasileira.
Foto: Juliana Pesqueira
“O que eu posso esperar da COP30? Nada!”
Kátia Brasil, cofundadora e diretora executiva da agência Amazônia Real
“Vi a floresta amazônica pela primeira vez em 1991, quando era uma repórter recém-formada. A terra era dos yanomami. Em mais de 30 anos de escuta dos povos indígenas, criei um sentimento de identidade e pertencimento sobre essa região. Também relatei inúmeras violências, assassinatos de defensores, injustiças sociais. Vocês irão me chamar de pessimista, mas não vejo mais futuro na Amazônia. A destruição da floresta tomou uma proporção irreversível. Cada vez mais as mineradoras estão ganhando/comprando terras para explorar os recursos naturais, e os governos faturando com impostos. Os territórios indígenas, invadidos pelo agronegócio, por mineradores, garimpeiros e narcotraficantes, não estão sendo demarcados. O governo Lula prometeu demarcar os territórios. A crise climática está se intensificando por causa da destruição humana. O que eu posso esperar da COP30? Nada! As COPs são decididas pelos países mais ricos, seremos só os anfitriões dentro da Amazônia. Inclusive, podem decidir sobre a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas. Será que os indígenas serão ouvidos? Eles são os responsáveis por manter essa floresta viva por mais de 500 anos e vêm nos ensinando esse tempo todo. Os indígenas já estão sofrendo com o assédio do mercado de carbono em suas terras. É uma corrida desenfreada em nome das famigeradas ‘bioeconomia’, ‘floresta em pé’. E o que estamos presenciando nos últimos anos na Amazônia? Secas extremas, calamidades, crises humanitárias, incêndios criminosos. Como podem decidir pelo mercado de carbono na Amazônia se não param de queimar a floresta? Essa é a maior contradição que vejo na COP30.” (depoimento a Leonardo Neiva)
Foto: Divulgação
“A COP30 precisa resolver questões de financiamento e adaptação“
Natalie Unterstell, especialista em administração pública e presidente do Instituto Talanoa
“O que eu acho que a COP30 vai trazer de diferente é que as negociações em Belém serão muito focadas em adaptação [às mudanças climáticas], uma realidade muito diferente do que foi a COP28 [que ocorreu em 2023 em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos] e, inclusive, do que será a COP29, em que esperamos que seja bem-sucedida em relação ao tema do financiamento. A COP30 precisa resolver questões de financiamento e adaptação. Também é esperado que haja um avanço da cultura de resiliência global. Essa vai ser uma diferença grande, e o Brasil está começando a dar os primeiros passos nessa direção. Eu espero que o Brasil possa assumir não só um compromisso com a adaptação, mas que seja uma adaptação antirracista e uma adaptação que, de fato, vai valorizar a nossa sociobiodiversidade, que é tão bonita e tão protetora de gente e do planeta.” (depoimento a Ana Elisa Faria)
Foto: Kamikia Kisedje
“É importante que sejam apresentados planos concretos para o futuro da Amazônia”
Maial Paiakan Kaiapó, liderança da Terra Indígena Kayapó, mestranda em direito e ativista antirracista e pela defesa dos direitos humanos e ambientais
“Historicamente, a COP tem contado com uma participação mínima, quase inexistente, de indígenas. A luta pela inclusão dessas vozes tem sido intensa, e, embora observamos um aumento da presença indígena, ainda estamos longe de garantir uma participação efetiva nas negociações. É fundamental enfatizar que a presença de indígenas nesses espaços não deve substituir a autonomia e a voz das comunidades indígenas, suas lideranças e organizações de base. As pessoas estão cansadas de ouvir que nós, povos indígenas, somos os maiores defensores da biodiversidade e que preservamos esses recursos para a humanidade. Contudo, a pergunta persiste: será que a sociedade realmente compreende essa realidade? A responsabilidade pela proteção das florestas é compartilhada entre todos, sociedade civil, municípios, estados e governo federal. Recentemente, as queimadas, sejam elas criminosas ou não, têm chamado a atenção. É crucial reconhecer que as terras indígenas desempenham um papel essencial na manutenção da qualidade do ar e do clima na região, ajudando a evitar uma deterioração ainda maior. Porém, mesmo com essa contribuição, nossa presença no diálogo sobre essas questões é insuficiente. A COP de Belém é de suma importância, mas é imprescindível que os municípios paraenses reconheçam a relevância da biodiversidade. No Pará, duas terras indígenas, a dos kayapó e a dos munduruku, estão entre as mais impactadas pela exploração do garimpo. Além disso, o Pará tem os mais altos índices de violações dos direitos humanos. É urgente que o estado, que abriga 55 povos indígenas distintos, enfrente a questão do garimpo em terras indígenas e busque soluções para interromper a destruição das florestas, dos rios e de toda a nossa terra. Para a COP30, é importante que sejam apresentados planos concretos para o futuro da Amazônia e de todos os biomas brasileiros, com um compromisso real na implementação dessas estratégias.” (depoimento a Leonardo Neiva)
Foto: Divulgação
“Os países ricos precisam criar um fundo para financiar a transformação nos países em desenvolvimento, mas não vai acontecer em duas semanas”
Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima
“Precisamos pensar na COP30 como um processo de acúmulo de discussões e tentativas de acordo. Várias coisas influenciam para que acordos importantes e positivos ocorram ou para que sejam enterrados. A primeira é o ambiente de negociação. Estamos num mundo com duas guerras, além de um possível retorno de Trump à presidência dos Estados Unidos. Se chegarmos à COP com esse cenário atual, as chances de entendimento entre os países diminuem. Porque quem negocia são os mesmos que estão jogando bomba um no outro. A eleição americana também é importante porque os Estados Unidos, historicamente, são os maiores emissores [de gases de efeito estufa]. E, o pré-programa do candidato Trump, diz que, caso ele seja eleito, os EUA vão sair novamente do Acordo de Paris. Essas circunstâncias ainda não estão dadas, mas jogam um peso para o que vai acontecer no Brasil. As duas principais agendas em discussão são financiamento e as NDCs [Contribuições Nacionalmente Determinadas]. No quesito financiamento, os países ricos precisam criar um fundo para financiar a transformação nos países em desenvolvimento. Os países ricos e desenvolvidos colocam ali os valores e os países em desenvolvimento acessam os recursos para diminuir suas emissões. No nosso caso, o principal foco é o desmatamento, depois vem a energia agropecuária, mas em outros países a energia é o foco principal. Mas esse dinheiro foi prometido há mais de uma década e nunca apareceu. Isso causa, além da impossibilidade financeira para fazer essa transformação, um mal-estar em relação à confiança nas negociações. Destravar o tema do financiamento é extremamente importante, mas não vai acontecer em duas semanas. É um processo daqui até a COP30. O outro tema é o das NDCs [Contribuições Nacionalmente Determinadas] as promessas do clima. O que necessitamos daqui até a COP30 é que os países revejam as suas NDCs e submetam novas metas de corte de emissões para mantermos o planeta em 1,5 grau. O clima vai ser mais debatido no Brasil, seja porque a COP vai acontecer ou porque estamos vendo eventos extremos climáticos com cada vez mais intensidade e frequência. Com isso, teremos mais pressão pública para avançar em agendas como demarcação de terras indígenas, unidades de conservação, diminuição do desmatamento, melhoria da produção de alimentos e menos emissões de carbono. Essa agenda doméstica deve ganhar ainda possibilidades de frear os retrocessos no Congresso, que, hoje, é o protagonista da destruição ambiental no Brasil. O Congresso não impondo retrocessos, já é um grande serviço prestado ao clima no mundo inteiro.” (depoimento a Ana Elisa Faria)
Foto: Divulgação
“Espero que a COP30 não seja mais um espaço de greenwashing do governo”
Mariana Belmont, jornalista, pesquisadora e organizadora do livro “Racismo Ambiental e Emergências Climáticas no Brasil” (Oralituras, 2023)
“O que eu espero da COP30 é que a sociedade civil, de fato, participe dos processos, esteja perto, tome conhecimento e se empodere a respeito do que são essas negociações. Acho que a participação social é um tema importante, e é um grande buraco do governo atual. Espero que o governo brasileiro entregue isso para a sociedade, além de mostrar internacionalmente o que é uma construção política com visão de futuro e uma negociação inclusiva e participativa, não a portas fechadas, não fingindo que está fazendo algo. Espero que a COP30 não seja mais um espaço de greenwashing do governo brasileiro para mostrar internacionalmente que está fazendo, enquanto temos falhas absurdas: território quilombola sem titulação, marco temporal batendo na porta, territórios indígenas sem demarcação. Temos uma lista imensa de lição de casa para fazer, e espero que a chegada dessa COP nos provoque a resolver essas tarefas. Para pensarmos sobre o que deve ser debatido na COP30 e avançar em relação às edições anteriores, é preciso entender que há toda uma preparação para um evento desses. Anualmente, no meio do ano, na sede da UNFCCC [Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima], em Bonn, na Alemanha, há uma conferência de duas semanas, menor que a COP, onde as organizações da sociedade civil, as diplomacias e os governos prepararam textos e já iniciam as negociações para as COPs. E o que está na mesa atualmente é o financiamento, o montante de dinheiro que vai ser colocado, especialmente pelos países ricos, para o trabalho da redução das emissões e da redução da crise climática no mundo. Além disso, tem as novas NDCs, as Contribuições Nacionalmente Determinadas, que os países devem entregar até março de 2025. O que vimos depois de Bonn é que a nova meta de financiamento climático é o principal item da agenda da COP29. É a partir dela que será definido o quanto de dinheiro os países desenvolvidos precisam prover aos países em desenvolvimento para financiar o cumprimento das novas metas climáticas e a adaptação à mudança do clima. Sem dinheiro e sem os países ricos colocarem dinheiro na mesa, não vai dar certo, vai continuar não dando certo. E aí precisamos também lidar com perdas e danos decorrentes dos eventos extremos, que não podem mais ser evitados. Também acho que a COP30 vai colocar uma pressão extra na necessidade de termos uma liderança brasileira no processo internacional e para dar o exemplo dentro de casa, colocando o pé na porta para cobrar que os países ricos coloquem dinheiro nas negociações e parem de recuar. Financiamento, adaptação e perdas e danos são temas que antes eram patinhos feios das conferências e das negociações, mas que começaram a ganhar um outro espaço porque estamos vendo no planeta que não temos tempo de negociar por mais tempo.” (depoimento a Ana Elisa Faria)
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