Maria Ribeiro
Caetano vai fazer 80
O homem mais foda do mundo é made in Brazil, e semana passada deu restart no que ainda chamamos Terra Brasilis
No próximo dia 7 de agosto, ele vai fazer 80. Poderia ser 70, poderia ser 90 – sua mãe chegou a mais de 100 – poderia ser 30. Mas vão ser 80. Nada disso importaria nada e, no entanto, isso importa mais que tudo. Por que, se o tempo é matemática do tipo poesia concreta (ou bomba-relógio) Caetano Veloso é – ou melhor, são, já que aqui nunca houve singular – todas as outras matérias. Prontas para serem devoradas.
De geografia a língua portuguesa, de história a ciências sociais, de filosofia a física, de literatura a educação sexual, são músicas e livros e artigos para colar no peito e usar de abadá. São olhos para morar e ser feliz, janelas para ver a banda e levantar cartazes. Uma vida para aproveitar.
O homem mais foda do mundo é made in Brazil, e semana passada deu restart no que ainda chamamos Terra Brasilis, reinaugurando nossa bela e mal tratada capital, com direito ao céu do Djavan e linhas do Lucio Costa. Era isso que faltava. Uma segunda chance. Recomecemos.
O Ato pela Terra além de marco político importante em prol do meio ambiente, foi o que faltava na esquerda: a festa. Do Caetano. De 80
O Ato pela Terra, organizado por Paula Lavigne e Mídia Ninja, não foi só um marco político importante no cenário das manifestações em prol do meio ambiente, mas também um signo que há muito faltava na esquerda: a festa. Do Caetano. De 80.
Era isso. Sua festa é nossa festa, sua missa é nossa missa, seu protesto é nosso protesto. Cada minuto ao seu lado, portanto, é para comer devagar. Caetano vai fazer 80.
Nada disso seria digno de coluna – não mais do que qualquer outra idade – não fosse esse homem toda a minha ideia de Brasil. Não fosse ele meu Beatle favorito, minha bandeira flamejante, o verde dos meus documentos, o país para onde volto, a terra em que crio meus filhos, o hino que canto com vontade de dançar.
Caetano Veloso.
Que logo terá 80 anos completos (e nunca essa palavra fez tanto sentido). “Completos”. Completo.
Sempre achei meio careta esse lance de aniversário, embora não duvide das flechas da idade. Poucas coisas são tão certeiras. Do amor, não sabemos, da verdade, tampouco, mas o calendário, esse, sim, esse tem CEP e CNPJ.
Caetano vai fazer oitenta. Escrevo a palavra, assim, por extenso, como se fosse a primeira vez. E não só a palavra, mas a própria idade. Que, por algum motivo, que ainda não sei decifrar, aqui me parece um número suave, um nascimento, uma descoberta. O Brasil começou quando Caetano nasceu, e suas mãos trêmulas são as que eu seguro nesse exato momento, certa de que nunca estive tão segura e amparada, e que meu país nunca pisou terra mais bonita e sortuda. No meu chão mora um artista que vai fazer oitenta. Com ele, vou cantando, protestando e segurando árvores. Ainda não sei o que é melhor, só sei que é ao lado dele.
Maria Ribeiro é atriz, mas também escreve livros e dirige documentários, além de falar muito do Domingos Oliveira. Entre seus trabalhos, destacam-se os filmes "Como Nossos Pais" (2017) e "Tropa de Elite" (2007), a peça "Pós-F" (2020), e o programa "Saia Justa" (2013-2016)
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