Como escolher vinhos para a primavera — Gama Revista
COLUNA

Isabelle Moreira Lima

A primavera na sua taça

Saiba como harmonizar com a estação de renovação que acaba de começar. Spoiler: busque corpo médio, frescor e notas de ervas e flores

07 de Outubro de 2022

Estamos precisando, mais que nunca, de uma primavera. Um alívio, um respiro, uma estação de renovação, de recomeço, com sensação de vida nova. E o que harmoniza com tudo isso? Quais são os vinhos de primavera? Existe vinho de meia estação?

A primavera começou tímida em setembro, ainda com muito frio, e com taças cheias dos vinhos de inverno, tintos cheios de tanino, corpulentos, alcoólicos. Nada contra, mas agora já deu. Agora, o que fazer se os termômetros ainda não subiram a ponto de desejarmos aqueles branco levíssimos e supercítricos? Seria hora das notas florais? Daqueles vinhos que são um buquê pro nariz e pura untuosidade para a boca?

Se assim for de seu desejo, a resposta pode estar em brancos encorpados e/ou aromáticos. Procure rosa e flor de laranjeira no Viognier mais próximo; jasmim e acácia podem emergir de blends feitos com Marsanne, uma uva francesa pouco festejada e tão rica. Os que estão precisando de uma boa camomila em tempos tão turbulentos podem procurar vinhos feitos com Sémillon ou Chenin Blanc, uma nova queridinha entre os enófilos mais ligados às tendências dos naturais. Também para esse público, há diferentes parentes da família Moscato virando laranjas incríveis, que podem ser um pulo do gato para uma primavera mais selvagem. Mas a lista segue, anote aí: Gewürztraminer (acácia, rosa) e Torrontés (gerânio, jasmim) também são perfumadas, e até a mineral Riesling pode trazer alguma pétala branca à lembrança.

Estamos precisando de uma primavera. Um alívio, um respiro, uma estação de renovação, com sensação de vida nova

Outubro é também mês de se conscientizar sobre o câncer de mama, e a campanha foi batizada de outubro rosa. Ora, por que não mergulhar nos rosés então? Produzidos com uvas dos tintos, no método de curta maceração, esses vinhos ficam menos tempo em contato com as cascas durante a fermentação, o que muda a coloração e a estrutura para algo mais suave e delicado. (Se você parar pra pensar, o rosé é como se fosse um laranja ao contrário. Um laranja, afinal, é um branco que demorou demais com as cascas.) Estou falando aqui daqueles rosés clarinhos, de cor casca de cebola, chiques e elegantes. Pense na Provence francesa e em todo o resto do mundo que segue sua onda.

Mas nada impede que se queira algo mais festivo, rosés vibrantes, de cor mais acentuada, com um pouco de tanino e mais adstringência. Neste caso, os rosés de método saignée, ou o de sangria, em que uma parte do mosto que estava em contato com cascas por cerca de dois dias é separado para que a fermentação siga como se fosse um vinho branco, brilham. Portugal e Espanha têm feito vinhos belíssimos nessa linha.

E de que uvas?, você me pergunta. A beleza do rosado é que ele é feito com a cepa boa e abundante do seu lugar de origem. Na França, por exemplo, eles costumam ser secos e elegantes e vêm principalmente da Provence e Languedoc-Roussillon. O corte mais típico inclui Grenache e Syrah, castas típicas de lá. Mas, claro, podem vir de outros lugares e usar outras uvas, afinal o país responde por 27% da produção mundial. Na Itália, o rosato é elaborado em todo o país com as uvas indígenas. Na Espanha, esses rosados vibrantes costumam vir com Tempranillo e com a Garnacha, e ter notas até mais herbáceas. No Novo Mundo é o festival da liberdade, encontramos de tudo, uma maravilha.

Cheiro de erva remete a campo, a natureza, e ainda vale como um descarrego mais enogastronômico

Mas nem só de brancos e rosados pode ser plantado esse jardim, também valem os tintos de corpo leve para serem tomados bem fresquinhos. Você já experimentou um clarete? Se não, sugiro essa estreia, porque hoje há um resgate incrível desse estilo, inclusive no Brasil. O clarete é um tinto bem claro, como diz o nome, dá um clarão de vermelho vivo para o seu olho, e muito frescor para a sua boca. O método de produção, possivelmente criado em Bordeaux ainda na Idade Média, pressupõe a cofermentação rápida (dois dias no máximo) de uvas brancas e tintas. Se tiver um orçamento mais generoso à mão, vale procurar o Era dos Ventos, premiado e festejado entre connoisseurs.

Cheiro de erva também cai bem, remete a campo, natureza e ainda vale como um descarrego mais enogastronômico, bom para proteger contra forças do mal e renovar as energias. Um tinto cheio de acidez como um Chianti mais simples, que além de tudo pode ter corpo leve (que delícia para uma tarde de primavera!) tem nota de tomilho. Já a Montepulciano pode trazer aromas de orégano, a Touriga Nacional, além de violetas, alecrim, e a Garnacha (ou Grenache), vinificada em tinto, traz tanta coisa boa e linda: com sorte você acha eucalipto, alecrim, e até lavanda. Com tudo isso, além de beber bem, você ainda lava a alma!

Saca essa rolha

PARA SENTIR O CHEIRO DAS FLORES E SE RENOVAR
O espumante Moscatel Faces, da Lídio Carraro, é simples e simpático, mas fica muito chique com um prato de frutas na hora da sobremesa. Um primo dele mais hipster é o laranja Yumbel Tinaja Moscatel de Alejandría, que tem imenso potencial de harmonização, com seu corpo médio e mais adstringência. Vale para uma mesa bem variada com amigos famintos e sedentos.

PARA ENCHER OS OLHOS DE VERMELHO VIVO
O Clarete mais famoso do Brasil é o Era dos Ventos Clarete, que fermenta uvas brancas e tintas misteriosas. Ele tem uma pegada mais natural-funky, que leva os iniciados à loucura mas pode ser difícil pra quem ainda não se habituou ao estilo. Sem falar que o preço pode assustar. Uma boa porta de entrada pode ser o Protos Clarete D.O. Ribera del Duero, que traz notas florais e uma cor sedutora.

PARA UMA SESSÃO DE DESCARREGO HERBÁCEO
É um investimento de mais de R$ 100, mas vale provar o Niepoort Dão Touriga Nacional, que traz toda sorte de ervas frescas no aroma e é muito equilibrado. Vale provar também o Rossetti Rosso Toscana IGT, de produtores de Chianti mas de preço melhor, que leva alecrim e tomilho, além de flores, ao seu nariz.

Isabelle Moreira Lima é jornalista e editora executiva da Gama. Acompanha o mundo do vinho desde 2015, quando passou a treinar o olfato na tentativa de tornar-se um cão farejador

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões da Gama.

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