5 dicas para ensinar autoconhecimento aos jovens — Gama Revista
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5 dicas

Como ensinar autoconhecimento aos mais jovens

Em casa ou na escola, especialistas trazem dicas para abordar o autoconhecimento com os jovens, lembrando a dimensão identitária e coletiva dessa virtude

Ana Mosquera 14 de Agosto de 2022
Patricia baik @roledebaik

Como ensinar autoconhecimento aos mais jovens

Em casa ou na escola, especialistas trazem dicas para abordar o autoconhecimento com os jovens, lembrando a dimensão identitária e coletiva dessa virtude

Ana Mosquera 14 de Agosto de 2022
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    Leiam e assistam filmes em família, não só na primeira infância –
    Ler para a criança antes de dormir já é um hábito cultivado por muitas famílias. Conforme os filhos crescem e ganham autonomia para mediar as próprias leituras, a impermanência da prática em conjunto impede que discussões sobre temas importantes sejam levantadas dentro do ambiente familiar. “A gente usa a literatura para trazer explicações complexas na infância, mas esquece de fazer isso quando eles são adolescentes”, lembra a pedagoga, especialista em comportamento do adolescente e palestrante, Carolina Delboni. “E é exatamente assim que os filhos podem ir se desvinculando da leitura e que os pais começam a cobrar os adolescentes, sem cultivar eles próprios esse hábito”, lembra o escritor, palestrante e CEO do Programa Sociomocional da Educa 21, Jaime Ribeiro. Segundo ele, é a partir desse contato com histórias diferentes que é possível desenvolver uma série de competências, como a empatia – compreensão do estado emocional do outro. Os dois profissionais acreditam que uma curadoria familiar pode ser muito interessante para trazer assuntos mais ou menos urgentes à tona. “Quando o adolescente escolhe um tipo de série, não necessariamente ele se vê ali, mas tem relação com algo que ele gosta”, comenta Delboni, ampliando a leitura coletiva para o ato de assistir filmes ou séries. Compartilhar o momento já bastaria, mas Ribeiro sugere que as conversas sobre o conteúdo do material consumido são as mais importantes. Ele dá dicas de alguns filmes para assistir em família, como as mais recentes animações da Pixar: “Soul” (2020), sobre um professor de música que morre quando está para finalmente realizar o sonho de tocar profissionalmente, e “Red” (2021), em que a jovem protagonista descobre uma nova personalidade como um panda vermelho e acaba se apegando a ela. Ambos estão disponíveis no Disney+.

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    Estimule as amizades dentro e fora de casa –
    A amizade na adolescência é muito potente”, diz Delboni. Para ela, é a partir do contato com os amigos que os adolescentes começam a ter noções dos próprios limites, coisa que não acontece com tanta frequência no ambiente familiar. “As pessoas com quem o adolescente convive já sabem o que ele pensa, quem ele é, o que elas sentem por ele. Já existe um amor, que vem de uma relação antiga. A partir do momento em que ele se relaciona na escola, no clube, na balada, ele se percebe através do outro.” Os amigos, nesse período da vida, podem estar presentes para dividir desde alegrias até alguns problemas e responder de maneira única sobre a situação alheia. Eles carregam as respostas na própria fala, de acordo com ela: “Como o outro me enxerga me dá pistas para o meu autoconhecimento. Como o grupo me vê, como eles falam comigo”. Também é a partir da vivência dessa fase da vida que o indivíduo começa a entender o quanto pode se aprofundar em uma ou outra relação, com quais amigos é possível contar e quais são apenas bons companheiros de festa. Por parte dos pais, outro ponto importante para auxiliar nessa jornada rumo à sabedoria interior é acolher as amizades dentro de casa, pois possivelmente é perto delas que o adolescente vai se comportar de maneira diferente e, dessa forma, soluções para questões internas podem aparecer.

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    Olhe o jovem como um ser integral e considere sua história única –
    “Como fazer com que as crianças atinjam autoconhecimento, se elas não estão entendendo como foi formada a sua identidade, como elas são vistas pela sociedade, se não foi trabalhado um recorte racial e social durante a infância?”, questiona a educadora, pesquisadora e terapeuta, Rosa Maria, que se inspira na pedagogia Waldorf na escola Jardim Aroeira, em Olinda (PE), da qual é co-fundadora e gestora. Criada por Rudolf Steiner, em 1919, na Alemanha, a pedagogia Waldorf trata a criança como um ser integral, que carrega em si o próprio desenvolvimento, pronto para ser estimulado por intervenções feitas por ela mesma. Para ela, que trabalha a filosofia a partir de um viés antirracista e alinhado com a cultura local, é preciso uma reforma curricular urgente, que coloque em prática medidas como a obrigatoriedade do estudo da história e cultura indígena e afro-brasileira. “Se a pedagogia não toca as crianças no lugar em que elas estão, que autoconhecimento ela vai trazer para o adulto?” Segundo Maria, ainda que setores mais conservadores da filosofia Waldorf ignorem o recorte de raça, gênero e classe, é fundamental olhar para a cultura ao redor, bem como para as questões sociais da época, a fim de desenvolver o autoconhecimento. “Isso é uma construção”, ela diz: “Se desde o começo ela entende como boa a multiplicidade, o que não está na bolha dela, ela enxerga as diferenças. Se ela não tem essa oportunidade, ela não tem como chegar no mundo adulto e lutar por uma verdade”.

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    Utilize o território e os espaços compartilhados a esse favor –
    “O desafio do autoconhecimento é reconhecer as fronteiras entre indivíduo e coletivo, mas, nas relações, saber que eles não estão separados um do outro”, diz a educadora social Natália Godoy, que trabalha com jovens em situação de vulnerabilidade. Quando o assunto é fronteira, uma das suas sugestões para trabalhar o conhecimento dos jovens sobre si mesmos, para que encontrem seu lugar no mundo, é explorar o território e a realidade da qual eles partem. Segundo ela, esse processo de saber sobre as origens e de mergulhar na história dos pares faz com que muitas reflexões apareçam de forma mais genuína. “Essas cartografias são ferramentas bem interessantes para trabalhar o autoconhecimento, porque você pode trazer histórias das personalidades do bairro ou da família de cada um”. Apesar de levantar questões espinhosas, Godoy conta que a prática costuma ser bastante efetiva, uma vez que, no fundo, esses jovens só estão na expectativa de que alguém tenha essa conversa com eles. Outra dinâmica interessante para os educadores, quando o vínculo já está mais avançado, é explorar a história do próprio nome: “Tudo isso vai fazendo uma costura entre o jovem e os grupos em que ele está inserido.” A proposição desses diálogos entre os próprios adolescentes é primordial para o processo de autoconhecimento, sempre cultivando o respeito, o não julgamento e a abertura para as indagações pessoais. “Não tem pergunta que não seja válida”, ela lembra: “A construção do conhecimento precisa estar no lugar do não saber, e o autoconhecimento também vem daí”. É como no texto “Sendo um Menino”, da escritora Bell Hooks: “Ela fala de trabalhar com a criação de santuários, de lugares de escuta e de fala, em que eles possam ser quem eles são, sem medo da desvalia, da inferiorização, do rebaixamento”.

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    Lembre-se que o autoconhecimento também é social –
    “O autoconhecimento na adolescência é uma questão central, pois é quando se dá a superação do luto da infância, o que implica em construir novas identidades no lugar de identidades infantis”, comenta o educador e psicanalista, Silvio Hotimsky. Para a construção dessas identificações e subjetividades, contudo, é indispensável haver debate e questionamento no campo da educação, sobretudo frente à avalanche neoliberal a que os jovens estão cada vez mais sujeitos. “O quanto posso me conhecer de verdade sem o encontro com o outro? Como posso me conhecer numa cultura de narcisismo?” Ou seja, se o discurso de conhecer a si próprio foca apenas em desenvolver as habilidades e competências socioemocionais desse jovem e em inseri-lo no mercado de trabalho, acaba deixando de lado a dimensão coletiva e pública do autoconhecimento. “A pergunta é se isso ajuda com formação e/ou se é mais um elemento de construção de analfabetismo político.” Para ele, é preciso que as perspectivas educacionais e os educadores olhem mais para as histórias e repertórios dos jovens, considerando os diferentes marcadores sociais – raça, classe, gênero –, a fim de contribuir para a jornada conjunta do autoconhecimento. Outra armadilha para se evitar é quando a busca por fazer parte resulta em um processo de redução identitária e esse jovem tão múltiplo e plural, pressionado a pertencer a determinado grupo social, acaba limitando suas vivências. “Há uma falta de ampliação sociológica quando o jovem se limita. E aí o adolescente é capturado por um rótulo, que é o pior do mundo adulto”. Para ele, é preciso uma sociedade que discuta e participe junto com o jovem, e que o acolha na trajetória de entender seus diversos papéis de transformador social. Além do diálogo entre formadores e jovens, estabelecer espaços de conversa em que os próprios adolescentes possam trocar suas experiências é essencial para uma ampliação identitária.