Por que as mães estão tão cansadas?
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Depoimento

O que perdoei na minha mãe depois que tive filhos

Noemi Jaffe, Helen Ramos, Joice Berth, Caroll Falcão e outras compartilham o que a maternidade lhes ensinou sobre os erros e acertos das suas próprias mães

Isabelle Moreira Lima e Sarah Kelly 11 de Maio de 2025

O que perdoei na minha mãe depois que tive filhos

Isabelle Moreira Lima e Sarah Kelly 11 de Maio de 2025

Noemi Jaffe, Helen Ramos, Joice Berth, Caroll Falcão e outras compartilham o que a maternidade lhes ensinou sobre os erros e acertos das suas próprias mães

Algumas atitudes e decisões das mães podem ser incompreensíveis para filhas e filhos; só uma mãe mesmo para entender. O que acontece então quando essas filhas viram mães? Assim como o medo e a culpa são sentimentos inerentes à maternidade, a compreensão e a capacidade de perdão também chega às mães novatas: de repente, as ações mais descabidas de suas mães no passado ganham porquês claros.

Gama ouviu mulheres que passaram por essa experiência e perdoaram suas mães ao se verem na mesma posição. São relatos emocionantes sobre entender escolhas, medos, contextos, cheios de amor e gratidão.

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    Arquivo pessoal

    “Amadureci cedo e sou independente graças ao ‘erro’ da minha mãe”

    Joice Berth, urbanista e escritora

    “Eu perdoei o excesso de preocupação. Minha mãe tinha muito medo de me deixar sair de casa, independente da companhia, do lugar que eu fosse. Ela dizia que não confiava no mundo com o qual eu ia interagir. E eu achava uma grande bobagem, argumentava, brigava. Hoje, que sou mãe, me pego tendo os mesmos medos. Confio muito na educação que dei a meus filhos, mas sei o quanto o mundo é cruel e perigoso, especialmente para pessoas negras. Também perdoei minha mãe pelo tanto que me cobrou na infância e adolescência. Isso fez com que eu amadurecesse mais cedo. Mas é graças a isso que me tornei uma pessoa forte, independente. Ser independente combina muito comigo e eu descobri cedo que eu era assim, graças a esse ‘erro’ da minha mãe.”

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    Arquivo pessoal

    “É preciso reconhecer como cada um sabe expressar o seu amor”

    Carol Albuquerque, chef do Fresta, em São Paulo

    “Eu e minha mãe sempre fomos muito diferentes na forma de lidar com os nossos sentimentos. O jeito capricorniano bravo dela sempre foi difícil para mim, mas ela nunca deixou de comparecer; é a minha maior parceira, está sempre ao meu lado, me apoiando e torcendo por mim. Há dois anos, me tornei mãe e, desde então, reflito sobre a nossa intenção genuína em dar o nosso melhor aos nossos filhos. Hoje compreendo, que o ‘nosso melhor’ foge do nosso controle sobre como o ‘outro’ irá recebê-lo. Entendo que a gente precisa se perdoar, para que essa dinâmica de mãe e filho seja leve. E que é preciso reconhecer a forma como cada um sabe expressar o seu amor.”

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    Arquivo pessoal

    “Segurou a onda sozinha e criou os filhos com grande primor”

    Caroll Falcão, estilista e empresária

    “Minha mãe foi mãe solo muito nova, com dois filhos. Eu tinha dez anos quando o meu pai morreu. Imagina: os filhos entrando na pré-adolescência, uma mãe jovem, enfermeira, teve que se virar em mil. Fez literalmente mil plantões. Em todos os sentidos, ela segurou essa onda sozinha. Então, ela era uma mãe exausta, amorosa, mas que tinha seus momentos, que explodia, perdia a paciência. Quando virei mãe, ela foi 100% perdoada. Como é difícil criar um humano, botar no mundo uma pessoa e fazer com que ela seja uma pessoa legal, que vai agregar nesse mundo. Minha mãe fez isso com um grande primor.”

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    Maju Magalhães/Arquivo pessoal

    “O amor pelo meu filho me fez compreender tudo o que só uma mãe entende”

    Mayara Aguiar, diretora da novela “Garota do Momento”, da TV Globo

    “Perdoei o cuidado que eu achava excessivo. Perdoei a dedicação exacerbada. Perdoei o medo que ela tinha em me ‘perder’. Perdoei a necessidade que ela tinha de acertar sempre que possível. Foi possível perdoar as verdades absolutas, as expectativas criadas. A experiência da maternidade traz uma nova perspectiva sobre sacrifico,limitações e o amor incondicional que a gente oferece aos nossos filhos. O amor que eu sinto hoje pelo meu filho [Sereno, de oito meses] me fez compreender tudo o que só uma mãe entende”. Muitas vezes, a lembrança surge em determinadas situações e imediatamente eu lembro dela, da dona Andrea Aparecida. A ausência física não diminui seus ensinamentos nem tudo o que vivemos juntas. Pelo contrário. Perdoar também é um ato de extremo amor.”

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    Arquivo pessoal

    “Minha mãe fez a maternidade parecer fácil”

    Tatiana Chalhoub, artista

    “Francisco, meu primeiro filho, está prestes a completar um ano. Quem tem filho sabe a intensidade desse primeiro ano. Um amor novo e abissal, cheio de desafios e adaptações. A vulnerabilidade, assim como o amor avassalador, nos aproxima de entender as nossas mães, uma vez que agora estamos nessa pele. Minha mãe, uma psicanalista atenciosa e presente, fez a maternidade parecer fácil. E talvez eu ainda precise perdoá-la por isso. Ela enfrentou questões e desafios da maternidade, mas isso nunca chegou para mim em forma de frustrações. Sei que sou muito privilegiada de ter tido essa mãe, que agora é uma grande avó. Acredito nas palavras de Gilberto Gil quando o assunto é maternidade: ‘não há o que perdoar. Por isso mesmo é que há de haver mais compaixão’.”

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    Rodrigo Fonseca/Divulgação

    “Às vezes, minha mãe era inoportuna porque era muito verdadeira”

    Noemi Jaffe, escritora e professora

    “Bom, minha mãe era muito cara de pau. Não tinha vergonha de falar nada pra ninguém. Às vezes era inoportuna porque era muito verdadeira: ‘Não gostei do teu penteado’, ‘Tua roupa tá feia’. Pechinchava em lojas que não era pra pechinchar. Quando eu era pequena e não tinha amigos na praia, ela me levava até uma criança e falava: ‘Quer ser amiguinho da minha filha?’. Me fez passar muita vergonha. Mas quando me tornei mãe, percebi que faço coisas parecidas. Meus filhos falam: ‘Para, mãe! Você tá falando a coisa errada no lugar errado’. Acho que herdei isso dela.”

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    Maria Cau Levy

    “Amar um filho é carregar uma dose insuportável de preocupação todos os dias”

    Helen Ramos, atriz, roteirista e podcaster

    “Perdoei minha mãe por ter ficado cansada, aliás eu realmente entendo ela repetir tantas vezes que estava cansada. Ela dizia que tinha a ver com a idade dela e eu queria que ela soubesse que nem ter a ver com a idade, tem a ver com a maternidade mesmo. Entendo porque ela perdeu a paciência, porque chorou de preocupação, porque gritou e porque se escondeu pra chorar. Eu entendo e perdoo o medo que ela tinha de algo acontecer comigo, hoje eu entendo o que é ser mulher e os perigos disso. Eu achava um exagero e que me sufocava e me prendia tanto. Hoje eu entendo o amor infinito e inexplicável que ela dizia que só uma mãe para entender. Hoje eu sei que amar um filho é carregar uma dose insuportável de preocupação todos os dias e mesmo assim deixar ele ser o que quiser.”

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    Arquivo pessoal

    “No fundo, ela fez o melhor que podia com o que acreditava ser certo”

    Andressa Reis, criadora de conteúdo e autora do livro infantil “Da Cor que Eu Sou” (Editora Matrescência, 2021)

    “Depois que me tornei mãe, algumas coisas dentro de mim amoleceram. Inclusive aquilo que um dia me doeu. Minha mãe acreditava, com firmeza, que precisava ser dura. Que precisava me preparar pro mundo — porque o mundo lá fora era (e ainda é) implacável. E eu entendi. De verdade. Entendi que ela não foi fria, foi protetora. Que não faltou amor, mas sobrou medo. Que o jeito rígido de criar era, pra ela, uma forma de cuidado. Mas também compreendi, com o tempo, que eu penso diferente. Acredito que justamente por o mundo ser tão duro, nosso lar precisa ser refúgio. A casa precisa ser o lugar onde a gente pode desarmar. Onde a criança que fomos ainda possa existir, acolhida. Perdoei minha mãe por não saber disso antes — porque ninguém ensinou a ela também. E, no fundo, ela fez o melhor que podia com o que acreditava ser certo. Hoje, sigo tentando fazer diferente. Mas não em oposição a ela — e sim como continuação.”

Um assunto a cada sete dias