Três dias sem usar o Instagram — Gama Revista
O quê: Três dias sem usar o Instagram
Quem: Vanessa Rozan
21 de Abril de 2020

Eu nunca tinha feito um detox de redes sociais. Apesar de saber que eu precisava, não achei que iria acontecer assim, no meio da rotina normal. Pensei que nas férias aproveitaria para me desligar. Eu já sabia que estava em uma relação de vício com o Instagram, de entrar, olhar, sair, entrar de novo, uma coisa mecânica. Então a primeira coisa que fiz para começar esse minidetox foi tirar o ícone da página principal do celular. Ficou um buraco proposital, justamente para eu entender quantas vezes o meu dedo ia do WhatsApp direto para o Instagram, de forma mecânica e não pensada.

O WhatsApp é uma coisa de trabalho, entre aspas, que a gente precisa deixar ligado, entre aspas de novo, e que tem uma certa urgência — é o novo e-mail. Ele chama a atenção para o celular. Já o Instagram é diferente, desvia para o mundo da utopia, onde tem alguém de férias, alguém no lugar certo, na hora certa e com a roupa certa, o que só vai te fazendo ficar mais ansioso. Esse Fomo [fear of missing out, ou medo de ficar de fora] que muita gente tem, e que eu sinto muito, foi aliviado nesses dias.

O movimento é consciente

Eu andava totalmente viciada. Meu companheiro falava “você está viciada” e eu “nããão”. Mas me dei conta de que sim, eu estava, porque realmente senti falta de ficar rolando o feed do Instagram. Os momentos mais difíceis foram de manhã e à noite, quando uso o aplicativo e tenho a sensação de acompanhar uma novela, um seriado da vida do outro. Lembro que no primeiro e no segundo dia do detox eu fiquei olhando as minhas próprias fotos do rolo de câmera. E aí parei e pensei: “por que estou fazendo isso?” Dei uma limpa nas imagens e não tinha mais por que ficar ali.

No primeiro e no segundo dia do detox eu fiquei olhando as minhas próprias fotos do rolo de câmera. E aí parei e pensei: “por que estou fazendo isso?”

Nesses três dias me senti menos ansiosa. Percebi que, sem aquelas duas, três horas que eu costumo gastar rolando o feed, o dia rendeu, resolvi todas as mensagens pendentes, fiz outras coisas. É muito tempo online, se pensarmos nas cerca de 12 horas em que você está operando em um dia. A minha relação com a tecnologia ficou mais saudável e mais direta. Entrei, resolvi de maneira pontual e saí.

Com o Instagram, é como se você vivesse por meio do que as outras pessoas estão vivendo — e sem fazer o que você deveria estar fazendo. Uma coisa que tem muito no interior, “eu não vou na festa mas a minha tia vai e ela me conta”, traz uma baita ansiedade porque não tem como você dar conta de tudo, estar em todos lugares e ainda ser mãe, empresária, cuidar da sua saúde e meditar. No auge das queimadas da Amazônia, por exemplo, olhar as imagens que todo mundo estava repostando trazia um mal estar que só cresceu e deixou todo mundo num lugar que não é o de ação. Você posta um “Amazônia SOS” e sente que fez alguma coisa, mas não fez nada na verdade. É um lugar de angústia e de paralisia.

A partir de agora quero ter uma relação mais saudável com a tecnologia. Não é ruim se você diz “vou olhar isso durante 30 minutos e desligar”. A questão é você estar o tempo todo fazendo o negócio sem pensar, mecanicamente. Essa experiência afetou diretamente a relação com a minha filha, foi muito incrível. Claro que tanto eu quanto o pai fazemos esse esforço de desconectar 100%, mas às vezes o WhatsApp toca e você se perde. Estive muito mais disponível para ela, fiquei mais perto, mais amorosa, com mais paciência.

Como sobra mais tempo, consegui fazer conexões mais rapidamente e fui muito mais funcional. Fiquei mais atenta porque a atenção é plena e eu estava naquele lugar. Hoje, tive uma reunião e percebi que o celular nem estava na mesa. A manhã rendeu, vou conseguir levar minha filha à escola. Estou com esta sensação de que o tempo é o objeto mais precioso, o mais caro que a gente tem. E eu não me dava conta de que estava doando esse tempo para um lugar que não é palpável, que não é real perto daquilo que está na minha frente.

Um mês depois

Desde o detox, percebi que, quanto mais ansiosa estava, mais eu ficava online. E quanto mais relaxada, vivendo o presente e fazendo as coisas no tempo que elas precisam, menos eu entrava no Instagram. Uma vez que se percebe essa relação é como tomar uma pílula do Matrix — você não consegue voltar atrás. Mesmo com algumas recaídas, percebi que tenho administrado meu uso do Instagram de uma forma mais saudável, usando mais para o trabalho e evitando postar coisas da minha filha, por exemplo. Isso me fez ler mais — engatei um livro, terminei outro. Troquei uma coisa por outra mais saudável. Penso que em janeiro, nas minhas férias, vou fazer um detox não só de três dias, mas muito mais longo. Foi uma experiência muito, muito produtiva, uma coisa tão pequena mas capaz de abrir os olhos para o quanto eu estava me deixando levar por um impulso.

Vanessa Rozan é maquiadora, proprietária do Liceu de Maquiagem e mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Este texto foi escrito antes da pandemia da Covid-19

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